‘Choque elétrico’ na China pode precipitar fim da OPA à EDP

Governo chinês afastou o chairman e CFO da China Three Gorges na semana passada. Pequim dá prioridade aos investimentos da State Grid, que detém 25% da REN. É o início do fim da OPA à EDP?

Numa questão de dias, Pequim desfez a cúpula da China Three Gorges (CTG) que planeou a oferta pública de aquisição (OPA) à EDP. Primeiro demitiu o administrador financeiro, com Ya Yang a ser encaminhado para outra empresa pública chinesa. Depois anunciou a saída do chairman, e para o lugar que era então de Lu Chun foi nomeado o vice-ministro dos Recursos Hídricos. Porquê? O Governo chinês não adiantou qualquer razão para estas alterações. Mas surgem em cargos sensíveis e quando decorre um negócio de milhares de milhões pelo controlo da elétrica portuguesa. Por cá, há quem veja sinais de que a OPA chinesa poderá vir a ser retirada.

Fontes ouvidas pelo ECO dizem que a reformulação na administração da CTG pode servir um propósito muito específico: o da retirada da OPA sobre a EDP, lançada há menos de quatro meses. Contactada, a CTG não esteve disponível para responder em tempo útil às questões colocadas pelo ECO, mas, oficialmente, não há nenhuma decisão para deixar cair a oferta, tendo em conta que os trabalhos seguem o seu curso nas diferentes jurisdições onde a operação tem de decorrer, segundo informações recolhidas nos últimos dias. Mas Pequim fica agora com um argumento de peso para afastar o seu interesse da elétrica portuguesa: Com uma nova liderança, a CTG pode entender que a estratégia a seguir é outra e que não passa propriamente pela aquisição da totalidade do capital da elétrica nacional.

Uma fonte conhecedora do processo revelava ao ECO que “a CTG tem 21 razões para retirar a oferta, pois são 21 as jurisdições da OPA”. Agora tem mais uma, confessava. Mas as razões para estas mudanças são mais profundas do que isso, apurou o ECO. E têm sobretudo a ver com a estratégia dos chineses no setor elétrico, cuja prioridade não passa tanto pela produção (EDP) mas antes pelas infraestruturas de transporte e distribuição, onde a China já tem um ponta-de-lança de topo mundial, a State Grid, a maior empresa chinesa e que em Portugal já detém 25% da gestora da rede elétrica REN.

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É o conflito dos interesses da CTG com os planos de Pequim para a State Grid que está a criar enorme ruído e as primeiras consequências práticas fizeram-se sentir na semana passada com o afastamento da dupla que esteve por detrás da OPA à EDP. Ya Yang foi transferido para a National Power Investment Group, onde foi nomeado vice-administrador financeiro, embora ainda faça parte do Conselho Geral e de Supervisão da EDP, o que, de resto, coloca um problema de conflito de interesses ainda por resolver. No dia a seguir, o Governo chinês nomeou um seu vice-ministro (Lei Mingshan) para o cargo de chairman — que no modelo de governação chinês assume funções executivas –, numa mudança que sinaliza a vontade de Pequim de controlar de uma forma mais próxima os destinos da CTG. As alterações já estão visíveis na página oficial da empresa.

A decisão da CTG de avançar sobre a EDP terá apanhado de surpresa o Governo chinês. Pelo menos, o negócio terá sido anunciado sem se ter em conta os riscos que o negócio podia representar para a State Grid. À luz das diretivas europeias, transpostas já para a lei nacional, deve haver uma separação clara entre os operadores da rede de transporte e as atividades de produção e comercialização. Isto significaria que os chineses teriam de abdicar da REN para manter a EDP, conforme já sinalizou o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, numa resposta à eurodeputada portuguesa Ana Gomes. Nessa ocasião, Juncker sublinhou que Bruxelas tem poucos instrumentos para intervir na OPA, frisando que cabe às autoridades reguladoras nacionais analisar os riscos da operação.

Mas a prioridade de Pequim é a gestora da rede elétrica nacional e a State Grid, a segunda maior empresa do mundo em termos de receitas (348,9 mil milhões de dólares), segundo o ranking Global 500 da Fortune. A CTG não surge sequer nesta lista — faturou “apenas” 11,45 mil milhões de euros em 2016 –, o que dá uma real dimensão das duas empresas em confronto direto.

Por outro lado, com a OPA ainda por registar, o caminho das pedras que a operação está a percorrer junto das jurisdições onde tem de ser aprovada vai implicar remédios que vão descaracterizar a EDP, sobretudo o apetecível negócio das renováveis nos EUA.

Contactada, a CTG não esteve disponível para responder em tempo útil às questões colocadas pelo ECO.

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