Salários da CGD: Vai ficar tudo como está?

O tema volta hoje à Assembleia da República com a discussão de dois projetos-lei. Paulo Macedo, ex-ministro da Saúde, é agora o alvo da investida do PSD e do CDS nos salários da CGD.

Já está: Paulo Macedo é o novo presidente executivo da Caixa Geral de Depósitos e Rui Vilar sobe a presidente do Conselho de Administração. Mas há algo que não muda: os salários da administração. Macedo vai receber os mesmos 423 mil euros por ano, mais prémios consoante os resultados da CGD, o que pode catapultar o valor para mais de meio milhão. Mas a questão está longe de ficar resolvida. O valor é criticado pelo BE e pelo PCP, assim como pelo PSD e CDS que apresentam novamente esta terça-feira propostas no Parlamento, mas uma maioria negativa neste tema é menos provável.

A esquerda e a direita aliaram-se em casamentos improváveis nas votações na especialidade do Orçamento do Estado para 2017. Contudo, nos salários da CGD isso não se verificou, dando até em discussão entre Mariana Mortágua e António Leitão Amaro. O deputado do PSD queria votar os pontos da proposta do BE sobre os salários em separado, mas a bloquista rejeitou invocando a “coerência interna” da proposta.

A proposta acabou por ser votada em conjunto e os sociais-democratas não viabilizaram. O mesmo aconteceu em sentido contrário: o BE não viabilizou a proposta do PSD sobre os salários dos gestores públicos. Na maioria negativa pode também entrar o PCP: os comunistas também não concordam com o valor. No entanto, o problema está no difícil acordo entre os três partidos para que uma proposta possa avançar sem o aval do Partido Socialista, que já marcou bem a sua opinião: os gestores são para ser bem pagos para evitar riscos que se verificaram no passado.

Os salários “podem ser muito impopulares, mas não arrisco a má gestão”, avisou António Costa. “Os vencimentos estão fixados, a legislação está em vigor e não a vamos mudar. Fizemos uma remuneração para que a CGD tenha uma gestão profissional para que possa recrutar no mercado administradores ao nível de qualquer outro banco. É uma opção política que foi tomada, está mantida e vai ser executada”, afirmou o primeiro-ministro esta segunda-feira.

PSD quer fazer rewind

É o Partido Social-Democrata que repesca o assunto esta terça-feira de tarde no plenário. Em causa estão duas propostas que envolvem os temas quentes à volta da CGD: o Estatuto do Gestor Público, os regimes jurídicos do setor empresarial do Estado e os deveres de transparência aos administradores da Caixa Geral de Depósitos. Na redação da primeira proposta especificamente relativa aos salários auferidos pela administração da CGD, o PSD escreve que o Governo criou um “regime de grave exceção” que cria isenções em pontos “elementares” como os limites salariais.

“Com esta decisão do Governo Socialista, os administradores da CGD ficaram ‘a salvo’ de todas as regras essenciais do Estatuto do Gestor Público que se aplicam a todas as outras empresas públicas”, acusa o maior partido da oposição: “O Governo Socialista foi, bem para além do razoável, e fixou salários de montantes excessivos e injustificados e criando um regime de exceção para os gestores da Caixa”.

O PSD argumenta que o vencimento do novo presidente executivo “representa quase o triplo do montante da remuneração anual do anterior Presidente da Comissão Executiva da CGD (232 mil euros, de acordo com o relatório de gestão e contas de 2015 daquela instituição) “. O mesmo argumento é dado em relação aos vogais. No total, pelas contas do PSD, a atual administração poderá custar 3,6 milhões de euros anuais em comparação com um milhão na anterior.

Os sociais-democratas acusam o Governo de fazer política circunstancial e não uma decisão coerente em relação aos salários dos gestores públicos. “Se o Governo discordasse efetivamente da coerência, justiça interna e adequação daqueles limites, não os teria deixado em vigor para todas as demais empresas públicas que não a CGD”, escreve o PSD que quer fazer regressar a regra anterior que apelava “ao bom senso e à razoabilidade política”.

O PSD acusa António Costa de tratar a CGD “como uma empresa privada”, abrindo “a porta à sua transferência para o setor privado. Opção que não subscrevemos e com a qual não nos conformamos”. É de referir que, apesar de ter recuado nessa posição, Pedro Passos Coelho — líder do partido e um dos autores desta projeto de lei — já defendeu a privatização da Caixa Geral de Depósitos. Esta segunda-feira, no ECO Talks, o ex-primeiro-ministro frisou que defendeu que a Caixa deveria ter capital privado (até 49%), mas argumentou que isso não é o mesmo que defender a privatização do banco.

