Trumponomics: bê-á-bá da nova disciplina americana

  • Juliana Nogueira Santos
  • 20 Janeiro 2017

Faltou às aulas do novo tutor de economia dos Estados Unidos da América ou não conseguiu perceber bem a matéria? Não há problema, o ECO partilha a sebenta de Trumponomics consigo.

No ECO compreendemos que não tem sido fácil acompanhar as propostas de Donald J. Trump para a economia americana. Na verdade não tem sido acompanhar as propostas desde a campanha eleitoral, mas hoje é o dia em que o presidente eleito se torna presidente e em que as propostas passam de apenas propostas a leis.

Trump disse, em declarações à Fox News, que já na segunda-feira vão ser emitidas 200 ordens executivas. Com tanta pressa e tantos planos, quais vão ser os seus próximos passos nos vários ramos da economia americana?

Comércio. A guerra com todos

Os acordos internacionais do comércio serão alvos primários da administração Trump a começar pelo NAFTA, a ser renegociado ou cancelado se o México e o Canadá não cooperarem, e a acabar (literalmente) com o Tratado Transpacífico.

Trump já tinha começado a guerra com as empresas que estão a passar os empregos para o lado de lá da fronteira, avisando que vão ser impostas taxas às importações. O próximo passo será um frente a frente com a China, declarando o país como um manipulador fiduciário — por manipular o valor da sua moeda para ganhar vantagem nas exportações — e cobrando uma tarifa de 45% às importações oriundas daí.

Impostos mais baixos

O princípio a seguir pela nova administração é bastante simples: reduzir impostos para aumentar o investimento. A primeira medida fiscal será modificar as tabelas de tributação e reduzir os escalões dos sete de agora para apenas três. A seguinte é modificar o sistema de maneira a que os ganhos de capital provenientes de investimentos deixem de ser taxados como se fossem rendimentos regulares.

A maior quota de benefícios irá para as empresas que queiram manter os seus negócios dentro do país, primeiro porque não vão ter de pagar as taxas de importação altíssimas que vão ser impostas — 35% foi o valor proposto no caso do setor automóvel –, depois porque vão passar a pagar menos — apenas 10% — para repatriar os seus lucros. O imposto cobrado ao lucro destas vai sofrer uma revisão, dos 35% para 15%.

Infraestruturas. Os grandes investimentos

A administração de Trump prevê que sejam investidos em infraestruturas cerca de um bilião de dólares, um valor que concorre com os quatro biliões investidos aquando do New Deal. Além do já famoso muro, a ser erguido na fronteira com o México e que poderá ter um custo de 25 mil milhões de dólares, os destinatários desse dinheiro serão linhas ferroviárias, estradas, aeroportos, pontes e oleodutos. E os remetentes? Parcerias público-privadas a serem celebradas ao longo do mandato, para que que os custos estatais sejam menores.

Trump (doesn’t) care

Durante a campanha eleitoral, Donald Trump fez questão de associar uma expressão ao programa de saúde desenvolvido pelo seu antecessor: “repeal and replace”, ou como quem diz revogar e substituir. O então candidato republicano também fazia questão de afirmar o quão desastroso este se veio a tornar, desastre esse que só pode ser resolvido com a criação de uma lei de raiz.

O processo de revogação já foi despoletado no Senado, instituição onde os republicanos contam com a maioria absoluta. Ainda assim, o presidente eleito já afirmou que podem ser salvas algumas medidas populares do Obamacare, nomeadamente o facto de não poder ser negado seguro por doença preexistente ou a extensão dos benefícios dos planos aos dependentes com menos de 26 anos.

O programa que irá substituir o Affordable Care Act ainda não é conhecido — e muitos (democratas) dizem que ele ainda nem sequer existe, por ser impossível de fazer.

