• Entrevista por:
  • Cristina Oliveira da Silva e Paula Nunes

Diferenciação da TSU vai a concertação social “com um conjunto de outras medidas”

A adequação da TSU em função do tipo de contrato deverá passar pela regulamentação da medida que já estava prevista no Código Contributivo.

O regime dos trabalhadores independentes vai ser alterado, mas Cláudia Joaquim diz que o tema ainda está a ser estudado. Em entrevista ao ECO na terça-feira, ainda antes de o Bloco de Esquerda ter indicado que já há acordo com o Governo numa série de alterações ao regime, a secretária de Estado da Segurança Social explicou alguns dos pontos que estão em aberto.

O Governo indicou a Bruxelas que quer aumentar as contribuições das empresas que optam por contratos a prazo, reduzindo a TSU para as que têm contratos sem termo. A medida era uma prioridade para 2016 e já está vertida no Código Contributivo há vários anos mas nunca foi regulamentada. Quando avança?

Temos definido prioridades na área das contribuições que têm que, de alguma forma, ser implementadas com alguma tranquilidade. Ou seja, todo o processo que terminou agora em setembro, de validações à entrada das Declarações de Remuneração…

...está a falar do novo sistema…

Sim, tivemos três fases, e culminou em setembro com aquilo que era o erro maior, que eram as taxas contributivas. [Os mais frequentes] era o erro associado à taxa e a inscrição incorreta do trabalhador. Ou porque a empresa se esquecia de inscrever o trabalhador e ele entrava na Declaração de Remunerações, mas como não estava como trabalhador da empresa, a Declaração de Remunerações dava erro… Este foi um passo que não é visível mas que foi gigantesco na melhoria da qualidade de informação.

E a mesma coisa nas taxas contributivas. O trabalhador tem uma taxa contributiva associada mas depois existe um conjunto de taxas. Ou porque o trabalhador é de uma IPSS, ou porque tem uma redução da taxa contributiva ou uma isenção mesmo que temporária… existem várias situações. E isso tinha uma consequência também: a empresa declarava uma determinada taxa mas o trabalhador estava registado como tendo outra taxa… estamos a falar de muitos milhares de erros por mês.

Foi preciso, primeiro, acabar com o problema pela raiz e fazermos com que, pelo menos a partir de agora, essas situações não se verifiquem… Teríamos ainda um conjunto de situações para trás, e que agora há todo um processo que vai ter que correr quase como um plano de contingência que vamos tentar regularizar ao máximo, mas isso permite-nos agora começar a olhar para todo o sistema contributivo e com mais tranquilidade e confiança fazer este tipo de alterações.

Em relação a esta medida específica de ajustar a TSU, é a medida que está no código Código Contributivo?

É a que está no Código à partida, é regulamentá-la. Há por exemplo uma questão que é muito técnica mas que é um passo que temos de fazer imediatamente a seguir, que é: quando uma entidade empregadora inscreve um trabalhador, não diz qual é a natureza do contrato. É mais uma alteração que vamos introduzir agora no sistema.

Quando uma entidade empregadora inscreve um trabalhador, não diz qual é a natureza do contrato. É mais uma alteração que vamos introduzir agora no sistema.

Cláudia Joaquim

Secretária de Estado da Segurança Social

Quando é de esperar que esta medida esteja no terreno?

É uma medida que em sede de concertação social será vista com um conjunto de outras medidas. Independentemente do prazo em que seja, há uma perspetiva de começarmos a trabalhar nesse sentido, até porque é essencial saber a natureza do contrato.

Acha que vai ser bem aceite pelos parceiros patronais?

O Código Contributivo teve acordo.

Mas essa medida foi adiada.

E depois acabou por não ser regulamentada. Mas é uma medida que também não pode ser vista como uma medida isolada.

Mas é uma medida que também não pode ser vista como uma medida isolada.

Cláudia Joaquim

Secretária de Estado da Segurança Social

Pode haver contrapartidas?

