Economista de Sofá

  • ECO
  • 26 Março 2017

O ECO publica, a partir de hoje, semanalmente, um capítulo de um livro. Economista de Sofá, de Steven E. Landsburg, é o primeiro, editado pelo Clube do Autor.

Preâmbulo à presente edição

Certo dia, em 1991, entrei numa livraria de dimensão média e contei mais de 80 títulos sobre física quântica e história do universo. Algumas prateleiras adiante, encontrei o bestseller de Richard Dawkins, ‘O Gene Egoísta’, juntamente com dezenas de outros livros que explicam a evolução darwiniana e o código genético. Nos melhores livros desta classe descobri maravilhas naturais, confrontei mistérios, aprendi novas formas de pensar e senti ter participado numa grande aventura intelectual baseada em ideias deslumbrantes no seu alcance e na sua simplicidade.

A ciência económica também é uma grande aventura intelectual, mas em 1991 não consegui encontrar um único livro que se propusesse partilhar essa aventura com o grande público. Não havia qualquer obra nada que revelasse a especificidade do pensamento dos economistas, utilizando um conjunto de ideias simples para iluminar a totalidade do comportamento humano, ultrapassar os nossos preconceitos e levar-nos a considerar novas formas de ver o mundo. Resolvi escrever esse livro. O ‘Economista de Sofá’ foi publicado em 1993 e atraiu um grande número de seguidores devotos. (…)

O ‘Economista de Sofá’ pretende impressionar com lógica. Alógica é importante. Leva-nos de ideias simples a conclusões surpreendentes.

Uma ideia simples é que as pessoas reagem a incentivos. Uma conclusão surpreendente é que quando estão protegidas por air bags, as pessoas conduzem de forma imprudente e têm mais acidentes. Uma ideia simples é que quando o preço de uma coisa desce, os fornecedores oferecem menos quantidade. Uma conclusão surpreendente é que programas de reciclagem, que reduzem o preço da madeira, levam à plantação de menos árvores e à redução da área florestal. Uma ideia simples é que os monopolistas cobram pelo seu produto o preço máximo que o mercado suporta. Uma conclusão surpreendente é que quando o abastecimento de petróleo é interrompido, as pronunciadas subidas de preços que se seguem são prova de concorrência, não de monopólio, pois uma empresa petrolífera monopolista não esperaria por uma interrupção de abastecimento para aumentar o preço. A evidência empírica é muito importante, mas a lógica pode ser poderosa por si própria. (…)

Muita coisa mudou desde 1991 (…) Ao atualizar o ‘Economista de Sofá’ para o século XXI, vasculhei a internet, a comunicação social e minha própria experiência de vida em busca de boas aplicações contemporâneas das ideias eternas da teoria económica. Consequentemente, alguns capítulos – cujos exemplos estavam a ficar bafientos – foram inteiramente reescritos. Outros foram atualizados para dar mais ênfase às preocupações dos dias de hoje. (…)

Uma outra coisa mudou desde 1991: o mundo tornou-se mais ideológico. Hoje em dia é quase impossível explicar um passo não controverso de um raciocínio económico sem sofrer a suspeição de ter uma agenda ideológica escondida.

Deixem-me, portanto, ser frontal relativamente a isso: tenho opiniões. Falando de forma genérica, tendo a ser otimista no que respeita à capacidade de os mercados fazerem bem, e cético no que respeita à capacidade de os governos fazerem melhor. E tenho certeza de que haverá uma ou outra passagem neste livro onde não terei conseguido conter esses preconceitos. Mas este livro não é trabalho ideológico. A obra trata, salvo raras exceções, dos princípios básicos que norteiam o trabalho de quase todos os economistas, independentemente da sua localização no espetro político.

POR QUE SÃO MAUS OS IMPOSTOS?

A lógica da eficiência

O que há de mal nos impostos? A resposta óbvia é que não é simpático ter de os pagar. Mas a resposta óbvia é que é muito simpático coletá-los. Visto que dólar pago é um dólar coletado, poderíamos argumentar que uma mão lava a outra. Se o cobrador de impostos retirar um dólar ao leitor e o der à minha mãe a título de pensão de reforma, o leitor pode legitimamente resmungar. Mas eu (que me preocupo mais com a minha mãe do que consigo) perspetivarei a transferência de forma mais positiva.