A proposta do PSD recupera a média remuneratória dos últimos três anos para estabelecer o salário. Mas o essencial está neste ponto: o projeto de lei do PSD revoga a alteração feita pelo Partido Socialista e obriga essa revogação a aplicar-se aos mandatos em curso. No ECO Talks, Passos Coelho abriu o jogo dizendo que não existe um “sistema que seja perfeito” e, por isso, melhorado com a criação de duplos limites. “O limite do mercado e um limite estabelecido por um múltiplo das funções entre a própria instituição”, indicou.

CDS entre a esquerda e PSD

Não estava previsto, mas o CDS submeteu também dois projetos de lei sobre o mesmo assunto “sob condição de admissão”, pode ler-se na agenda parlamentar do site da Assembleia da República. A primeira pretende a clarificação “do alcance das respetivas obrigações declarativas”. Já o segundo projeto de lei estabelece “limites remuneratórios”, alterando o Estatuto do Gestor Público, revogando o regime de exceção criado pelo Decreto-Lei nº 39/2016, de 28 de julho. Ou seja, o que o Governo tinha criado e que provocou a polémica na CGD.

“É principalmente a consagração do valor da contenção, no que respeita às remunerações a pagar a estes profissionais que justifica a presente iniciativa legislativa”, começa por escrever o CDS. O partido liderado por Assunção Cristas argumenta que a conjuntura económica não é compatível com o pagamento de salários milionários a gestores públicos. Qual a solução? Os centristas querem limitar os salários dos gestores públicos ao do primeiro-ministro.

Mas existem várias nuances nesta proposta. Vamos por partes: o CDS concorda com o PSD e propõe que a remuneração “não exceda o limite da média da remuneração dos últimos três anos”. Contudo, o projeto de lei dos centristas prevê um regime remuneratório excecional onde, nesse caso, os gestores públicos não podem ter um salário superior ao do primeiro-ministro.

Esse regime excecional aplica-se quando o país está com dificuldades financeiras e económicas. “No caso de o valor da dívida pública justificar a necessidade de ajustamento orçamental e de contenção remuneratória na administração pública, designadamente quando forem excedidos valores máximos previstos em instrumentos internacionais a que Portugal se encontra vinculado, o vencimento dos gestores públicos fica sujeito ao limite remuneratório correspondente ao vencimento do primeiro-ministro”, escreve o CDS.

Neste caso, o CDS concede que seja pago um prémio de gestão. “Pode acrescer prémio de gestão cujo valor não exceda o limite de metade da média da remuneração dos últimos três anos“, explica a proposta, referindo que o prémio tem de ser justificado pelo ministro das Finanças e pode ser atribuído desde “que se verifique ter havido o cumprimento integral das orientações e objetivos fixados à empresa pelo acionista e se reconheça ter o gestor contribuído, individualmente e de forma destacada, para o cumprimento dessas orientações e objetivos”.

Marcelo, BE e PCP pressionam

O BE tem vindo a defender que o teto salarial máximo dos gestores públicos, incluindo os da Caixa Geral de Depósitos, deve ser o do salário do primeiro-ministro, pelo que a proposta do PSD neste ponto, que viabiliza um salário em linha com a média salarial dos últimos três anos de cada gestor, deverá voltar a ser chumbada, tal como aconteceu na votação na especialidade do Orçamento do Estado. Na mesma linha, o PCP tinha proposto que o salário dos gestores públicos tivesse como limite 90% do ordenado do Presidente da República. A proposta colheu o apoio do CDS e do BE, mas o centrão renasceu nesse momento com o voto contra do PSD e PS a impedir a passagem desta regra.

O próprio Presidente da República já avisou que “se há fundos públicos, não é possível nem desejável pagar o que se pagaria se fosse um banco privado sem fundos públicos”, o que vai completamente contra o Governo que quer pagar em linha com o restante setor bancário. Além disso, Marcelo Rebelo de Sousa tinha recordado que os bancos privados devedores de empréstimos ao Estado tiveram cortes de vencimentos dos administradores até 50%.

João Soares

No Partido Socialista, o tema também não é consensual. O ex-ministro da Cultura de António Costa escreveu no seu Facebook este domingo que é contra os salários na Caixa Geral de Depósitos. “Espero muito sinceramente que, rapidamente, prescindam, publicamente, de parte substancial do “salário”, estupida e obscenamente pantagruélico, negociado por Domingues”, classificou o socialista João Soares.

Editado por Pedro Sousa Carvalho

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