Portugal, um país cativo

As cativações de 942,7 milhões de euros, um valor histórico, são a outra face de uma política expansionista nos salários e pensões. E um instrumento para esconder a verdadeira política orçamental.

As tragédias têm destas coisas, sejam elas em Pedrógão Grande, em Tancos ou em qualquer país que pratica a Democracia: Levam a perguntas que ajudam a esclarecer os cidadãos. É o que está a suceder nestes dias, perante a evidência de que não houve milagres na execução orçamental de 2016 e no cumprimento do défice, houve opções políticas, e uma mudança de sítio da austeridade, que não é neutra, tem consequências.

O país – o que acredita em milagres – ficou cativo do discurso político de António Costa e Mário Centeno, e só agora terá descativado. Vem isto a propósito das cativações – leiam-se cortes de despesa, mesmo que o ministro das Finanças jure que não são – nas transferências para os ministérios no orçamento do ano passado.

Esta quarta-feira, o ministro Mário Centeno esforçou-se por nos identificar as áreas que não tinham sido alvo de cativações, num exercício que nos levou àquele que José Sócrates fez quando anunciou ao país o programa da troika. Mas não esclareceu, afinal, as cativações, ou cortes, de mais de 942 milhões de euros nas transferências para os ministérios. Nem sequer as áreas de governação que foram afetadas.

As cativações não são um instrumento de gestão novo, existem há anos e estão nas mãos dos ministros das Finanças. Mas são, ou devem ser, um mecanismo de segurança, uma salvaguarda. Em 2016, não foram isso, foram uma forma de esconder cortes nas transferências para os ministérios.

A Margarida Peixoto fez uma viagem à Conta Geral do Estado de 2016, para responder à pergunta ‘onde estão as cativações’? É um serviço público, porque é como descobrir uma agulha num palheiro. A informação é, até, contraditória. Há cativações na Saúde e na Educação? Não. Mas há cativações na Saúde e na Educação? Sim. O diabo está nos detalhes, isto é, em que áreas são feitos esses cortes definitivos que, no início do orçamento, eram apenas cativações. E, já agora, na condição de entidade fiscalizadora da ação do governo, seria útil ouvir os diretores gerais e outros responsáveis da administração pública para explicarem como é que essas cativações afetaram, ou não, os serviços e o funcionamento do Estado.

Até o Bloco de Esquerda e a deputada Mariana Mortágua já perceberam que têm de fazer alguma coisa para não ficarem colados a esta estratégia orçamental. Pois, mas não é possível querer ficar apenas com o lado bom da história, com os aumentos salariais e de pensões. Também têm de assumir a consequência dos cortes que aprovaram. Como o PCP, aliás.

O ministro das Finanças, é evidente, vai ter de mostrar o que está por detrás das cativações, em que áreas específicas foram as cativações transformadas em cortes definitivos, porque o governo ainda responde à Assembleia da República, mesmo este que tem o BE e o PCP no bolso.

Em 2016, como bem explicou, com números, o Joaquim Miranda Sarmento em artigo de opinião no ECO, não houve nenhum milagre orçamental. Houve cortes no investimento, medidas extraordinárias e, sim, muitas cativações. Para tornar possível, claro, a estratégia de conquista de votos em grupos de eleitores relevantes. Compram-se e vendem-se votos, assim.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Portugal, um país cativo

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião