Presidente da Proteção de Dados diz que não tem dinheiro para salários em junho, muito menos para fiscalizar nova lei

A dez dias da entrada em vigor do RGPD, a líder da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) admite que não tem meios para fiscalizar o regulamento. Nem para pagar vencimentos de junho.

A entidade portuguesa que vai ficar encarregue de fiscalizar o cumprimento da nova lei europeia da proteção de dados (o RGPD) não vai conseguir assegurar a tarefa que se avizinha. O alerta surge a apenas dez dias de o regulamento europeu entrar em vigor, pela voz da própria presidente da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), Filipa Calvão, que diz não ter sequer dinheiro para pagar os salários do próximo mês.

Filipa Calvão esteve a ser ouvida no Parlamento esta quarta-feira. Além de denunciar um problema de falta de recursos, a presidente da CNPD confessou que nem sequer tem orçamento para pagar os vencimentos do mês que vem. O Regulamento Geral da Proteção de Dados (RGPD) entra em vigor em toda a União Europeia a 25 de maio e a CNPD terá a missão de fiscalizar o cumprimento das novas regras por parte das organizações públicas e privadas.

No Parlamento, a presidente pediu “um efetivo reforço dos meios”. “Não é possível, com os recursos que temos, fazer o que quer que seja, no âmbito do regulamento, que seja efetivamente uma tutela eficaz dos direitos fundamentais”, disse. Filipa Calvão denunciou ainda recursos “quase inexistentes” na CNPD, o que não permitirá “uma fiscalização efetiva” do RGPD “no continente e arquipélagos”.

“Se não nos dotarem de meios, não conseguimos estar à altura da função. Não temos neste momento orçamento para pagar vencimentos em junho”, afirmou Filipa Calvão, salientando que já tinha denunciado esta situação em janeiro, no Parlamento.

“O orçamento que temos está pensado para valer até maio. Em junho já não há dinheiro para pagar aos trabalhadores da comissão. Nós, Estado português, que tivemos a primeira Constituição a consagrar um direito de proteção de dados, vamos passar pela vergonha de sermos aquele que não reforçou os meios da autoridade de proteção de dados e que está praticamente obrigada a fechar portas quando o regulamento começar a ser aplicado”, desabafou.

Vamos passar pela vergonha de sermos aquele [Estado] que não reforçou os meios da autoridade de proteção de dados e que está praticamente obrigada a fechar portas quando o regulamento começar a ser aplicado.

Filipa Calvão

Presidente da CNPD

Atualmente, o modelo em vigor em Portugal implica que as empresas peçam à CNPD uma autorização para a recolha e tratamento de dados, que pode ou não ser facultada por aquela entidade pública. No entanto, com o RGPD, têm de ser as empresas a provarem que cumprem as novas regras — autorregulação –, sendo que caberá à CNPD efetuar a fiscalização. Se não cumprirem, as empresas podem enfrentar coimas até 20 milhões de euros ou 4% do volume de negócios anual.

A falta de capacidade da CNPD de fiscalizar o RGPD foi um tema abordado pelo ECO em fevereiro, com alguns especialistas a levantarem dúvidas quanto ao grau de preparação daquela entidade. Daniel Reis, advogado da PLMJ, assumiu que a CNPD poderia “não estar preparada” a 25 de maio, e que necessitaria de meios para ser capaz de “fiscalizar o mercado todo” no país. Já Cláudia Martins, advogada da Macedo Vitorino & Associados, também indicou ao ECO que “a CNPD não foi ouvida” no grupo de trabalhou que se debruçou sobre a transposição da lei europeia para o contexto nacional.

Neste contexto, Filipa Calvão, presidente da CNPD vem agora confirmar que a entidade não tem condições, atualmente, para garantir essa tarefa de fiscalização a partir de 25 de maio, isto é, dentro de cerca de dez dias. De recordar que, por decisão do Governo, o setor público estará isento de coimas por três anos, enquanto as pequenas e médias empresas (PME) terão coimas menos gravosas do que as grandes empresas que, por natureza, trabalham com quantidades de dados bem maiores.

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