Editorial

Um Rio de ética… e os afluentes

O secretário-geral do PSD faltou a sessões parlamentares com deputado, mas está registado como se tivesse estado presente. "Questiúnculas", diz Rui Rio, o mesmo que dá "banhos de ética" aos outros.

Rui Rio foi eleito presidente do PSD com uma agenda de recentragem do partido (ou de bengala do PS de António Costa, dependendo das perspetivas) e com uma estratégia de moralização da política. Os banhos de ética, porque o sistema está sujo, considera Rio. Mas quando o seu (segundo) secretário-geral – o primeiro saiu por falsificar o CV – falsifica participações parlamentares, não há qualquer problema, são “questiúnculas” que justificam apenas um sorriso de desdém, coisa menor. Temos de saber, então, qual é o ranking de pecados que justificam os banhos de ética de Rio.

A história é do Expresso deste fim de semana, e esperava-se uma resposta de Rui Rio à altura dos banhos de ética que recomenda a terceiros. O secretário-geral do PSD, José Silvano, teria o dom da ubiquidade. Estaria em dois sítios ao mesmo tempo, coisa vedada ao comum dos mortais. Em reuniões partidárias do PSD e, ao mesmo tempo, sentado na Assembleia da República. Afinal, não, não se tratava de ubiquidade, mas de registos falsos. Alguém, que o próprio Silvano não consegue identificar, marcou presença do secretário-geral. Consequência? A primeira é mesmo o direito do deputado a receber despesas que, por não ter estado presente, não deveria receber.

É uma questão de princípio, caro Rui Rio. Não é uma “questiúncula”, é uma questão de verdade política. Como referia há dias o jornalista Paulo Ferreira, e colunista do ECO, temos de fazer uma lista de atos que são aceitáveis, porque fará parte da tradição. Enganar os serviços da Assembleia, mentir, através de uma confirmação eletrónica, que um deputado esteve a fazer um trabalho em nome de quem o elegeu, não é uma coisa menor, é uma coisa maior. Como não é o caso das moradas falsas para os deputados receberem subsídios de deslocação, como é o caso das sucessivas leis decididas em causa própria, dos deputados para proteger os partidos e as suas finanças, como é o caso dos conflitos de interesse dos políticos ou da ocultação da lista de ex-políticos que recebem pensões públicas por essas funções.

Rui Rio desvalorizou o que o seu anterior secretário-geral tinha feito, manteve-o em funções até ao limite, e agora está a seguir exatamente o mesmo modelo. Só descredibiliza a política, os políticos, só se descredibiliza a si próprio, por causa da exigência de ética que vem sempre agarrada ao seu discurso. Porque é o que mostra, porque diz o que pensa, porque é diferente dos outros.

Na verdade, não é diferente dos outros, é, aliás, pior do que os outros quando classifica esta prática sem qualquer tipo de censura, mínima que seja, na defesa do seu próprio discurso (a prática, como vimos, é outra). O mesmo líder que acusa o governo de enganar o parlamento com estratégias orçamentais quer ser levado a sério quando desvaloriza, assim, o que classifica de “questiúnculas”? Não pode. Nem vai ser.

PS: E o Presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, não tem nada a dizer sobre este caso?

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