Trabalho: a evolução na continuidade

Este é o terceiro artigo de um conjunto de análises à proposta de OE2017 no âmbito do acordo do ECO com as universidades do Minho, do Porto e de Coimbra, com a marca ECO da Academia.

Não sendo o seu objeto principal, o Orçamento do Estado (OE) não é inócuo do ponto de vista dos seus efeitos no mercado de trabalho. Estes efeitos decorrem não só dos impactos agregados do OE na despesa interna, e da relação desta com o nível de emprego e com os salários, mas também das políticas setoriais de algum modo relacionadas com o mercado de trabalho, como sejam, por exemplo, as políticas ativas de emprego, ou as decisões de natureza fiscal e contributiva com incidência sobre o fator trabalho.

No que diz respeito à previsão da relação entre crescimento do PIB e do emprego, assume-se uma elasticidade inferior à unidade, ou seja, por cada ponto percentual de crescimento do PIB prevê-se para 2017 um crescimento do emprego em 0.67 pontos percentuais, valor aliás igual ao estimado para 2016, mas inferior ao de 2015 (elasticidade de 0.88) e ao de 2014 (elasticidade de 1.56). Ou seja, esta é uma previsão realista para o crescimento do emprego, à qual corresponde um crescimento modesto da produtividade aparente do trabalho em 0.5% e uma redução da taxa de desemprego para 10,3%.

Mas os problemas do mercado de trabalho português não devem ser reduzidos apenas às dimensões emprego e desemprego. Às baixas qualificações da força de trabalho, e à fragilidade da estrutura empresarial interna, os fatores mais marcantes da oferta e da procura de trabalho, estão associados vários fatores de cariz institucional que resultam em disfunções no funcionamento das relações laborais, como são o caso da precariedade contratual e da persistência de elevadas taxas de desemprego de longa duração e de desemprego jovem.

Estas disfunções traduzem-se quer numa perceção de insegurança quer na manutenção de baixos salários, com uma proporção demasiado elevada de trabalhadores com remunerações iguais ou próximas do salário mínimo nacional.

Como resposta aos problemas acima descritos, o OE de 2017 reforça a componente de formação de ativos, através do Programa Qualifica, com objetivos ambiciosos a médio prazo (50% da população adulta com o ensino secundário em 2020, face a 39% em 2011; aumento da taxa de participação de adultos em atividades de aprendizagem ao longo da vida para 15%, entre outras), e propõe a reformulação de várias medidas ativas de emprego, como são os estágios e os contratos emprego inserção, de acordo com os princípios da proporcionalidade, seletividade e condicionalidade, a qual deverá traduzir-se num redução dos montantes gastos nestas medidas, em grande parte financiadas com recurso a fundos estruturais.

No que diz respeito ao combate à precariedade, o Orçamento privilegia a componente inspetiva e de fiscalização por parte da Autoridade para as Condições de Trabalho como principal instrumento de combate ao trabalho não declarado ou ao uso abusivo de contratos a termo. Basear o combate à segmentação do mercado de trabalho português em ações de caráter fiscalizador parece-nos claramente insuficiente, e com resultados limitados.

A dualidade existente obriga a repensar as formas contratuais atuais, no sentido de avaliar a introdução de novas formas de contratualização entre trabalhadores e empresas que tenham em conta não só as novas formas de trabalho emergentes, mas também que permitam novas combinações entre segurança e flexibilidade laboral.

Aurora Teixeira (Universidade do Porto), Anabela Carneiro (Universidade do Porto), João Cerejeira (Universidade do Minho), Miguel Portela (Universidade do Minho) e Sandra Silva (Universidade do Porto)

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