Mãos ao ar! Isto é a eleição do Montepio!

Ao longo dos 12 anos que já leva de liderança do universo Montepio Geral, Tomás Correia acumulou uma galeria de horrores e suspeitas que não é fácil encontrar numa só pessoa. Tudo é público.

Num país que gostasse de ter orgulho no que vê quando se olha ao espelho há três perguntas sobre a Associação Mutualista Montepio Geral que já teriam sido feitas e respondidas com clareza, tirando-se delas todas as consequências:

  1. Como é possível que Tomás Correia se mantenha à frente da instituição?
  2. Como é possível que Tomás Correia concorra a um novo mandato, o quarto, como se a sua reputação estivesse intocada ou pelo menos fosse, vá lá, aceitável?
  3. Como é possível que reúna apoios de tanta gente mediática sem que alguém, entre os mais próximos, lhe dê o conselho que se espera dos verdadeiros amigos: está mais do que na hora de ir embora?

O que está em causa na eleição em curso para a Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) é muito mais do que um confronto democrático, salutar e regular para a escolha dos órgãos de gestão de uma entidade mutualista com cerca de 600 mil sócios.

É uma disputa onde, muito antes de se compararem e discutirem as propostas apresentadas por cada uma das listas — lideradas por Tomás Correia, Fernando Ribeiro Mendes e António Godinho –, se devia discutir e compreender que sistema permite que Tomás Correia se mantenha como um “sempre em pé”, rodeado de nomes sonantes, apesar de todas as evidências nos dizerem que é ele o activo mais tóxico de todo o grupo – e há por lá muitos.

É que não se trata de uma eleição para uma associação académica ou para uma qualquer “jotinha” partidária, onde por vezes se encontram estes alinhamentos perversos que juntam caciquismo, más contas, suspeitas de fraudes e golpadas várias, irregularidades eleitorais e a mais absoluta impunidade. Nestes casos, até podemos encolher os ombros porque a dimensão dos estragos é pequena.

Mas aqui estamos noutro campeonato. Não no tipo de práticas, mas no tamanho do problema e na influência de muitos protagonistas.

A AMMG tem activos de quase 4.000 milhões de euros – o equivalente a quase metade do orçamento anual da Saúde ou à construção de quatro pontes Vasco da Gama. Uma parte substancial deste montante – cerca de 3.000 milhões de euros – serve para garantir as poupanças de centenas de milhares de portugueses que subscreveram produtos financeiros do Montepio.

Anualmente, a AMMG recebe cerca de 720 milhões de euros de quotizações de associados.

E, claro, é a dona do banco Caixa Económica Montepio Geral, que é o sexto maior do país com activos 20 mil milhões de activo e cerca de um milhão de clientes que lhe confiam pelo menos uma parte das poupanças.

Ao longo dos 12 anos que já leva de liderança do universo Montepio Geral, Tomás Correia acumulou uma galeria de horrores e suspeitas que não é fácil encontrar concentrados numa só pessoa. Tudo é público. Algumas práticas estão a ser investigadas, noutras é já arguido, noutras ainda aguarda-se a chegada das autoridades. E a cada dia que passa o que se vai sabendo não é bonito de ser ver.

Vou tentar fazer a lista, que pecará certamente por defeito:

Sabemos também que a sua gestão à frente do grupo, numa altura em que acumulava a liderança da Associação Mutualista com a do banco, ia levando este à falência; que as contas da AMMG estão distorcidas pelo registo contabilístico de impostos que resultaram de uma alteração legal feita oportunamente pelo governo; que se auto-atribui salários e regalias de banqueiro, que chegam aos 400 mil euros por ano; que os administradores da AMMG se podem reformar com a pensão por inteiro passados 20 anos na função; que foi empurrado da gestão da Caixa Económica Montepio Geral por pressão do Banco de Portugal; e que, de acordo com a nova lei das associações mutualistas, Tomás Correia terá de sair se vier a ser constituído arguido nalguns dos processos que estão a ser investigados.

Por alto e de forma resumida, é isto que se passa com o líder do grupo Montepio Geral.

E se a supervisão do Ministério da Segurança Social é o que se sabe, inexistente ou próxima disso, a mais básica prudência, decência e decoro teriam aconselhado Tomás Correia a retirar-se há vários anos, aguardando tranquilamente a evolução dos processos judiciais e deixando o grupo seguir o seu caminho e entrar num novo ciclo, que terá sempre de começar por auditorias, limpezas de balanços e quebra das teias de cumplicidades, favores, regalias internas e toda uma série de práticas que se sentam ou sentaram à mesa do balanço da Associação Mutualista e do Montepio Geral.

Mas não só Tomás Correia vai à procura de um quarto mandato, que poderá ser conseguido sabe-se lá à custa de que entorses eleitorais, como continua a reunir à sua volta dezenas de apoiantes que constituem a sua (não se riam) Comissão de Honra. Sobre isso, João Miguel Tavares escreveu um texto ao qual pouco ou nada há a acrescentar.

Por mais que muita gente na sua lista de apoiantes seja séria, honrada, digníssima do nome que exibe e esteja no polo oposto deste tipo de práticas – e acredito que isso acontece com uma larga maioria dos que apoiam o recandidato – o certo é que tudo isto revela uma complacência e tolerância inaceitáveis, que só nos podem deixar preocupados.

Este é, afinal, o homem que há uns meses convenceu a Santa Casa da Misericórdia a meter, com a anuência do Governo, 200 milhões no Montepio em troco de uma posição de 10% do capital, operação que só não avançou pela indignação pública que gerou.

Este é, afinal, o homem que mantém todo este poder, apesar de tudo o que se sabe publicamente. Porque estas coisas são como andar de bicicleta: se parar, cai. Se sair, quando sair, tudo poderá ficar exposto e ruir. É a velha receita de continuar a beber para adiar a ressaca.

Além de revelar um enorme descaramento do próprio, isto revela o país das cumplicidades, trocas de favores, tráfico de influências e negócios mutuamente vantajosos que a tudo resistem, como as baratas.

Afinal, não aprendemos tanto como pensamos com a crise, com a bancarrota, com as derrocadas da banca, com o BPN, com o BES/GES, com a PT e afins. Que miséria.

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