Privilegiar a concentração empresarial

É necessário privilegiar o desenvolvimento económico através da concentração de pequenas empresas.

Em Portugal, o sobrepeso das microempresas constitui um sério obstáculo ao desenvolvimento da economia. No nosso país, as microempresas (empresas que empregam menos de 10 trabalhadores ou que facturam menos de um milhão de euros por ano) representam mais de 40% da empregabilidade total, por comparação com menos de 30% na média da União Europeia.

A esta realidade, acresce ainda um outro impedimento estrutural: a falta de espírito colaborativo, especialmente entre as pequenas e média empresas (PME), no desenvolvimento de produtos inovadores. Em Portugal, de acordo com o European Innovation Scoreboard de 2017, não chega a 10% a proporção de PME’s que colaboram entre si no desenvolvimento das suas estratégias de inovação. Ou seja, temos uma economia muito dependente de pequeníssimas empresas que, em geral, estão fechadas sobre si mesmas.

Na semana passada escrevi sobre a necessidade de privilegiar o financiamento da economia por via de capitais próprios. Hoje escrevo sobre um tema adjacente: a necessidade de privilegiar o desenvolvimento económico através da concentração de pequenas empresas. Sublinho a expressão “pequenas empresas”, e não de todo o tipo de empresas – como o título deste artigo, propositadamente evasivo, poderia indicar –, porque entre as grandes empresas a concentração empresarial em Portugal já é elevada. Na realidade, se há matéria relativamente à qual a Autoridade da Concorrência deveria estar preocupada é a existência de oligopólios em vários sectores de actividade. Mas sobre os cartéis escreverei noutra ocasião. No artigo de hoje, vou focar-me nas vantagens de uma maior concentração de pequenas empresas.

A literatura académica e a experiência profissional ensinam-nos que a dimensão das empresas, regra geral, é um factor determinante na produtividade empresarial. Empresas de maior dimensão possuem em geral métodos de gestão mais profissionalizados; maior acesso a recursos humanos e a fontes de financiamento; e melhores capacidades de investimento, inovação e desenvolvimento. O crescimento e a dimensão costumam revelar o nível da ambição empresarial, ainda que ambição e sucesso não andem necessariamente de mãos dadas.

De facto, a dimensão, sobretudo entre as grandes empresas, traz também dissabores. Empresas de grande dimensão facilmente se tornam reféns dos seus gestores (o velho problema do principal e do agente); menos focadas quando ficam excessivamente diversificadas; ou menos rentáveis em proporção do volume de capitais investidos.

As microempresas representam em Portugal 95% do total de empresas. É a partir das microempresas que crescem as pequenas e médias empresas. A generalidade das “start-ups”, hoje em dia muito na moda, começam como microempresas e grande parte da dinâmica de criação de emprego destas depende. O problema é mesmo a fraca capacidade de inovação da maioria das microempresas. Porque, cada vez mais, é na capacidade de inovação – isto é, a existência de uma ideia diferenciadora à qual se junta um modelo de negócio competitivo –, aliada ainda à chamada “escalabilidade” do negócio, que reside o sucesso empresarial (certamente nos moldes que convencionalmente medem o sucesso empresarial).

Neste contexto de grande atomização e fraca propensão à inovação, gera-se um espaço (e um propósito) para a adopção de políticas públicas que, de forma não intrusiva e não dirigista da iniciativa privada, possam fomentar a concentração empresarial.

  • Primeiro, o Estado pode (e deve) disponibilizar informação empresarial. Em Portugal isto já sucede porque qualquer um pode aceder às chamadas IES’s (Informação Empresarial Simplificada), o que permite a fácil identificação das empresas em maior crescimento ou daquelas que mais investem no seu negócio. Estas são as empresas que mais facilmente serão alvo de interesse por parte de concorrentes, de outras empresas de maior dimensão, ou de empresas que buscam parceiros. A informação, como tantas vezes costumo sublinhar, é um bem público que o Estado, enquanto prestador de bens públicos, deve sem dúvida prestar.
  • Segundo, o Estado deve providenciar leis de insolvência céleres. É sabido que a economia de mercado (há quem lhe chame capitalismo!) assenta no conceito da destruição criativa. Para tal, é necessário que o capital possa ser reciclado em tempo útil e transferido das actividades não lucrativas para aquelas de maior potencial, ou que outro alguém possa pegar nos negócios insolventes dando-lhes vida nova.
  • Terceiro, o Estado pode criar isenções fiscais sobre receitas derivadas de projectos empresariais conjuntos que constituam incentivo adicional para colaboração empresarial e que representem uma primeira aproximação colaborativa (algo que é infrequente entre nós).

De facto, é neste terceiro pilar de incentivos, as isenções fiscais sobre receitas derivadas de projectos conjuntos, que me parece existir um caminho especialmente promissor. A melhor forma de promover a concentração empresarial entre empresas complementares, ou empresas gémeas na ambição e na estratégia de crescimento, é propiciar uma primeira colaboração.

A introdução de um benefício fiscal seria, assim, a cenoura que, podendo ser encarada como um fim em si mesma, seria na realidade um meio para um determinado fim: a criação de parcerias empresariais. Porque quanto mais parceiras forem as empresas maior a probabilidade de o “flirt” resultar em namoro e este em casamento com comunhão de adquiridos.

É, aliás, isso que ao longo dos anos tenho testemunhado. As empresas que “estão no mercado” para operações de concentração e crescimento buscam sobretudo um parceiro industrial que as potencie na geração de valor acrescentado. Quando não é esse o propósito explícito, então, das duas uma: ou o negócio está financeiramente ameaçado, prestes a implodir, ou mais propício a uma reestruturação liderada por uma capital de risco; ou os sócios pretendem apenas conhecer o valor de mercado das suas empresas sem qualquer intenção efectiva de as alienarem ou de partilharem controlo (e proveitos).

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