Machadada na regulação

Devido à crise financeira de 2008 e para garantir que nada parecido acontecesse outra vez, a administração de Obama apertou o cerco às empresas com a criação de instrumentos de regulação mais atentos. Trump, baseado na sua experiência de empresário, garantiu que a regulação foi um dos principais motivos pelos quais o crescimento económico não foi tão expressivo, tendo servido como um entrave às empresas.

Assim, nos primeiros cem dias, o plano será riscar duas leis de regulação federal por cada nova que vá ser instituída. O alvo principal já está escolhido: o Dodd-Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act implementado pela administração Obama para prevenir um novo colapso do sistema financeiro e proteger os contribuintes de práticas financeiras de risco. A sua escolha para a pasta do Tesouro, Steven Mnuchin, afirmou que a lei era demasiado complicada e que reduzia os empréstimos ao consumo.

Dívida Nacional. É para baixar

Segundo dados de dezembro de 2016, a dívida nacional americana ascendia a 107% face ao valor do Produtos Interno Bruto. O presidente eleito declarou já a sua intenção de fazer tudo para que este valor se aproxime do zero nos oito anos que estiver na Casa Branca — prevendo já assim a sua reeleição em 2020.

O truque estará em pagar menos do que aquilo que deve, ou seja, tentar renegociar a dívida ao máximo. O crescimento será também uma ferramenta para diminuir a dívida, tendo o vice-presidente estabelecido a meta de crescimento nos 3,5 a 4%.

Energia? Sim. Petróleo

“Uma invenção dos chineses para a América ser menos produtiva.” É assim que Trump, bem como a maioria das suas escolhas para a Casa Branca, definem as alterações climáticas. E se são uma invenção, não vale a pena canalizar fundos para lidar com isso.

Assim, o plano dos primeiros cem dias de mandato contempla o cancelamento do financiamento dos programas de alterações climáticas das Nações Unidas e a utilização dos milhares de dólares poupados nas infraestruturas ambientais americanas. O cancelamento, ou pelo menos a renegociação, do acordo de Paris também está em cima da mesa.

Para impulsionar o mercado energético nacional e diminuir a dependência em relação aos países produtores, a nova administração prevê também levantar as restrições à produção de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão limpo) impostas pelas anteriores.

Juros baixos acabaram

Trump não gosta de Yellen, tendo já afirmado que as políticas monetárias que têm estado a ser seguidas por ela e pela sua equipa na Reserva Federal não teriam espaço na sua administração. O ponto mais criticado tem sido as taxas de juro negativas que se mantiveram até dezembro do ano passado e que estavam “a criar uma bolha”. Ainda assim, a Fed continua a ser a ter independência completa.

O que trará o futuro?

Embora o primeiro impacto da vitória de Trump não tivesse sido o mais positivo, com as bolsas asiáticas a retraírem-se, os índices americanos têm estado a negociar em máximos históricos. As sucessivas ameaças às empresas foragidas também têm dado resultados, com a Fiat Chrysler e a General Motores a anunciarem investimentos.

As previsões da OCDE também são bastante animadoras, com o PIB a crescer 1,2% até 2018 e a taxa de desemprego a cair 0,5%. Contudo, para estes valores não está prevista a imposição de políticas protecionistas — que, na verdade, são bastante prováveis. A OCDE prevê também que a inflação suba 0,5% no mesmo período.

A dívida nacional é que não vai seguir a mesma trajetória: o Tax Policy Center estima que, se estas políticas forem seguidas, esta possa aumentar em 22.1 biliões de dólares no prazo de 20 anos.

Também já é sabido que muitos economistas, incluindo o Nobel da Economia Joseph Stiglitz, defendem que o plano seguido por Trump não vai trazer bons resultados para o país: “Há um consenso amplo de que este tipo de políticas que o nosso Presidente eleito propôs estão entre aquelas políticas que não vão funcionar”, afirmou.

Resta-nos esperar para ver quais as conclusões desta nova disciplina económica. Daqui a um tempo faremos a avaliação do professor.

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