Nem confronto, nem compromisso com Itália (por agora). Mas Bruxelas mantém a pressão

  • Vasco Gandra, em Bruxelas
  • 5 Novembro 2018

O braço de ferro entre Bruxelas e Roma sobre o orçamento italiano ficou em suspenso – pelo menos por agora. O Executivo de Giuseppe Conte tem até terça-feira da próxima semana para mudar proposta.

Os ministros das Finanças da zona euro apoiaram a decisão da Comissão Europeia que rejeitou o orçamento italiano para 2019 e pediu uma nova proposta até 13 de novembro. O Eurogrupo mantém assim a pressão sobre a Itália pedindo-lhe que apresente um documento em linha com as regras mas quer dar uma oportunidade ao diálogo.

“Os ministros apoiaram a Comissão na sua avaliação e convidaram a Itália a cooperar estreitamente na preparação de um orçamento revisto que esteja em linha com as nossas regras”, afirmou Mário Centeno no final do encontro. Mário Centeno disse que a Itália tem mais uma semana para o fazer.

Por seu turno, o ministro italiano foi parco em comentários. “Expliquei os dados e a estratégia. O diálogo será com a Comissão que é o nosso interlocutor nesta fase”, disse Giovanni Tria no final do encontro, sem esclarecer se vai alterar o orçamento italiano tal como pedem a Comissão e os restantes ministros. Em contrapartida insistiu que a dívida pública vai descer 4 pontos percentuais nos próximos três anos. “Esperamos que o spread desça quando a nossa estratégia seja melhor entendida e explicarmos melhor os nossos números”.

Apesar da preocupação e das advertências, os parceiros europeus pretendem deixar concluir a atual fase. O timing vai apertando. O executivo de Giuseppe Conte tem até terça-feira da próxima semana para apresentar uma nova proposta que a Comissão depois avaliará — juntamente com os restantes orçamentos — a 21 de novembro.

O Eurogrupo incentiva Bruxelas e Roma a manterem “diálogo construtivo” para alcançar um compromisso sobre as contas públicas italianas. “Vamos dar uma chance ao diálogo”, resumiu o ministro francês Bruno Le Maire.

Por agora, todos esperam diálogo e que o processo possa ser gerido “com muita prudência”, segundo fonte do Eurogrupo. Primeiro para evitar dar argumentos ao imprevisível governo italiano, uma coligação de populistas e eurofóbicos do Movimento 5 Estrelas e da Liga. Depois porque é necessário um entendimento que evite uma crise na terceira economia da zona euro, no respeito pela soberania nacional mas também no cumprimento das regras europeias.

O problema da dívida pública

Num gesto inédito, Bruxelas rejeitou há duas semanas o orçamento italiano por não estar em linha com as recomendações e apresentar um desvio significativo em relação às regras. A Comissão deu três semanas a Roma para apresentar uma nova proposta mas o governo italiano avisou Bruxelas de que “até pode mandar 12 cartas” que “os orçamentos não vão mudar”.

O executivo de Giuseppe Conte enviou inicialmente para Bruxelas um plano orçamental que prevê um défice de 2,4% do PIB para 2019 — três vezes superior ao assumido pelo anterior executivo. O plano prevê ainda uma deterioração do saldo estrutural em 0,8% do PIB, em contraste com a recomendação do Conselho, que apontava para uma melhoria estrutural de 0,6% do PIB. Mais preocupante, o nível da dívida italiana — 131% do PIB -, a segunda maior da Europa que corresponde a 37 mil euros por habitante.

A questão agora é saber se a atitude desafiadora do governo populista e eurofóbico é para consumo político interno – e acabará cedendo -, ou se vai mesmo esticar a corda até um ponto que muitos receiam em Bruxelas e restantes capitais.

Efeitos colaterais em outros debates do Eurogrupo

O receio de alguns em Bruxelas é que o braço de ferro em torno da situação orçamental italiana possa contaminar negociações em curso dificultando acordos entre os parceiros europeus. Sobretudo em relação ao dossiê da reforma da zona euro.

“Não se pode fazer muita coisa no desrespeito pelas normas”, afirma uma fonte próxima do Eurogrupo receosa que determinados países usem o caso italiano para defender regras mais apertadas no futuro funcionamento da zona euro.

“Temos que completar a arquitetura da união económica e monetária. E receio que a abordagem do governo italiano ponha esses objetivos em risco”, avisou o ministro das Finanças eslovaco Peter Kazimír.

Nem de propósito, em plena polémica sobre o orçamento italiano, um grupo de nove países considerados “falcões” em matéria de disciplina orçamental — os escandinavos, os bálticos, e ainda a República Checa e a Eslováquia — escreveram há dias um documento sobre as negociações em curso para reformar a zona euro. Defendem que o fundo de resgate da zona euro (o Mecanismo Europeu de Estabilidade) deve ter maiores poderes de avaliação sobre os orçamentos dos países que pedem assistência financeira.

* Vasco Gandra, em Bruxelas

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