A irracionalidade dos impostos Mortágua

O novo imposto sobre o património não tem racionalidade económica nem promove a justiça fiscal.

Faz agora mais ou menos um mês desde que foi anunciada a introdução de um imposto de natureza progressiva sobre o património imobiliário de alto valor. As notícias que então vieram a público apontavam inicialmente para a inclusão no seu perímetro de aplicação dos fundos imobiliários, dos ricos com elevado património acumulado, e daqueles que através de sociedades registadas no estrangeiro fossem donos de activos valiosos em Portugal.

Assim se chegaria, segundo se alegou, a uma receita estimada de 200 milhões de euros. Mas rapidamente se instalou a polémica e, sucessivamente, vários passos foram sendo dados pelo Governo no sentido de restringir a aplicabilidade potencial do novo imposto. Ao ponto de, ainda ontem, ter sido noticiado que as entidades patronais terão recebido garantias (presume-se que do Governo) de que os imóveis utilizados pelas empresas para fins produtivos (mesmo que detidos fora dos seus balanços por investidores terceiros?) ficarão isentos de tal imposto.

Perguntar-se-á então: mas que racionalidade económica está associada a esta medida tributária? E que justiça fiscal, sempre tão apregoada pelo senhor Primeiro Ministro, é esta?
A resposta às questões anteriores é um enigma que o Governo tentará resolver nos próximos dias. Fá-lo-á politicamente, por certo. Porque dos pontos de vista da racionalidade económica e da justiça fiscal a medida não encontra defesa possível. Nem a receita é relevante para os objectivos orçamentais – as últimas estimativas apontam para uns míseros 60 milhões de euros –, nem de justiça fiscal se pode falar quando a isenção se terá tornado a regra de partida.

A discussão política, nesta como noutras matérias, encontra-se envenenada pela demagogia ideológica. Num país que está estagnado há quinze anos, e onde a desigualdade salarial (mas, note-se, não a de rendimentos) tem crescido, fica bem à esquerda atacar o tão famigerado 1%.

Atacar uma minoria é sempre fácil. E do ponto de vista político é também racional porque, sendo o objectivo dos partidos a obtenção do poder pela maximização do número de votos, o benefício marginal do ataque político ao 1% é certamente superior ao seu custo marginal. Mas do ponto de vista económico sucede o contrário. O que aqui verdadeiramente interessa não é atacar o 1%, mas sim melhorar as condições de partida dos 99%.

No caso de Portugal trata-se, sobretudo, de incentivar a poupança que, por sua vez, financia o investimento (que escasseia). É assim que se estimulará a capacidade produtiva da economia nacional, que juntamente com o crescimento demográfico (igualmente inexistente em Portugal) constituem as alavancas de crescimento de qualquer economia.
O investimento total em Portugal representa hoje pouco mais de 15% do PIB. Há quinze anos representava mais de 25% do produto. Neste domínio, em apenas quinze anos o País passou a estar na cauda da Europa; quando deveria estar na sua liderança para reduzir o défice de produtividade (e de competitividade) que nos distancia dos demais. É, pois, neste contexto macroeconómico que todo e qualquer sinal de hostilização da poupança e do investimento por parte dos agentes políticos deve ser firmemente repudiado.

Em Portugal, de acordo com os dados do INE, a limitação que mais penaliza a realização de investimento pelas empresas é a deterioração das suas perspectivas de venda. Mas, é muito importante sublinhar, esta limitação é hoje, em 2016, mais intensa do que era em 2015, não obstante a política de estímulo ao consumo do Governo.

O estímulo ao consumo, numa economia sobre endividada e pequena como a nossa, resulta assim num equívoco de racionalidade política e também, porquanto insustentável, na origem económica dos desincentivos ao investimento, de que o “imposto Mortágua” é exemplo. O que, aliás, é natural: o consumo representa, antes de mais, uma renúncia à poupança. É, enfim, o contrário do que Portugal precisa – o País precisa acima de tudo de investimento – e sobre o qual nesta coluna tenderei a escrever.

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