• Entrevista por:
  • Helena Garrido e Paula Nunes

Pedro Nuno Santos diz que juros estariam a subir com qualquer Governo

O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares considera que o Governo merecia que lhe fizessem justiça em matéria de contas públicas. Porque o défice será inferior a 2,3%, sem planos B e cortes.

 

O tema são as contas públicas, o agravamento dos juros, a dívida pública e a presença de Portugal no euro. Nesta parte da entrevista ao ECO, Pedro Nuno Santos considera e explica que a atual subida das taxas de juro da dívida pública estaria a verificar-se mesmo com qualquer o outro Governo à frente dos destinos de Portugal.

Reestruturação da dívida? Temos um problema com os encargos com a dívida, reconhece, mas as soluções têm de ser construídas no quadro europeu, defende em linha com o que tem sido dito pelo primeiro-ministro. Estudar a saída do euro? Respeita a posição dos parceiros mas manifesta prudentemente a sua discordância.

Sobre o défice orçamental de 2016, Pedro Nuno Santos lamenta que não exista “honestidade intelectual” da parte dos críticos reconhecendo que erraram. Ao diagnóstico de que há muita receita extraordinária a explicar a redução do défice público contrapõe “despesa extraordinária” herdada do anterior Governo.

Vamos olhar para as contas públicas de 2016. Vou-lhe perguntar se concorda com esta afirmação: o défice público de 2016 foi conseguido graças a menos juros, ao perdão fiscal e menos investimento. Foi assim?

Não. Já tenho lido muitas análises que diminuem o resultado que foi conseguido.

Mas considera que isto diminui o resultado?

Diminuem o resultado algumas das apreciações incompletas sobre as medidas extraordinárias, ou supostamente extraordinárias. Desde logo o PERES [‘perdão fiscal’] representa menos de 0,2% do PIB. A perspetiva é ter um défice orçamental [em 2016] nunca superior a 2,3%. O PERES não pode ser nunca a explicação para não termos um défice superior a 2,5%, que era a meta acordada com Bruxelas.

Sobre investimento: é sempre com muita surpresa que vou ouvindo comentadores, jornalistas ou políticos especializados em economia a identificar a travagem de investimento como a explicação para a redução do défice. É suposto que essas pessoas saibam que o investimento público é todo co-financiado com fundos comunitários. Por isso, se o investimento público não é feito, é verdade que há menos despesa, mas também há menos receita que corresponde aos fundos comunitários para o financiar. Também não é a redução do investimento que explica a diminuição do défice orçamental.

E depois há outra perna que falta na análise de muitos: as despesas extraordinárias a que o Governo teve que fazer face em 2016. Entre elas as alterações de tributação de fundos de investimento, que suscitou mais despesa em 2016, as alterações da regra do coeficiente familiar, que produziu efeitos apenas em 2016, as alterações na tabela de retenção na fonte e no pagamento por conta no IRC… A despesa extraordinária, a que tivemos que fazer face em 2016, foi muito superior às medidas extraordinárias que foram implementadas.

O cumprimento da lei pode ser classificado como uma despesa extraordinária?

Depende. Se houver um montante extraordinário de reembolsos em 2016, que foge àquilo que é o normal, isso quer dizer que, por diferentes vias, o Governo anterior chutou para 2016 reembolsos. Portanto, houve um empurrar de despesa para 2016, à qual nós tivemos que fazer face.

Não foi empurrada receita de 2015 para 2016?

Já agora qual?

Merecíamos alguma justiça quando se faz a análise do exercício orçamental. Percebo que muita gente queira provar que “eles conseguiram, mas…”. Mas se calhar eles também têm que assumir, como assumiu a OCDE, “enganamo-nos”. É um sinal de honestidade intelectual.

Pedro Nuno Santos

A informação é assimétrica, como sabe?

