Sete maiorias negativas que podem baralhar as contas do Orçamento

Da taxa de proteção civil à atualização dos escalões de IRS, passando pelo tempo de serviço dos professores. São várias as maiorias negativas que estão a formar-se no Parlamento.

Uma “maioria negativa” é uma expressão da política para designar situações em que uma maioria de deputados na Assembleia da República se junta para chumbar uma proposta do Governo ou para aprovar medidas à revelia do Executivo ou do partido que o apoia.

A maioria negativa que mais deu que falar na atual legislatura aconteceu em 2017 quando a esquerda (Bloco e PCP) e a direita se juntaram para chumbar a proposta do Governo que previa a redução da TSU em 1,25 pontos como contrapartida para o aumento do salário mínimo nacional, uma solução que até tinha a luz verde dos parceiros sociais. Aliás, Catarina Martins, durante a XI Convenção Nacional do partido, confessou que “houve um momento em que a legislatura esteve em risco”, precisamente por causa desta questão da TSU.

A aprovação de uma proposta dos comunistas para permitir a entrada gratuita em museus aos domingos de manhã e feriados, a imposição do Bloco para a divulgação mensal do valor das cativações, ou ainda a maioria que se juntou em abril para obrigar o Governo a fazer um novo concurso para os professores são exemplos de outras maiorias negativas que se formaram no Parlamento nesta legislatura.

Novas maiorias negativas podem estar na calha durante a votação das propostas do Orçamento do Estado na especialidade: da taxa de proteção civil à atualização dos escalões de IRS, passando pelo tempo de serviço dos professores. Há umas que são mais certas do que outras. Vamos por partes.

Chumbar nova contribuição de proteção civil

O Governo quer criar uma nova contribuição para a proteção civil, uma taxa parecida com a que foi adotada em Lisboa, Setúbal e Gaia, mas que foi chumbada pelo Tribunal Constitucional.

PSD, Bloco, CDS e PCP já se manifestaram contra esta taxa e o destino mais provável é que ela seja chumbada nas votações na especialidade do Orçamento que vão acontecer de 26 a 29 de novembro.

Eliminar o Adicional do ISP

Em julho, partidos à direita e à esquerda ameaçaram formar uma maioria negativa para reverter o Adicional do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP), mas essa maioria nunca se chegou a formar para evitar que os deputados violassem a chamada lei travão que impede a Assembleia da República de aprovar uma alteração significativa na receita fiscal durante a execução de um orçamento.

Durante a discussão do Orçamento no Parlamento, Mário Centeno veio anunciar que está prevista a redução do ISP da gasolina em três cêntimos, uma medida que será concretizada por portaria e que, segundo o ministro das Finanças, colocará o ISP da gasolina aos níveis anteriores ao aumento de seis cêntimos realizado em 2016. Já no caso do gasóleo, o combustível mais consumido em Portugal, não haverá qualquer alteração.

Os partidos serão agora novamente chamados a votar uma medida sobre a eliminação do Adicional do ISP, nomeadamente no gasóleo, mas não é certo que haja votos suficientes. O Bloco, por exemplo, mostrou-se satisfeito com a descida anunciada por Mário Centeno.

Tempo de contagem dos professores

Promete ser um dos dossiês que mais dores de cabeça dará ao Governo pelo montante de despesa envolvido. O Governo propôs uma solução de contabilizar 2 anos, 9 meses e 18 dias do tempo de serviço que esteve congelado. Mas os sindicatos pedem mais: querem 9 anos, 4 meses e 2 dias.

À direita e à esquerda já foram apresentadas propostas no sentido de ir ao encontro da pretensão dos sindicatos, propondo uma solução parecida com aquela que foi encontrada para a Madeira, em que vai haver a recuperação total do tempo que esteve congelado, mas com uma devolução muito faseada no tempo. O PCP, por exemplo, sugere um faseamento de sete anos e o Bloco de cinco anos.

O Governo tinha dado indicações de que entre a proposta dos 9 anos, 4 meses e 2 dias e a dos 2 anos, 9 meses e 18 dias havia uma diferença de custo de 455 milhões de euros, em velocidade cruzeiro e sem faseamento.

‘Taxa Robles’ para penalizar mais-valias imobiliárias

É mais um tema que une a esquerda e a direita mas que não é visto com bons olhos no Largo do Rato.

Entre as 15 medidas que o PSD apresentou para a área da habitação, uma delas prevê a diferenciação da tributação das mais-valias imobiliárias em sede de IRS em função do período durante o qual os imóveis são detidos antes de serem colocados no mercado.

Por exemplo, se um particular comprar um imóvel e depois decidir vendê-lo num prazo inferior a 1 ano, a tributação incidirá sobre a totalidade da mais-valia. Se a venda ocorrer num período entre 2 a 5 anos, a taxa liberatória incidirá apenas sobre metade das mais-valias apuradas. O Bloco de Esquerda também apresentou uma proposta semelhante, com a inovação de considerar na fórmula também o valor investido na reabilitação do imóvel.

Atualização dos escalões de IRS à taxa de inflação

O Governo continua a dizer que a atualização dos escalões de IRS à taxa de inflação “não faz sentido”, com o argumento de que os efeitos da redução do número de escalões, de cinco para sete, ainda produzirá efeitos em 2019.

A não atualização à taxa da inflação implica que os rendimentos que estão no limiar desses escalões possam vir a pagar mais imposto quando os rendimentos são atualizados, por exemplo, à taxa da inflação.

Aqui também esquerda (PCP) e direita (CDS) já entregaram propostas para que se faça a atualização. O impacto poderá ascender a 60 milhões de euros.

Travar agravamento da tributação autónoma dos carros das empresas

É uma das medidas contra as quais mais têm protestado os empresários. Para as viaturas com um custo de aquisição inferior a 25 mil euros, a taxa autónoma passa de 10% para 15%, e para carros com um custo de aquisição igual ou superior a 35 mil euros, a taxa passa de 35% para 37,5%.

Neste ponto, esquerda (PCP) e direita (nomeadamente CDS) estão alinhados com os empresários, com o argumento de que o Governo estaria a criar um novo PEC (pagamento especial por conta) e a penalizar as empresas independentemente dos lucros que obtenham.

Travão às cativações

À semelhança do que aconteceu no último Orçamento, também no de 2019, os partidos querem colocar mais travões às famosas cativações de Mário Centeno. O CDS apresentou uma série de propostas para proibir cativações orçamentais nas áreas da saúde, defesa, segurança interna, justiça, formação profissional e entidades reguladoras. No caso da saúde, também poderão contar com o apoio dos bloquistas.

O Bloco propõe ainda que se excetuem das cativações as dotações afetas a projetos relacionados com vários programas de investigação científica e do Ensino Superior.

Votações de 26 a 29 de novembro

Durante esta e a próxima semana, os partidos ainda podem alinhar estratégias, fazer cedência e gizar alianças. Durante a discussão na especialidade, os partidos apresentaram quase mil propostas para alterar o Orçamento e até o Presidente da República já veio avisar que o calendário da promulgação pode derrapar por causa do elevado número de propostas.

Mário Centeno, num artigo de opinião no ECO, também já veio fazer alguns avisos à navegação, mostrando-se contra a aprovação de medidas que só tenham em conta “um lado da balança”, ou seja, medidas que só aumentem despesas ou só reduzam receitas.

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