Editorial

Um Rio de contradições

O presidente do PSD revela não perceber o papel que cabe aos meios de comunicação social na fiscalização dos poderes em funções.

Chega! Rui Rio já tinha sinalizado, nos últimos seis meses e mais do que uma vez, os tiques populistas tão bem apontados por David Dinis aqui no ECO, já tinha demonstrado que quer mesmo ser, primeiro, o chefe do PSD, em vez de estar preocupado em criar as condições para ser o líder do país. Este domingo, no encerramento da universidade de verão do PSD, Rio foi mais longe: A comunicação social só cá anda para ganhar dinheiro e para vender jornais. Estranho conceito, este, do presidente do PSD sobre o papel dos jornalistas e do jornalismo, sobretudo sobre os equilíbrios numa democracia, entre quem governa e quem tem a função de fiscalizar.

O presidente do PSD convive mal com a comunicação social, isso já se sabia, sabe-o bem especialmente quem teve a responsabilidade de acompanhar jornalisticamente a atividade da câmara do Porto. As divergências são normais, as tensões e o contraditório também, porque o papel dos jornalistas é mesmo o de questionar os poderes em função, seja o político ou o económico. Mas Rui Rio não se limita ao confronto com os jornais, já está à beira de transformar os jornalistas em inimigos públicos da democracia. Isto faz-nos lembrar alguém, não é? Rio já esteve mais longe.

Rui Rio tem uma visão conspirativa do jornalismo em geral, e dos jornalistas em particular, mas revela que não percebe exatamente o papel que cabe a cada um deles. Os jornais andam cá para ganhar dinheiro e para vender papel (ou publicidade no online)? Também andam, e ainda bem. Senão, qual seria o interesse dos seus acionistas? Rio deveria ficar preocupado, sim, se os acionistas dos meios de comunicação social investissem para perder dinheiro. Significaria que o quereriam ganhar de outra forma. Além disso, caro Rui Rio, é precisamente porque a comunicação social tem de ser independente que deve ter (também) essa preocupação, a de ganhar dinheiro e vender jornais. Caso contrário, teria de andar a toque de caixa dos líderes políticos que, a cada momento, têm o poder e olham para a comunicação social e para os jornalistas como instrumentos que podem utilizar nas suas estratégias. Sim, o jornalismo não precisa de se prostituir para cumprir o serviço público que lhe está cometido.

Rui Rio reclama, para si mesmo, a pureza de quem só tem a preocupação do serviço público, do bem público, do interesse do país. Já os outros, a comunicação social (e o Ministério Público, já agora), têm outros interesses, financeiros, comerciais. São uma espécie de ‘vendilhões do templo’, o templo político puro onde só está Rui Rio. Não são. Ou não são nem mais nem menos do que são os políticos, ou os não-políticos, como Rio se apresenta. Há maus jornais, maus jornalistas e mau jornalismo? Há, claro. Há jornais e jornalistas que se vendem? Muito menos do que nos quer fazer crer Rui Rio. Porque a larga maioria, a esmagadora maioria, cumpre as regras éticas e deontológicas. Tantas vezes sob pressão de interesses, tantas vezes sem condições. Se a comunicação social fosse apenas, como Rio a considera, um negócio, não existiria. Nem haveria investidores, nem jornalistas.

Qual é o maior problema? Do país, não é da comunicação social. Por um lado, Rui Rio acredita mesmo no que diz. Depois, quer ser o anti-regime, o anti-político. É o presidente do maior partido da oposição que temos. Alguns poderão ver até uma virtude nisto. Eu não. Só vejo riscos para a democracia, para o desenvolvimento saudável de um país.

Nota: Deveríamos todos estar a discutir as propostas alternativas de Rui Rio para o país. Pois é… Mas estamos a discutir as purgas que o chefe do PSD quer fazer dentro do partido e a ofensiva crescente contra a comunicação social e o Ministério Público.

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