UBI: Quando a universidade atrai gente para o interior

  • Joana Azevedo Viana
  • 14 Junho 2017

A universidade que o ranking Time's Higher Education considerou uma das 150 melhores do mundo com menos de 50 anos está a atrair projetos e pessoas para o interior de Portugal.

Passou quase meio século desde que a chamada “Manchester portuguesa” entrou em crise, em pouco tempo assistindo ao encerramento de pequenas e grandes fábricas de lanifícios, a área industrial que lhe valeu esse estatuto. As consequências para a região foram desastrosas, mas serviram de motor à criação do que é hoje a Universidade da Beira Interior (UBI), inicialmente o Instituto Politécnico da Covilhã, que foi inaugurado em 1973. Nesse mesmo ano, do outro lado do Atlântico, foi lançado o Xerox Alto, um dos primeiros computadores pessoais capazes de suportar um sistema operativo e aquele que primeiro nos introduziu a um conceito que será eterno enquanto durar a era digital: desktop, a mesa de trabalho virtual dos nossos PCs.

Coincidência? Talvez não. Para o vice-reitor da UBI, Paulo Vargas Moniz, o segredo do sucesso da escola está encerrado “acima de tudo na sua capacidade multidisciplinar” que é, “sem dúvida, emergente da sua génese como uma estrutura inovadora de ensino superior”, explica ao ECO. “O prestigiado ranking Times Higher Education University concorda e, em 2016, destacou-a na lista de 150 melhores instituições de ensino superior do mundo com menos de 50 anos de existência.”

“Ser jovem também pode significar ser mais leve”, lembra o vice-reitor, responsável pelo Instituto Coordenador de Investigação. “A coordenação e a concertação internas são mais fáceis de atingir quando não tem de se enfrentar obstáculos ou hesitações renitentes. E estamos muito mais recetivos a testar ideias novas, temos muitos docentes jovens e em funções de direção, o que permite que coliderem estando sempre atentos ao que é novo.”

Hoje, a UBI não só alterou as dinâmicas socioeconómicas da Covilhã (“O campus é a cidade”, dizia o reitor António Fidalgo em dezembro, numa entrevista ao Público) como se tornou uma incubadora de projetos de investigação e parcerias nas áreas do digital que têm atraído a todos os municípios da Cova da Beira pequenas e médias empresas e multinacionais tecnológicas.

Veja-se o caso da OutSystems, uma multinacional portuguesa de desenvolvimento de software instalada em Proença-a-Nova que, em 2016, ultrapassou a barreira dos 100 milhões de dólares em vendas, um ano depois de ter assinado um protocolo de cooperação com a UBI, que abrange 90 alunos dos cursos de Engenharia Informática, Tecnologia e Sistemas da Informação e Engenharia Eletrotécnica e de Computadores. Ou o caso da PT, agora Altice, que em 2013 escolheu inaugurar o seu Data Center na Covilhã, com o compromisso de criar 1400 postos de trabalho na região.

As empresas estão a instalar-se aqui precisamente porque têm conhecimento do nosso trabalho de investigação, têm interesse nele e sobretudo nos nossos alunos.

Luís Alexandre

Professor do departamento de informática da UBI

“Os alunos são fundamentais, até porque são eles que vão criar e que vão bater código. Há um hábito do departamento em trazer alunos para o laboratório logo no primeiro ano, para ganharem gosto pela investigação. E essa aposta nos alunos e na estrutura de investigação que criámos é um aspeto realçado nas análises feitas à UBI”, como a da TIME há menos de um ano, adianta Luís Alexandre, professor do departamento de informática da UBI.

Fonte de atração

O incentivo à investigação científica não foi o único motivo pelo qual o Estado português decidiu apostar no fomento do ensino superior no interior do país: havia uma ideia subjacente de criação de polos de desenvolvimento, para fixar as pessoas e trazer para as regiões mão-de-obra qualificada e uma injeção de inovação, que é precisamente o que tem estado a acontecer na zona muito graças à UBI. Isso é notório até em projetos de âmbito regional como a criação de uma Rede Intermunicipal de Bibliotecas Beiras e Serra da Estrela, atualmente em marcha e parcialmente assente em fundos comunitários, refere o professor José Rosa, diretor da Biblioteca da UBI e um dos impulsionadores do projeto — que passa, para já, por criar um Catálogo Coletivo assente numa plataforma digital, a Koha, que ligue as 15 bibliotecas municipais, as bibliotecas escolares da região, as bibliotecas da UBI, a do Instituto Politécnico da Guarda e, “desejavelmente, também as hospitalares”. O objetivo é “desmaterializar os conteúdos e centralizar os recursos, para criar uma consciência regional e valor acrescentado no âmbito da Cultura, coisa de que o interior carece como pão para a boca”, explica Rosa.

Dos 500 alunos por ano inscritos em cursos ligados à transformação digital na UBI, muitos acabam por ser pescados pelos olheiros empresariais que já abraçaram a necessidade urgente de adaptação e recurso às novas tecnologias. Na Beira Interior o número é cada vez maior e é à UBI que muitas vezes recorrem, para contratar como para apostar nas mentes mais jovens. “Quando fui presidente do departamento entre 2013 e 2015, pedi aos nossos técnicos que colocassem na página web os logótipos de todas as empresas com as quais temos parcerias, seguramente mais de 20”, conta Luís Alexandre. Entre elas destacam-se uma parceria com a EFACEC, multinacional portuguesa que desenvolve produtos de energia, sistemas e mobilidade e que, com carimbo UBI, criou o programa informático que controla o metro do Porto; uma com a Edisoft, também portuguesa, que desenvolve sistemas de defesa e de tecnologia aerospacial; e uma com a SAP, “empresa por trás de um software muito importante de apoio à gestão empresarial”, explica o professor.

Neste momento, o departamento que integra está à espera de uma resposta “provavelmente positiva” de financiamento de um projeto de 12 milhões de euros, que envolve a universidade do Porto e a de Trás-os-Montes e Alto Douro e a fábrica da Peugeot-Citröen (PSA) em Mangualde, a par de quatro empresas de robótica e de processamento de imagem. “Com a PSA queremos modernizar e melhorar o tecido produtivo, os equipamentos e processos da fábrica; as universidades fazem a investigação e as empresas constroem os protótipos”, explica Luís Alexandre sobre a sinergia, financiada pela AICEP com fundos do programa Portugal 2020 da Comissão Europeia para o desenvolvimento económico, social e territorial do país.

A par disso, acrescenta Vargas Moniz, a UBI tem-se destacado com projetos de investigação científica em variadas áreas, das telecomunicações aos têxteis, do ambiente à saúde, muito graças a um protocolo de mecenato com o banco Santander, que por ano atribui 200 mil euros para bolsas de incentivo a doutoramento e a pós-doutoramento — “um investimento de quase um milhão de euros em cinco anos, que nos permitiu continuar a ter bolseiros e investigadores apesar dos cortes orçamentais no ensino superior registados no passado recente”, explica o vice-reitor. “Graças a isso, continuamos a progredir.”

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