UE quer revolucionar a forma como as empresas pagam impostos

  • Marta Santos Silva
  • 25 Outubro 2016

Não se fala em taxas comuns sobre os rendimentos das empresas, mas sim em criar regras transfronteiriças que ajudem as empresas a internacionalizar-se e os países a receber a justa parte dos impostos.

A Comissão Europeia vai apresentar e discutir propostas para avançar com um projeto que estava desde 2011 em águas de bacalhau: a iniciativa MCCCIS, um projeto para uniformizar as regras de cálculo da matéria coletável das empresas multinacionais que atuam na União Europeia.

A MCCCIS, ou Matéria Coletável Comum Consolidada do Imposto sobre as Sociedades, tem como principais objetivos facilitar a internacionalização das empresas, aumentar a competitividade dentro do mercado único e, especialmente, evitar que as empresas que atuam em mais do que um Estado-membro aproveitem as diferentes legislações para pagarem impostos apenas nos regimes mais favoráveis, sem serem tributadas no país onde geraram lucros.

Para o conseguir, a Comissão Europeia propõe que se criem regras comuns para o cálculo da matéria coletável das empresas, que sejam aplicáveis da mesma forma em todos os Estados-membros. Numa segunda fase do projeto, viria a consolidação: as empresas que tivessem subsidiárias em vários países da União Europeia “consolidariam” todos os seus lucros ao nível da empresa-mãe, e depois esses lucros seriam “distribuídos” pelos países onde o grupo atua, de acordo com uma fórmula concreta, permitindo assim a tributação dos rendimentos de acordo com os países onde tinham sido gerados.

A importância do timing certo

O ambiente é favorável à discussão deste projeto. Consultados pela Comissão Europeia em 2015, todos os Estados-membros afirmaram ser favoráveis a uma reabertura da deliberação sobre o assunto, mesmo os nove que, em 2011, decidiram vetar a primeira formulação da MCCCIS.

“As prioridades em 2011 não eram a fiscalidade das empresas”, disse ao ECO o semester officer da Comissão Europeia em Portugal, João Medeiros. “Em 2011, a prioridade era a questão da dívida soberana, das finanças públicas, da criação de um mecanismo de supervisão”.

Agora, os olhos estão postos na questão da fuga ao Fisco pelas empresas através do aproveitamento da multiplicidade de regimes fiscais para as sociedades na União Europeia. Segundo a Comissão Europeia, que o deixa explícito no vídeo abaixo, uma empresa multinacional que opere em vários países da UE paga em média menos 30% em impostos sobre os seus rendimentos do que uma empresa que opere em apenas um país.

O caso mais flagrante é certamente o da Apple, que se viu no centro da controvérsia quando a Comissão Europeia concluiu que a Irlanda, onde a empresa tecnológica norte-americana tinha decidido declarar a maior parte dos seus lucros conseguidos na UE, deveria recuperar à Apple 13 mil milhões de euros em impostos que não tinham sido pagos devido a incentivos estatais que as autoridades consideraram injustos.

É por isso que a proposta chumbada em 2011 pode agora ter uma nova vida. A conjuntura está alinhada com a necessidade de taxar os rendimentos das empresas onde estes são gerados, pelo que a nova proposta deve focar-se mais nesse aspeto. Além disso, as empresas multinacionais com um rendimento acima de um limite a determinar vão ser obrigadas a usar o mecanismo, ao contrário da proposta de 2011 em que isso era opcional.

O que têm as empresas a ganhar?

O mecanismo, garante o semester officer João Medeiros, “não vai afetar em nada a soberania dos Estados-membros para imporem a tributação dos lucros como melhor entenderem”. Os impostos de cada país não serão mexidos, nem se pretende implementar taxas mínimas sobre os rendimentos das sociedades.

João Medeiros afirma que o mecanismo servirá “para facilitar um pouco a vida às empresas, para poderem fazer a sua declaração através de um framework conjunto”. Afinal, uma multinacional que trabalhe nos 28 Estados-membros está a trabalhar, potencialmente, com 28 conjuntos de regras diferentes para o cálculo da sua matéria coletável. Uma base tributável comum retiraria esta barreira.

No vídeo abaixo, a Comissão Europeia sublinha como o MCCCIS pode ajudar as pequenas e médias empresas a internacionalizar-se, por terem de gastar menos dinheiro em custos administrativos para corresponderem aos diferentes regimes fiscais. Também as grandes multinacionais ficariam a ganhar porque, ao possibilitar a consolidação dos rendimentos ao nível da empresa-mãe, juntando perdas num país e lucros noutro e pagando impostos de acordo com essa matéria coletável.

Numa conferência de imprensa no início de setembro, o comissário europeu Pierre Moscovici disse que prevê que as alterações ao nível dos custos de conformidade poderia poupar 0,7 mil milhões de euros às empresas europeias e reduzir os custos da internacionalização em 62%.

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