Relatório da comissão dos SMS vai a votos. Desta vez passa?

O relatório da segunda comissão de inquérito à CGD mereceu várias críticas, sobretudo por ilibar por completo Mário Centeno no caso da isenção de declarações de rendimentos ao Constitucional.

A comissão parlamentar de inquérito que analisou as condições de nomeação e de demissão de António Domingues, antigo presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD), reúne-se pela última vez nesta quarta-feira. Os deputados vão discutir e votar o relatório final desta comissão, já com as propostas de alteração dos vários partidos integradas.

Na primeira comissão de inquérito à CGD, terminada em julho, o relatório final foi chumbado; na hora da votação, faltavam dois deputados do PS, que só chegaram a tempo de votar as conclusões desse documento. Desta vez, o relatório redigido pelo socialista Luís Testa deverá ser aprovado, ainda que tenha merecido várias críticas de quase todos os grupos parlamentares. O PCP já disse que não se opõe ao relatório tal como está, o Bloco de Esquerda quer alterações mas não põe de parte aprovar o documento, o CDS-PP admite votar de “espírito livre” e o PSD é o único que é claro em dizer que irá chumbar o relatório.

Bloco não quer ilibar Centeno

No relatório preliminar da comissão, Luís Testa ilibou o ministro das Finanças do caso da isenção de apresentação de declaração de rendimentos e património, por parte de António Domingues e restantes administradores da CGD, ao Tribunal Constitucional. Das audições e documentos entregues à comissão, o deputado socialista concluiu que não houve, entre Mário Centeno e António Domingues, qualquer acordo para esta isenção. No máximo, houve “meras referências ocasionais sobre essa matéria”.

O deputado bloquista Moisés Ferreira faz uma leitura diferente e quer referir no relatório final que, ainda que possa não ter existido um acordo formal, houve, pelo menos, uma discussão.

“A questão concreta da não apresentação da declaração de rendimentos e de património por parte dos futuros administradores da CGD foi colocada, mais do que uma vez, nestas conversas iniciais. Essa hipótese pode não ter tido acordo formal do Governo, mas também não foi afastada liminarmente, coisa que deveria ter feito se a sua intenção era não alterar essa obrigação”, pode ler-se na proposta de alteração de Moisés Ferreira.

O deputado quer ainda que o relatório refira que houve “leis feitas à medida e alterações legislativas feitas por escritórios de advogados”. Isto porque as alterações feitas ao Estatuto do Gestor Público, para que os administradores da Caixa ficassem isentos deste regime, foram feitas pela Campos Ferreira, Sá Carneiro e Associados, que também desenhou uma proposta para permitir que os administradores da CGD pudessem acumular mais cargos.

Estas práticas devem merecer crítica pública. Primeiro porque nem as sociedades de advogados, nem nenhuma entidade ou pessoa, se pode substituir aos órgãos legítimos e com competência legislativa. Segundo, porque num Estado de direito democrático não se pode admitir prática de legislação feita à medida”, escreve Moisés Ferreira, lembrando que as alterações para permitir maior acumulação de cargos acabaram por não avançar, mas “chegou a haver a intenção de proceder a essa alteração”.

PCP já vê as “questões fundamentais” no relatório

Do lado do PCP, o assunto está praticamente encerrado, até porque, do seu ponto de vista, “o objeto da comissão era quase um conjunto vazio”. Na última sessão da comissão, que decorreu na semana passada, o deputado Miguel Tiago disse que não irá opor-se às questões levantadas pelos restantes partidos, para que ainda possam ser introduzidas alterações, mas sublinha que “o relatório identifica as questões fundamentais”.

“Não nos parece que o relatório atalhe por cima de depoimentos que tenham sido divergentes. O relatório privilegia o que é material. Perante a indicação de António Domingues de que tinha havido um compromisso, e perante as declarações do ministro das Finanças, que diz não ter assumido esse compromisso, a verdade é que esse compromisso não só não foi assumido, como não está escrito em parte nenhuma. Em última análise, podemos até achar que o ministro das Finanças foi incompetente, porque queria isentar os administradores de apresentarem declarações de rendimentos e não conseguiu legislar sobre isso“, disse o deputado.

PSD vai chumbar documento

O mais crítico ao relatório é o PSD. O maior partido da oposição considera que ficou claro que houve acordo entre o Governo e António Domingues e, que, portanto, Mário Centeno mentiu no Parlamento quando disse que esse acordo não existiu.

Em conferência de imprensa na semana passada, Luís Marques Guedes salientou que “houve um acordo entre as duas partes” e que “deixou de haver condições políticas da parte do Governo pela polémica instalada”. Foi isso que “esteve na base do pedido de demissão de uma administração”, disse o social-democrata.

O PSD propõe, assim, conclusões alternativas às que constam do relatório elaborado por Luís Testa. Desde logo, o PSD conclui que, quando foi convidado para integrar a administração da Caixa Geral de Depósitos, António Domingues impôs um conjunto de condições, entre quais a isenção de apresentar as declarações de rendimentos e património ao Tribunal Constitucional. O Governo não só aceitou esse acordo como aceitou contratar um escritório de advogados para desenhar as alterações legislativas necessárias para implementar essa isenção.

Além disso, conclui o PSD, o Governo concedeu a António Domingues, quando este ainda integrava a administração do BPI, “informação agregada, muito para além da informação pública acessível”, para que o antigo banqueiro pudesse preparar o projeto de reestruturação da Caixa. Assim, foi violado o segredo de negócio da CGD, consideram os social-democratas.

Luís Marques Guedes já fez saber que o PSD irá votar contra o relatório.

CDS-PP vai votar de “espírito livre”

O CDS-PP também se opõe a que o relatório conclua liminarmente que o acordo entre Mário Centeno e António Domingues nunca existiu. A proposta dos centristas vai no sentido de se admitir essa hipótese, uma vez que os depoimentos são contraditórios. “Não foi possível concluir se em momento algum houve qualquer acordo para a alteração do Regime Jurídico do Controle Público da Riqueza dos Titulares de Cargos Políticos, uma vez que os testemunhos foram discordantes”, refere a proposta de alteração do CDS-PP.

“O que é possível admitir, é que possa ter sido suscitado o convencimento de que a alteração do Estatuto do Gestor Público, nos termos em que foi feita, poderia exonerar de restantes obrigações os Gestores Públicos em causa, o que, como se veio a demonstrar já se demonstrou, não exonera”, acrescenta.

Os centristas querem, ainda, e tal como o Bloco de Esquerda, que o relatório mencione o facto de que, a dada altura, António Domingues negociou com Bruxelas a recapitalização da CGD quando ainda era vice-presidente do BPI.

Apesar das críticas, na semana passada, o deputado João Almeida reconheceu que Luís Testa “fez um esforço para que o relatório fosse contextualizado com um clima de divergência entre os partidos, mas não de obstáculos ao funcionamento do regime dos inquéritos parlamentares”.

João Almeida diz ainda que não se revê no relatório, mas admitiu que houve um esforço para que o documento “permita um debate leal sobre as conclusões” e disse que votará as conclusões “de espírito livre”.

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