Mas nós não a temos. Se alguém a tiver… Merecíamos alguma justiça quando se faz a análise do exercício orçamental. Percebo que muita gente queira provar que “eles conseguiram, mas…”. Mas se calhar eles também têm que assumir, como assumiu a OCDE, “enganamo-nos”. É um sinal de honestidade intelectual. Este Governo conseguiu o défice mais baixo da história da democracia portuguesa, doa a quem doer. Não devia doer. Devia ser motivo de regozijo. Sem cortes nos salários, sem cortes nas pensões, sem aumentos da carga fiscal. Apenas prova que a estratégia que vinha a ser seguida era errada.

Mas porque é que era errada? O aumento dos salários provoca redução do défice público?

Não, o corte é que não provocou a redução do défice ou pelo menos a redução da dívida. Empobrecemos o país, cortaram-se salários, cortaram-se prestações sociais, fez-se o maior aumento de impostos, de IRS, da história da nossa democracia. E mesmo assim o Governo anterior não conseguiu acertar uma única vez a meta orçamental. Não tem um exemplo para dar.

Mas sabe o que se passava na conjuntura económica na altura?

Agora podemos encontrar desculpas. Mas os exercícios orçamentais são sempre exercícios de incerteza. E no quadro dessa incerteza, o Governo anterior apresentou oito orçamentos retificativos. Ou doze em quatro anos.

Vê algum problema em apresentar orçamentos retificativos?

Os orçamentos que são apresentados são fantasiosos.

E se a realidade mudar?

E já viu o que é mudar duas vezes no mesmo ano?

Quando compara a previsão com a execução, é diferente

É verdade. O desemprego. Nós falhamos. Baixou mais.

Estou a falar da previsão orçamental. Se compararmos o que estava orçamentado com o que foi executado é completamente diferente.

Costuma ser assim, sempre. Agora, a única coisa que nós pedíamos, e acho que temos esse direito, é alguma honestidade intelectual na análise feita do exercício orçamental para 2017.

Qual é então a sua explicação para a redução do défice público?

As medidas que foram tomadas, as medidas que estão inscritas no Orçamento do Estado para 2016 é que permitiram que se atingisse o défice.

Que medidas? Qual é o raciocínio seguindo esta linha: “isto fez com que isto acontecesse e levou à redução do défice”.

Conseguimos nas rubricas de receita superar a previsão. Conseguimos ter despesa inferior àquilo que estava previsto. Por isso, há um exercício orçamental que é fiel ao que estava orçamentado e que permite atingir um défice melhor do que estava previsto. Não foram os planos B, que sistematicamente foram sendo anunciados, e que ainda hoje alguns insistem como a razão ou explicação para o défice, que explicam o défice orçamental. A reavaliação de ativos, também apontada como medida extraordinária, estava prevista já no OE 2016, não faz parte de nenhum plano B.

Nós ouvimos também “Ah, são cativações”. As cativações são apenas um bom instrumento de gestão orçamental, ao qual diferentes os governos recorrem. Não recorremos a mais a cativações do que o Governo anterior.

Pensa que em 2017 este efeito continuará a fazer-se sentir? Vai ser fácil atingir o défice público de 2017?

Atenção, eu não disse que foi fácil. Disse que conseguimos aquilo que o Governo anterior não tinha conseguido. Aquilo que os nossos comentadores e analistas tinham previsto. Foi com grande trabalho do ministro das Finanças e de todo o Governo. Esse trabalho continuará. Nós temos é para 2017 uma coisa que não tínhamos no início de 2016: que é a credibilidade conquistada em 2016.

Os fundamentais da nossa economia são bons. O que quer dizer que com outro Governo, o problema das taxas de juro [ a subirem] colocar-se-ia da mesma maneira.