Haverá um conjunto de medidas para serem equacionadas em sede de concertação social, esta é uma delas.

Poderão avançar outras medidas relacionadas com a TSU, como a descida dos descontos para trabalhadores com baixos salários?

Várias medidas foram sendo faladas mas neste momento esta é que de uma forma mais clara — até por estar no programa do Governo — foi assumida como sendo a hipótese a equacionar.

Quanto pode significar em termos de impacto financeiro?

Esta questão parte de estimativas, exatamente porque tínhamos este constrangimento da informação disponível no sistema. Do que me recordo na altura, quando foram feitas as projeções, era uma medida tendencialmente neutra.

Quando foi desenhada no Código Contributivo… e agora?

Ainda estamos a tentar perceber quais são os impactos da medida com aquelas taxas que lá estão.

Ainda estamos a tentar perceber quais são os impactos da medida com aquelas taxas que lá estão.

Cláudia Joaquim

Secretária de Estado da Segurança Social

Já em relação ao regime dos trabalhadores independentes, este vai ser alterado para que os descontos possam incidir sobre um período mais recentes de descontos. Qual?

Estamos a trabalhar com diversas hipóteses. Há aqui uma questão que é procedimental mas que acaba por influenciar e que também estamos a estudar: se esse volume de negócios – porque no fundo é o que depois nos permite calcular o rendimento tributável – nos é comunicado pelo trabalhador independente… neste momento, só sabemos por via da liquidação do IRS e daí o hiato tão grande. Para sabermos meses mais recentes, temos duas hipóteses: ou nos é comunicado pelo próprio trabalhador independente ou vem via fisco. Mas o principal objetivo é mesmo aproximar aos rendimentos mais recentes possível, sendo que esta questão acaba por poder aqui influenciar um mês ou dois.

Pode ser uma média de dois meses, por exemplo?

Uma média de dois meses, três meses, o objetivo é que sejam rendimentos o mais recentes possível para exatamente evitar este hiato que acontece neste momento, que uma vezes é facilitador, outras vezes penalizador, face ao período em que houve volume de negócios.

Já há estimativa do impacto? A Segurança Social vai ganhar ou perder?

Não podemos esquecer uma coisa: associado a uma maior ou menor receita contributiva, há uma maior ou menor proteção. É possível que existam situações em que o trabalhador independente vá pagar menos e é possível que noutras situações vá pagar mais. Nós ainda estamos a fazer as contas e a pensar em várias hipóteses alternativas e por isso ainda é cedo ter essa estimativa.

De qualquer forma, há uma coisa que aconteceu com as alterações introduzidas no Orçamento do Estado para 2014. Uma [das alterações] foi a possibilidade de o trabalhador independente poder optar por dois escalões acima ou dois escalões abaixo em períodos diferentes. Isto permitiu, aos trabalhadores independentes que estavam por exemplo no 3º escalão, poder optar para o primeiro.

Mas depois houve outra alteração, que foi o enquadramento oficioso num escalão que não existe enquanto tal, que é o “escalão 0”. Se tem menos do que o IAS [Indexante dos Apoios Sociais], enquadra nos 50%, é quase como se fosse um escalão abaixo [do primeiro] e isso determinou que mais de metade dos trabalhadores independentes passassem, a partir de 2014, a estar enquadrados nesse escalão 0. E isto significa que todos estes trabalhadores independentes passaram a pagar menos contribuições, mas passaram a ter uma proteção que incide sobre esse valor de contribuições muito mais baixo.

Subsídios muito reduzidos?

Uma carreira contributiva toda ela muito mais baixa. E portanto eu não sei até que ponto é que esta decisão, na altura, teve consciência sobre as implicações das consequências a médio prazo. Antes já era possível o escalão 0 em determinadas situações, mas este enquadramento oficioso teve impacto… não só teve impacto nas contribuições que a Segurança Social recebe dos trabalhadores independentes…

…em baixa…

Em baixa, mas confesso que me preocupa mais a desproteção que isso possa ter causado.

