O “Consenso orçamental” – Parte III

Que modelo de Estado queremos, com mais ou menos peso no PIB? Esta opção é condicionada por questões económicas. Portugal deve estar alinhado com os países do Sul e Leste da Europa.

Nas últimas semanas, defendi que é necessário equilibrar as contas públicas, reduzir a dívida pública para 90% do PIB e criar um consenso orçamental em torno deste paradigma das Finanças Públicas. Mas também defendi que esse consenso é imprescindível para o debate que urge fazer na sociedade Portuguesa: que modelo de Estado queremos.

  1. O Consenso Orçamental – Parte I
  2. O “Consenso orçamental” – Parte II

Ou seja, o que importa debater e decidir é se queremos um Estado mais interventivo (logo com mais despesa, obrigando a uma maior carga fiscal) ou um Estado menos interventivo (com menos despesa, permitindo menos impostos). Ambas as hipóteses são compatíveis com o equilíbrio das contas públicas, mas também com uma maior eficiência dos serviços públicos e da utilização dos recursos públicos. Bem como com a garantia de acesso aos serviços públicos por parte de todos os portugueses e uma maior redução as desigualdades sociais.

Saliente-se, tal como referi, que a maior eficiência e racionalização dos recursos e serviços públicos não depende da dimensão do Estado.
É importante, assim, frisar que a dimensão do Estado impacta nas suas funções, mas o modelo de organização dos serviços públicos é independente desse debate.

Poderíamos dizer que a escolha da dimensão e das funções do Estado é eminentemente política, dado que resulta de escolhas políticas, de prioridades, sendo uma decisão com um forte pendor ideológico, embora, como veremos mais à frente, sempre sujeita às restrições económicas que a realidade impõe.

Já o modelo de organização é eminentemente técnico. É um debate autónomo do primeiro, já que a organização do setor público não depende da sua dimensão e atuação. As decisões políticas sobre os bens e serviços aos quais o Estado garante acesso, ou sobre quais as falhas de mercado a regular estão numa esfera diferente das decisões relativas ao modelo de governo das entidades encarregadas do fornecimento desses bens e serviços ou das tarefas de regulação. Refira-se que não há evidência empírica de qualquer correlação entre a dimensão do setor público e a sua eficiência.

Pelo que o debate deveria, dentro destes princípios, se circunscrever à dimensão do Estado e a partir daí às funções do Estado e ao modelo de organização do Estado. Neste artigo foco-me apenas no primeiro aspeto, deixando os outros dois para outros artigos.

Embora a escolha da dimensão do Estado e das suas funções seja uma escolha política, e portanto sujeita ao escrutínio democrático, entendo contudo que não pode ser dissociado do contexto económico que Portugal atravessa, bem como da posição competitiva do país face aos seus principais concorrentes. Ou seja, não é possível decidir de forma totalmente autónoma a dimensão do Estado.

Essa decisão tem de ser enquadrada pela questão “quanto podemos gastar?”. Isto é, ao definir-se o limite máximo de despesa, está a condicionar-se todo o restante debate.

É simples perceber o porquê desta condicionante na escolha da dimensão do Estado. A despesa pública é financiada por impostos ou défices (dívida pública). Assumindo um cenário de saldo orçamental equilibrado, a despesa passa a ser financiada em exclusivo pela capacidade da economia em gerar receitas. Isto implica, necessariamente uma de duas hipóteses: Ou a despesa se ajusta a um nível de carga fiscal que está em linha com os concorrentes económicos de Portugal, ou então Portugal terá de ter uma carga fiscal superior a esses países.

Os países com quem Portugal se terá de comparar não são os países da zona Euro, mas em nossa opinião, os países da Coesão (Espanha, Itália, Irlanda e Grécia) e os países de Leste. Uma escolha de uma despesa pública mais elevada que o de estes países implica também uma escolha política de uma carga fiscal mais elevada.

Desta forma, sou de opinião que a despesa pública primária (isto é, excluindo os juros) em percentagem do PIB deverá corresponder a um valor em linha com o dos países atrás mencionados.

O gráfico abaixo apresenta, para 2015, a posição relativa de Portugal em termos de despesa primária. Considerando que a média destes países é de uma despesa primária de 35% PIB, Portugal, para se situar nesse valor teria de fazer um ajustamento de 5 pontos percentuais (p.p.) do PIB.

Refira-se que para cumprir as regras orçamentais Europeias (nomeadamente o saldo estrutural equilibrado), Portugal tem ainda de fazer um ajustamento (de despesa e/ou receita) de cerca de três p.p. do PIB. Esse ajustamento feito do lado da despesa permitiria a Portugal ficar próximo da média atrás referida, tornando-se mais competitivo.

Despesa primária em % PIB em 2015

Fonte dos dados: AMECO

Em síntese, e relativamente à dimensão do Estado, entendo que Portugal tem de estar alinhado não com os países do centro e norte da Europa, mas sim com os países do sul e do leste Europeu, seus concorrentes diretos.

Claro que nesta análise há que considerar que face aos países do Leste temos uma desvantagem que resulta de uma população mais envelhecida (que gera pressão do lado da redução das receitas e do aumento da despesa). No entanto, uma escolha de uma despesa pública mais elevada colocar-nos-á com uma carga fiscal muito superior à destes países, gerando mais um fator de perda de competitividade.

Desta forma, em matéria de dimensão do Estado, a realidade impõe que procuremos reduzir o nível da despesa primária dos atuais 40% do PIB para um valor entre os 35%-37%.

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