Podemos discutir – a sério – o crescimento económico?

Em termos acumulados, nos últimos 16 anos, Portugal teve o terceiro pior crescimento da União Europeia.

Mas este facto – gravíssimo – ainda não entrou na consciência nem das elites nem da população, que parece que ainda não estão preparados para as mudanças essenciais para mudar este estado de coisas.

Entre 2000 e 2016, o crescimento acumulado na UE foi de 23,2%, enquanto em Espanha foi de 27,1% e o da Irlanda foi de 91,5%, o melhor de todos. Como podem verificar no gráfico abaixo, a maior parte dos países que cresceu acima da média são os países menos desenvolvidos, que é suposto convergirem para a média. Só há dois países que desrespeitam esta tendência natural: Grécia e Portugal. A Grécia até estava a crescer antes da crise do euro, mas a partir daí tem sido o desastre conhecido. No nosso caso, a incapacidade de convergir com a média da UE verifica-se desde 2000, apesar de estarmos a receber fundos europeus para convergir há mais de 35 anos.

Taxa de crescimento económico acumulado, 2000-2016

Fonte: AMECO

Para se ter uma noção mais clara das implicações do nosso fracasso, vamos fazer algumas simulações, assumindo que tínhamos conseguido crescer tanto como Espanha. Repare-se, em primeiro lugar, os nossos vizinhos cresceram mais do que a média, mas não muito acima (1,5% em vez de 1,3% em média anual). Em segundo lugar, como temos um grau de desenvolvimento inferior ao espanhol, temos a obrigação de convergir mais do que eles.

Partindo desta hipótese, o nosso PIB em 2016 teria sido de 225,8 mil milhões de euros (mM€) em vez de apenas 185,0 mil milhões, uma diferença gigantesca de 40,7 mil milhões de euros. Mantendo a simulação muito simples e assumindo que o total de dívida era hoje o mesmo, então representaria 107% em vez dos actuais 130% do PIB. Na verdade, se tivéssemos crescido mais, teria sido fácil termos défices menores e termos acumulado menos dívida.

A Espanha tem actualmente uma dívida de 100% do PIB, que poderíamos certamente ter se tivéssemos crescido como os nossos vizinhos. Em 2016, o seu défice foi quase de 5% do PIB, claramente acima do nosso e, mesmo assim, as taxas de juro espanholas estão em torno de 1,6%. Isto é um nível semelhante ao da inflação, o que significa que as taxas de juro reais são praticamente nulas. Ou seja, se tivéssemos crescido o mesmo que Espanha, uma meta que está longe de ser ambiciosa, poderíamos ter uma dívida parecida com a deles e estar a pagar taxas de juro tão baixas como eles.

Continuando a simulação (com valores muito arredondados, o que é mais do que suficiente neste exercício), com mais quase 41 mM€ de PIB, teríamos mais 17 mM€ de receitas públicas. Tendo em atenção que o défice de 2016 foi de 4 mM€, significa que poderíamos diminuir impostos em 13 mM€. No ano passado as receitas de impostos foram: IVA, 15 mM€; IRC, 12 mM€; IRC, 5 mM€. Quer isto dizer que podíamos acabar com o IRS e ainda sobrava dinheiro, ou descer generalizadamente todos os impostos.

Claro que está implícito que a despesa pública seria exactamente a mesma do que é hoje, o que seria complicado por duas razões. Em primeiro lugar, porque a tentação dos nossos políticos tem sido sempre a de subir impostos em vez de conter a despesa. Em segundo lugar, porque este crescimento do PIB implicaria maior crescimento da produtividade e, assim, também dos salários, havendo assim pressão para subir as remunerações dos funcionários públicos. De qualquer forma, a um aumento da despesa pública corresponderia quer um aumento das pensões, que são rendimento das famílias quer aumento dos serviços oferecidos à população.

Se crescer mais tem impactos tão notáveis, porque é que ainda não se instalou uma discussão séria – entre a classe política – sobre as razões da nossa estagnação e sobre as formas de a ultrapassar? Como é que medidas estruturais impostas pela troika para crescer mais foram desmanteladas sem protestos? Tinham-se revelado erradas ou eram simplesmente desagradáveis para certas clientelas políticas?

Aproveito para culminar, anunciando que o Fórum para a Competitividade iniciou a publicação de relatórios sectoriais sobre propostas de reforma para colocar o país a crescer a 3% ao ano nos próximos anos.

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