Finalmente há oposição em Portugal. E não é Rui Rio

Quem fará oposição à geringonça que quer abrir os cordões à bolsa em ano de eleições? Há um partido que ainda não tem nome, mas já tem um líder e já tem um slogan.

O Governo apresenta esta semana o Programa de Estabilidade com metas e objetivos económicos para este ano e para os próximos quatro. É uma espécie de colete-de-forças que funcionará como espartilho para o que vai ser o Orçamento do Estado para 2019, o último da geringonça.

O ECO já avançou alguns números do Programa de Estabilidade que mostram ambição no processo de consolidação das contas públicas: o objetivo do défice para este ano será de 0,7%, para o próximo, ano de eleições e o último da legislatura, Mário Centeno aponta para 0,2% e, para 2020 e 2021, Portugal já terá um excedente orçamental.

Para Mário Centeno, o nosso Ronaldo das Finanças, colocar o Estado a gerar mais receita do que despesa é um brilharete só comparável ao golo de bicicleta de Cristiano Ronaldo no jogo contra a Juventus que correu o mundo.

O problema é saber se a geringonça deixará Mário Centeno ir a jogo e brilhar. João Galamba, da ala mais à esquerda do PS, já veio dizer que, “em 2018 e 2019, o país dispensa brilharetes” orçamentais. Catarina Martins também já avisou que “para Centeno brilhar, os serviços públicos não podem ficar às escuras”. E o PCP veio acusar o Governo de ser “mais papista do que o Papa” em matéria de défice.

Estes três partidos representam 53% do Parlamento e, naturalmente, são a maioria que manda no país. Então quem faz oposição? Dir-me-ão, com alguma naturalidade, que é o PSD que tem 39% dos deputados. O problema é que Rui Rio continua a fazer uma oposição de pantufas — às vezes mudo, outras vezes calado –, e, quando fala, a mensagem é um misto entre o vazio e o nada.

Aliás, ficou claro, este fim de semana, no Expresso, a ambição de Rio Rio na construção de um discurso com ideias alternativas para o país. Escreve o semanário que, no Conselho Nacional do PSD, Rio terá dito aos seus conselheiros que “as eleições não se ganham, perdem-se”. Ou seja, o social-democrata nem sequer acredita ter um projeto que convença os portugueses de que é melhor do que António Costa; ficará à espera que o Governo caia de podre e o poder lhe caia no colo. É uma versão menos satânica do que a do “Diabo” de Passos Coelho, mas é igualmente desprovida de ambição.

Se não é o PSD, então quem fará oposição à geringonça, tendo em conta que o PAN não conta e o CDS conta muito pouco? A resposta é Mário Centeno. O ministro das Finanças já percebeu que, em ano de eleições, PS, Bloco, PCP e PSD vão querer abrir os cordões à bolsa e até já se anteveem no horizonte algumas possíveis maiorias negativas, com os social-democratas a poderem juntar-se à esquerda radical em algumas matérias como o aumento de salários na função pública.

Mário Centeno traz na lapela a medalha do maior crescimento em 17 anos e a do menor défice em democracia. Por isso anda, e merece andar, de peito inchado. Conseguiu visibilidade e prestígio internacional ao ser escolhido para o cargo de presidente do Eurogrupo e, como dizia, este domingo, Marques Mendes na SIC, nesta altura já corre em pista própria. E, já se percebeu, não vai hipotecar isto tudo mesmo que 2019 seja ano de legislativas. Centeno, provavelmente, estará mais preocupado com as europeias do que com as eleições nacionais.

Na sexta-feira, o ministro das Finanças foi à Concertação Social revelar que não haverá aumentos na função pública em 2019, e que está “obcecado em garantir a estabilidade da trajetória financeira e orçamental portuguesa”. Esta segunda-feira, no jornal Público, Centeno assina um artigo de opinião com estas duas mensagens principais:

  1. A disciplina orçamental vai continuar e “não vamos colocar em risco” o sucesso até agora alcançado;
  2. Se isto der a volta lá fora, Portugal pode voltar a mergulhar numa crise profunda: “Perante cenários económicos mais adversos, o passado recente na Área do Euro mostrou que o saldo das contas públicas se deteriora em média 3 pontos percentuais. Em Portugal, a experiência viva na nossa memória comprova-o.”

Este discurso de deitar água na fervura do Orçamento e no Programa de Estabilidade não é um discurso árido, estéril e ortodoxo. Mário Centeno tenta ser didático para com os seus colegas de geringonça e de Governo, tentando provar a tese de que a despesa no SNS e nas escolas públicas cresceu graças à poupança nos juros, cuja fatura baixou em mais de 800 milhões de euros face ao início da legislatura. Esta poupança nos juros só foi conseguida, segundo Centeno, por causa da “credibilidade na execução orçamental”.

Mário Centeno, com este discurso sóbrio e cauteloso, está a fazer uma oposição às investidas e ao ímpeto despesista da geringonça e está a falar para dentro do próprio Governo onde alguns, como Adalberto Campos Fernandes, aparentemente já se converteram ao único partido que verdadeiramente faz oposição em Portugal. Ainda não tem nome, mas já tem slogan: “Somos todos Centeno”.

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