Revolução sexual

O movimento #MeToo não é uma tomada de posição pública sobre as condutas sexuais ou sobre a dignidade de género, tudo à sua volta respira os ares da política e as brisas do poder.

Claro que o poder é afrodisíaco. O poder económico e o poder político. Claro que sexo é poder. O poder da dominação e o poder do prazer. Passados anos da invenção da pílula, da libertação da mulher e do amor livre, o sexo é uma mercadoria. E na lógica económica do mercado quem fornece a mercadoria tende a procurar o monopólio. Novamente tudo se resume a uma questão de poder. As políticas identitárias baseadas na identidade de género representam hoje a mais lapidar projecção de um modelo de activismo político. No topo da pirâmide está o movimento #MeToo.

Alimentando uma cultura de intolerância, ressentimento, divisão, ódio para estimular o medo, o Movimento veste-se com cores liberais para praticar uma política de denúncia e julgamento público só comparável com as piores práticas Estalinistas. Ninguém pára de aplaudir o discurso porque todos têm medo de parar de aplaudir o discurso. O resultado está bem patente num fraseado político implacável e numa cultura política que reduz o homem à caricatura de uma “masculinidade tóxica”. Todos os homens, apenas por serem homens, são monstros no segredo de cada escritório. Não está aqui qualquer atribuição de um estatuto de vítima à metade masculina da Humanidade. Mas o silêncio de todos e de cada um é uma perplexidade que não pode deixar de ser sublinhada. Enquanto a ortodoxia progressista e puritana do movimento #MeToo for dominante todos os homens são criminosos na versão liberal de um Holocausto de género.

A insegurança masculina é óbvia e evidente, comparável mesmo à perda de estatuto e de influência que a minoria branca sentiu quando reduzida nos seus privilégios pela ascensão e reconhecimento da igualdade de oportunidades legitimamente concedida à maioria negra. Observe-se o caso de Ian Buruma, editor do prestigiado ‘New York Review of Books’ e que se demitiu após ter publicado no jornal um ensaio escrito pelo DJ canadiano Jian Ghomeshi, objecto de acusações públicas e escandalosas sobre a sua conduta sexual. No ensaio, o DJ faz um relato da experiência de quem está do outro lado do dedo acusatório. A reacção nas redes sociais foi uma violenta avalanche de indignação e revolta que tornou impossível a continuação de Ian Buruma. Onde fica o princípio do contraditório? Não fica quando a regra está bem patente num cartaz exibido por uma apoiante do Movimento – ‘BELIEVE WOMEN’.

Veja-se o caso de Philip Bunce, um Senior Executive do Credit Suisse que, sendo homem, por vezes e em certos dias sente-se mulher. Nesses dias de identidade de género alterada, Bunce veste-se de mulher e apresenta-se com o nome de Pippa. Com base neste facto, o vetusto ‘Financial Times’ inclui Bunce/Pippa na lista das 100 melhores Executivas no mundo dos negócios.

Os partidos políticos clássicos fogem da discussão destes temas, deixando o espaço público político ao sabor dos impulsos populistas e radicais. #MeToo é a magistral ideologia para a lógica do ‘on-demand’ que domina a era da Internet. Privilegia a primazia da “experiência de vida”, eleva as emoções acima de qualquer prova ou contraditório, promove o julgamento instantâneo nas redes sociais. Congela o debate e asfixia o pensamento crítico. Tudo o que não coincide com a ortodoxia do Movimento é crime. Devem as leis e as políticas públicas ser definidas com base nos factos, nas práticas e nas provas ou simplesmente ser o produto dos sentimentos e das emoções?

O movimento #MeToo não é uma tomada de posição pública sobre as condutas sexuais ou sobre a dignidade de género, tudo à sua volta respira os ares da política e as brisas do poder. A preocupação central é sobre o modo como o poder é distribuído entre géneros, fundamental é o controlo do exercício do poder e o controlo da percepção sobre o abuso do exercício do poder. A sequência da lógica política do Movimento desloca-se na direcção da paridade absoluta com a ascensão e o domínio do género feminino. Seja nos governos, seja nas empresas, o Movimento aspira à superioridade da mulher, não à igualdade entre géneros. Como escreve Edward Gibbon em ‘The Decline and Fall of the Roman Empire’, em todas as épocas e países, o mais sábio, ou pelo menos o mais forte dos dois sexos, usurpou os poderes do Estado, e confinou o outro sexo aos cuidados e prazeres da vida doméstica. Enquanto o ‘background’ é dominado pelos sons do ‘Dancing Queen’, os anjos da história dançam com as mulheres.

Nota: O autor escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.

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