O “intocável” Trump vai a exame. “Estas eleições nos EUA vão trazer enormes mudanças”

Se os democratas vencerem, terão espaço para "bloquear" a governação de Trump. Mas, se os republicanos mantiverem o controlo, o incentivo às políticas do Presidente norte-americano será "massivo".

Donald Trump foi eleito Presidente dos Estados Unidos em novembro de 2016.Oliver Contreras / EPA

Em pé de guerra com vários dos parceiros mundiais e com a taxa de aprovação mais baixa da história da presidência norte-americana, a administração de Donald Trump é colocada à prova esta terça-feira. Dois anos depois da eleição do Presidente dos Estados Unidos, os norte-americanos voltam às urnas para decidir a distribuição de lugares no Congresso, eleger governadores e votar várias iniciativas a nível local. O mais provável é que o Partido Democrata consiga a maioria na Câmara dos Representantes e que o Partido Republicano mantenha o controlo do Senado. Mas, qualquer que seja o resultado, uma mudança de rumo das políticas seguidas pelo atual governo é inevitável. Se os democratas vencerem, terão espaço para exigir explicações, lançar investigações, expor polémicas de Trump e, em última análise, “bloquear toda a governação”. Se a vitória for dos republicanos, o incentivo que Donald Trump ganha para levar a cabo as suas políticas, até agora travadas por várias vezes, será “massivo”.

A antecipação é feita por Jeremy Mayer, professor da Schar School of Policy and Government, da Universidade George Mason, no estado da Virgínia. Em entrevista ao ECO, o professor de política norte-americana aponta para que os democratas vençam a maioria na Câmara dos Representantes, uma das câmaras do Congresso norte-americano, e que os republicanos mantenham o controlo do Senado, a outra câmara do Congresso.

Esta é também a projeção feita pela maioria dos analistas políticos, mas, num momento de grande contestação em torno do atual mandato, há também quem aponte para uma vitória mais expressiva dos democratas. Por esta altura, a taxa de aprovação de Donald Trump é de apenas 40%, de acordo com a mais recente sondagem realizada pela Gallup Poll, na semana terminada a 28 de outubro. Esta é a taxa de aprovação de um presidente norte-americano mais baixa de sempre em vésperas de eleições intercalares — como termo de comparação, a taxa de aprovação de Barack Obama na altura das intercalares durante o seu primeiro mandato era de 45%, enquanto a de George W. Bush era de 66%. Os valores alcançados por Trump no conjunto do mandato ficam também muito abaixo dos restantes presidentes. Desde o início do seu mandato e até à data, a sua taxa de aprovação média é de 39%; a taxa de aprovação média dos presidentes norte-americanos é de 53%.

Assim, a viragem política pode ser mais acentuada do que o esperado. “Se os democratas surfarem uma grande onda, poderão conseguir uma maioria no Senado e uma maioria mais expressiva na Câmara dos Representantes”, considera Jeremy Mayer.

“Mas isso é improvável”, acrescenta. As contas não são fáceis. As eleições intercalares levam a votos todos os 435 lugares da Câmara dos Representantes e um terço dos 100 lugares do Senado. Para além disso, 36 dos 50 estados federais elegem os seus governadores e há ainda eleições a nível municipal. É também neste sufrágio que são decididos vários cargos públicos, bem como uma série de iniciativas legislativas.

Historicamente, estas eleições são um momento de revés para o partido no poder: é provável que perca lugares no Congresso e também é frequente que os oponentes internos do presidente ganhem visibilidade. Mas esta é uma administração com pouco em comum com as do passado. Dentro do Partido Republicano, Donald Trump “é, atualmente, intocável”, aponta o professor universitário. “Teria de ser terrivelmente atingido por um enorme escândalo, ou por um colapso económico, ou uma guerra desastrosa, para qualquer republicano ter alguma hipótese contra Trump”.