Isso quer dizer que o Governo admite acabar com o escalão 0?

Acho que todo o regime tem de ser revisto. Podemos reavaliar até a existência de escalões. No limite pode não haver escalões. Quando os escalões foram criados, foi num contexto completamente diferente, de um rendimento que só era conhecido no ano seguinte, sem estas possibilidades todas do conhecimento real, atempado… neste momento, em relação ao regime dos trabalhadores independentes estamos a estudar todas as hipóteses.

E em relação à proteção social, é de esperar alterações no subsídio de desemprego a que estas pessoas têm direito, e que é hoje uma prestação restritiva?

Estamos também a avaliar essa situação. Porque neste momento temos [subsídios de] duas naturezas distintas: há os trabalhadores independentes economicamente dependentes e os empresários em nome individual. O verdadeiro subsídio de desemprego tem sempre associado, e é inevitável que tenha, uma situação de involuntariedade do desemprego. Em relação aos economicamente dependentes já há uma aproximação maior a essa lógica… Nos empresários em nome individual, aquele regime está concebido numa perspetiva de “como se demonstra a involuntariedade?” Demonstra-se com uma dimensão do volume de negócios que foi inevitável.

Acha que a lei não está corretamente desenhada?

Isso é o que estamos fazer agora: até que ponto esses critérios –- que eu percebo que fossem prudentes a determinada altura — não são demasiado exigentes. Agora conseguimos perceber, dos indeferimentos por esse motivo…

Há muitos indeferimentos?

Sim, há alguns. Os principais motivos têm a ver com essa situação, com dívida à Segurança Social — porque é uma condição nas prestações sociais os trabalhadores independentes terem a situação regularizada. Estamos a estudar cada um dos motivos para perceber onde é que faz sentido alterar, modelar, para aumentar a proteção, tendo sempre presente esta situação, que é: a involuntariedade nesta natureza de trabalho não é uma involuntariedade como um trabalhador por conta de outrem, é diferente.

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A atualização do IAS tem efeito sobre os escalões dos trabalhadores independentes. Quando o IAS aumentar em janeiro, as contribuições vão ser ajustadas?

Se mantivermos os mesmos escalões, não.

Mas se os escalões estão indexados ao IAS, não é automático este avanço?

O que nós estamos a equacionar é: o que está agora aqui em causa é sempre muito provisório porque estamos a rever o regime. E portanto, estar a introduzir aqui alterações quando tencionamos rever o regime ao longo do ano de 2017 pode não fazer sentido.

Isso quer dizer que pode haver uma salvaguarda?

Há um reposicionamento [dos trabalhadores independentes em escalões] agora em outubro, a produzir efeitos a novembro que, em condições normais, seria de novembro a outubro do próximo ano. A expectativa que temos é que este reposicionamento produza efeitos ainda durante parte do ano de 2017, mas já não termos um próximo reposicionamento ao abrigo da legislação em vigor neste momento. E portanto, essa situação que seria a primeira vez – porque o IAS tem estado congelado – a reflexão que tivemos foi nesse sentido: manter como está o reposicionamento que for feito agora em novembro.

E não mexer na contribuição apesar do IAS ter aumentado…

No fundo encaramos estes meses como um regime provisório. O atual regime como provisório. Para não estarmos com demasiadas mudanças que são insignificantes.

Portanto, no próximo ano não é de esperar que o aumento do IAS traga aumento das contribuições.

Não. Não seria um grande aumento mas seria um processo todo que teria de ser mudado.

Que medidas estão previstas para combater a dívida à Segurança Social, além do PERES?

Temos duas abordagens importantes. Uma é a cobrança, e o PERES [Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado] tem esse objetivo. Os acordos prestacionais que fazemos, e o alargamento que fizemos permitindo que dívidas de menor valor pudessem aumentar o numero de prestações, é precisamente porque verificamos que, se for possível alargar os planos prestacionais, estamos a fazer com que a cobrança seja em mais tempo mas diminuímos a taxa de incumprimento.

