O cancro maior

Os bloqueios institucionais que amarram a economia portuguesa são, como sabemos, tremendos. E a justiça parece-me o maior de todos eles.

Há dias, um conhecido e reputado advogado da praça lisboeta (Hugo Rosa Ferreira) foi citado em entrevista ao Negócios (20/10), afirmando que [os casos da banca terão] “pelo menos dez anos nos tribunais portugueses”. Dez anos.

Os bloqueios institucionais que amarram a economia portuguesa são, como sabemos, tremendos. E a justiça parece-me o maior de todos eles. Sem surpresa, de acordo com a mais recente edição do relatório de competitividade do “World Economic Forum”, em matéria de eficiência da justiça, Portugal classifica em 126º lugar entre 138 países.

A morosidade da justiça portuguesa é a face mais visível da sua inoperância. É também a mais enervante. Segundo dados da Direcção-Geral da Política de Justiça, a duração média dos processos cíveis findos em tribunais de primeira instância é de 37 meses. Três anos, portanto. E, note-se, são processos que apenas findam em primeira instância.

Nos tribunais administrativos e fiscais a situação não é tão má. Nestes, no final de 2015, seriam necessários 989 dias para limpar todos os processos pendentes. Não são três anos. São apenas dois anos e nove meses. De duração média e, repito, em primeira instância.

Em Portugal, passamos tempo interminável a discutir as contas públicas – e contra mim falo –, e em discussões abstractas que frequentemente esquecem as coisas terrenas. Que esquecem a realidade do dia-a-dia. Quando falamos, por exemplo, do investimento, mais importante do que saber se este está a aumentar ou a diminuir, seria perceber por que é que está a aumentar ou a diminuir.

A inoperância da justiça no nosso País, constituindo um dramático obstáculo ao investimento – porque sem segurança contratual não há economia de mercado –, deveria, pois, estar na dianteira do debate. Infelizmente não está. E, no entanto, tanta coisa, a começar nos números anteriores, haveria para discutir. Desde questões relacionadas com o poder corporativo dos agentes judiciários e suas opacas agendas, às questões da gestão da administração pública – porque a justiça, não obstante a separação de poderes, é administração pública –, não faltaria matéria para análise e debate.

A proposta de Orçamento do Estado para 2017 prevê uma redução de 5% na despesa efectiva consolidada do Ministério da Justiça face a 2016. Setenta por cento da despesa deste ministério será para pagar salários. E de uma dotação orçamental de 1294 milhões de euros, somente 463 milhões serão destinados a financiar o sistema judiciário propriamente dito (tribunais).

Será isto adequado? Será isto eficiente? Será isto suficiente? Que impacto tem o deficientíssimo desempenho da justiça em Portugal sobre o investimento? Tem a senhora ministra da Justiça, ou para este efeito alguém no Governo, algum pensamento, alguma reflexão concreta e estruturada sobre estas matérias? Hoje? Ou daqui a dez anos?

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