Pedro Nuno Santos

Essa credibilidade por que é que não se reflete na descida dos juros da dívida pública? Todos os indicadores na frente económica registam uma tendência positiva. A tendência é de recuperação da confiança, de descida do desemprego e mais importante ainda de criação de emprego. Houve redução do défice público, o que colocará com muita probabilidade Portugal fora do procedimento de défices excessivos. A questão é: Porque razão as taxas de juro da dívida não descem e até sobem?

E deixe-me só indicar mais dois indicadores: o excedente primário, muito valorizado, é um dos maiores da zona euro e a dívida pública líquida diminui. É importante — tal como a bruta que podemos falar a seguir — mas a líquida, porque as almofadas financeiras são boas num ano de grande imprevisibilidade.

Mas vamos falar dos juros.

Os fundamentais da nossa economia são bons. O que quer dizer que com outro Governo, o problema das taxas de juro colocar-se-ia da mesma maneira. Acho que devemos todos tentar perceber quais são as razões.

Quais são as suas razões?

Há razões que não são nacionais. Há explicações internacionais que explicam a subida generalizada noutros países e depois há explicações mais concretas dirigidas a Portugal. Assistimos, desde as últimas eleições americanas, a um aumento generalizado das taxas de juro. Mais nuns países que noutros. Temos também, em termos homólogos, a subida do preço do petróleo o que tem contribuído para um aumento da inflação com impacto nas taxas de juro nominais.

A isto acresce no caso de Portugal o facto de o ritmo de compra de dívida pública portuguesa por parte do BCE ter decrescido bastante. E demonstra o que o PS sempre disse: no quadro de uma zona monetária, o papel do BCE como estabilizador das taxas de juro é determinante. Temos de olhar para diferentes causas, com serenidade. E com a convicção de que é do interesse do euro e do BCE, e de todos os países da União Europeia, controlar qualquer movimento ascendente das nossas taxas de juro.

Acha que a dívida pública devia ser reestruturada?

Em Portugal é consensual, julgo eu, que enfrentamos encargos com a dívida que são muito significativos e que isso constitui um fardo para a nossa economia. E por isso, é natural que Portugal veja com bons olhos iniciativas europeias para aliviar esse fardo. Que não é apenas um problema português. É para nós claro que qualquer resposta para a dívida pública em Portugal, não deve ser encontrada fora do quadro europeu. Não queremos uma resposta para o país A ou B. Queremos é que a União Europeia encontre uma resposta que permita garantir previsibilidade, a prazo, e que encontre um enquadramento institucional, no quadro europeu, para um problema que não é só nacional. É um problema europeu, que nos atinge de forma particular.

E quando é que acha possível falar nesse assunto?

Eu não parto do princípio que este tema não esteja sempre presente no quadro europeu. A única questão que posso dizer, sobre a pergunta direta que faz, é que o Governo português, obviamente, reconhece o peso significativo da nossa dívida na riqueza nacional, mas que qualquer resposta deve ser encontrada no quadro europeu.

Não tenho a certeza de que isso [estudar a saída do euro] signifique algum ganho para o país. Mas acho que pode significar perdas para o país.

Pedro Nuno Santos

No quadro atual que vivemos na Europa, acha que Portugal devia estudar a possibilidade de sair do euro?

Não tenho a certeza de que isso signifique algum ganho para o país. Mas acho que pode significar perdas para o país. O compromisso deste Governo com a participação no processo de construção europeia, de pertença à União Europeia e à Zona Euro é muito claro, desde início. Também são muito claras as posições dos nossos parceiros nesta solução governativa, mas isso ficou patente e clarificado desde o início. O compromisso histórico que o PS tem com o projeto europeu é sério. Para além de que nós achamos que as consequências de uma rutura com a UE, para a nossa economia, para além de imprevisíveis, serem muito provavelmente negativas. Por isso, não nos parece que esse seja o caminho. Mas respeitamos a autonomia dos nossos parceiros para poderem fazer as intervenções e a defesa do seu programa e propostas.

 

  • Helena Garrido
  • Paula Nunes
  • Fotojornalista

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