Incumprimento do próprio acordo, da capacidade de ir pagando o que está acordado.

Exatamente. E há um conjunto de medidas que estão também no Simplex e que penso que irão facilitar bastante a relação do contribuinte com as secções de processo neste caso. É o sefWeb, que é passarmos a ter na Internet uma secção de processo online, que permita a qualquer contribuinte fazer logo ali o seu pedido de plano prestacional, praticamente evitar que seja necessária uma deslocação. Este é um dos desenvolvimentos que está em fase final.

Depois há outra perspetiva, que é a da prevenção. Aí é fundamental termos uma melhor cobrança da contribuição corrente, porque quando uma entidade empregadora tem dívida à Segurança Social, é muito importante que consiga, a par do pagamento do plano prestacional, pagar as contribuições correntes, não gere nova dívida. E um dos principais motivos para se poder prolongar os planos de pagamento ou fazer algo como o PERES, é que é fundamental que as contribuições correntes sejam pagas e que não seja gerada nova dívida.

Ainda na perspetiva da prevenção, há também uma abordagem que é provavelmente o nosso maior desafio nos próximos meses, que passa pelas Declarações de Remuneração oficiosas, por causa da subdeclaração. Se nós sabemos que uma determinada empresa tem um conjunto de trabalhadores, se há um trabalhador que não consta numa Declaração de Remuneração e não esteve com subsídio de doença, parentalidade…

Se não transitou para uma prestação social?

Exatamente. Pode haver depois situações até que o Código Contributivo prevê de licenças sem vencimento, etc… mas quando verificamos que não consta o trabalhador, sem um motivo aparente, depois da entrega da Declaração de Remunerações por parte da entidade empregadora, ser a Segurança Social a notificar a entidade empregadora.

Para se explicar?

Basicamente sim, em sede de audiência prévia.

Quando será implementado?

Era um passo que tínhamos de fazer para poder passar agora para essa fase, é uma fase muito exigente.

Há uma estimativa de quanto a Segurança Social vai arrecadar com o PERES?

Não fizemos uma estimativa mesmo. Porque depende de uma adesão. Poderíamos ter ido recuperar o que foi o resultado do programa de 2013 mas não o fizemos. A nossa principal preocupação é que possa haver um pagamento das contribuições.

Há medidas na calha para se reduzir o volume de prestações indevidamente pagas?

Há algumas prestações sociais onde as prestações indevidamente pagas acabam por ter maior volume. É o subsídio de desemprego…

Toda a gente que recebe subsídio acaba por ter pagamentos indevidos...

Ou esgota a prestação ou há sempre uma prestação indevidamente paga. Há duas prestações, e são essas que estamos a estudar o que podemos fazer: o subsídio de desemprego e o abono de família, por causa da prova escolar. Se bem que aí uma das medidas que temos no Simplex é o desenvolvimento de uma interconexão com o Ensino Superior e com a Educação.

Há duas prestações, e são essas que estamos a estudar o que podemos fazer: o subsídio de desemprego e o abono de família.

Cláudia Joaquim

Secretária de Estado da Segurança Social

Para reduzir estas situações?

Sim. Temos situações de provas escolares que são feitas mas que depois não se concretiza a frequência. Aí houve um pagamento extra.

E no subsídio de desemprego, o que se pode fazer?

Há uma interconexão de dados com o IEFP [Instituto do Emprego e Formação Profissional] desde 2006 ou 2007, porque antes disso era muito pior. Antes disso, implicava uma comunicação por parte do trabalhador à Segurança Social e que alguém fosse pegar no requerimento em papel e tratá-lo. Isto minimizou bastante mas pode ter que passar pelos próprios procedimentos de comunicação, a própria entidade empregadora…

  • Cristina Oliveira da Silva
  • Redatora
  • Paula Nunes
  • Fotojornalista

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