Um colapso económico a curto prazo é pouco provável, numa altura em que o produto interno bruto (PIB) norte-americano mantém um ritmo de crescimento estável, com uma taxa de desemprego abaixo dos 4% e a inflação a evoluir a ritmo moderado. Para lá da guerra comercial que tem sido travada com vários parceiros, sobretudo com a China, também não é esperada uma “guerra desastrosa”, no seu sentido tradicional. E, como os últimos dois anos demonstraram, Donald Trump é imune a todos os escândalos, que resolve com o argumento fake news.

Ao mesmo tempo, e apesar de as sondagens darem como quase certa uma viragem à esquerda, a ala direita dos Estados Unidos está também cada vez mais radical, o que poderá diminuir os números da abstenção, tradicionalmente mais elevados nas eleições intercalares do que nas presidenciais, e, consequentemente, impedir uma vitória mais expressiva dos democratas.

Se os democratas vencerem nem que seja a Câmara dos Representantes, vão responsabilizar a administração de Trump, vão revelar suas as declarações fiscais e lançar investigações a potenciais irregularidades. Toda a agenda política de Trump ficará bloqueada.

Jeremy Mayer

Professor da Schar School of Policy and Government

Isto não significa, contudo, que o cenário político fique inalterado. Aliás, este é mesmo um dos momentos eleitorais que poderá trazer das maiores mudanças para o sistema norte-americano. “Estas são eleições que vão trazer uma enorme mudança às políticas em vigor. Se os democratas vencerem nem que seja a Câmara dos Representantes, vão usar o poder da intimidação para responsabilizar a administração de Trump. Vão revelar as declarações fiscais de Trump e lançar várias investigações a potenciais irregularidades. Toda a agenda política de Trump ficará bloqueada”, antecipa Jeremy Mayer.

E se os republicanos vencerem? “Trump e a sua agenda ganham um incentivo massivo”.

Texas, Florida, Dakota do Norte, Arizona, Nevada e… Kamala Harris

Por esta altura, os democratas levam 13 pontos percentuais de vantagem sobre os republicanos, de acordo com a mais recente sondagem da CNN. A sondagem aponta para que 55% dos eleitores votem no Partido Democrata, contra 42% a votarem no Partido Republicano. Na análise por género, a diferença é maior: 62% das mulheres questionadas dizem que vão votar nos democratas e apenas 35% preferem os republicanos. A discrepância torna-se ainda mais evidente na análise por etnia: 88% dos eleitores afro-americanos e 66% dos latinos antecipam que irão votar nos democratas.

Os fatores demográficos vão assumir um peso significativo nestas eleições, mas as atenções estão também viradas para os estados onde não há ainda uma tendência definida. Há cinco Estados a ter em conta, segundo Jeremy Mayer:

  • Texas: “Se os democratas vencerem aqui, será uma grande noite para eles. No entanto, é altamente improvável”;
  • Florida: “Se os democratas perderem aqui, praticamente não terão qualquer hipótese de vencerem o Senado”;
  • Dakota do Norte: “Os democratas deverão perder o seu lugar neste estado. Se isso acontecer, têm de vencer a maioria das restantes corridas ao Senado e precisam de algumas surpresas”;
  • Arizona: “Pode dar qualquer resultado”;
  • Nevada: “Está a pender ligeiramente para o lado dos democratas, mas está renhido”.

E se, dentro do Partido Republicano, a liderança de Donald Trump parece ser incontestada, entre os democratas há caminho aberto para assumir o posto de opositor do Presidente na corrida às eleições de 2020. Para Jeremy Meyers, Kamala Harris é o nome a reter do lado dos democratas. Eleita em 2016, a senadora da Califórnia foi apontada pelos democratas para o Comité Judiciário do Senado e ganhou protagonismo em assuntos como segurança nacional, direitos civis e o sistema prisional, tendo já afirmado publicamente que não exclui a hipótese de se candidatar à presidência em 2020.

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