Não há nada na ciência económica que revele se o leitor merece mais ou menos esse dólar, pelo que, para um observador desinteressado a transferência é neutral no fim de contas, nem boa nem má. O verdadeiro problema dos impostos não é termos de os pagar, mas sim que tentamos evitá-los. E tentar evitá-los tem um custo que não gera benefícios para ninguém.

Vejam-se, por exemplo, as minhas sandálias. Encontrei-as na internet por 40 dólares, embora estivesse disposto a pagar 50. Neste sentido, comprá-las tornou-me 10 dólares mais rico. Melhor ainda: o meu ganho não foi obtido às custas de ninguém, pelo que o mundo como um todo ficou 10 dólares mais rico. Esse ganho – a diferença entre o que eu estava disposto a pagar e o que realmente paguei – é que os economistas denominam de excedente do consumidor. Se um imposto sobre as vendas acrescentasse, digamos, seis dólares ao preço das sandálias, ainda as compraria. Ficaria seis dólares mais pobre, mas alguém ficaria seis dólares mais rico. Até aqui tudo bem. Mas se um imposto sobre as vendas acrescentasse, digamos, 12 dólares ao preço das sandálias, eu teria evitado o imposto ao não comprar as sandálias. Perderia o meu excedente de 10 dólares e ficaria a ganhar. Isto é claramente mau. Mesmo um imposto reduzido sobre as vendas provavelmente levaria algumas a não comprar as sandálias.

O verdadeiro problema dos impostos não é termos de os pagar, mas sim que tentamos evitá-los. E tentar evitá-los tem um custo que não gera benefícios para ninguém.

Steven Landsburg

A perda de excedente do consumidor perdido dessas pessoas é o que os economistas denominam perda de peso morto ou carga excedente, porque não é compensada por qualquer benefício. Os impostos fazem quase sempre mais mal do que bem. Para coletar de um dólar, teremos de tirar um dólar a alguém; ao fazê-lo, quase sempre incentivamos alguém a não comprar um par de sandálias, a não construir uma casa, a não trabalhar horas extras.

Quando uma política pública faz mais mal do que bem – isto é, quando se geram perdas de peso morto – chamamos-lhe ineficiente e habitualmente lamentamos a sua aplicação. O único tipo de imposto que evita as perdas de peso morto é um imposto por pessoa, em que toda a gente paga um valor determinado sem se atender ao rendimento, ao património, às compras efetuadas ou qualquer outra coisa sobre a qual o contribuinte tenha controlo.

Em teoria, os economistas adoram impostos por pessoa, mas, na prática, reconhecemos que representam uma solução radical para o problema da ineficiência. Assim, se quisermos ter algum tipo de governo, e se não estivermos dispostos a ir ao extremo de o financiar através de impostos por pessoa, teremos de aceitar uma certa quantidade de perda de peso morto. Mas a perda de peso morto de uma política fiscal pode ser maior do que outra. Quando uma política pública cria perdas de peso morto particularmente elevadas, os economistas começam a procurar alternativas.

A essência da análise do problema é pesar os ganhos e as perdas individuais. Qual é o impacto de uma tarifa sobre automóveis importados? Os analistas sem formação em economia poderiam abordar esta questão estimando os efeitos sobre o emprego na indústria automobilística, o balanço da General Motors, e até mesmo sobre os défices comercial e público. É um ponto de partida mas, por si só, este tipo de análise passa em grande parte ao lado do essencial. Não nos fornece um critério para pesar o bem contra o mal. (Será que um aumento de 4% no desemprego entre os trabalhadores da indústria automobilística equivale a um decréscimo de 3% no preço dos automóveis? E que dizer de uma redução de mil milhões de dólares no défice comercial?)

Esse tipo de análise nem sequer nos fornece um critério para decidir o que deve ser considerado do lado positivo e do lado negativo da contabilização. (Será um aumento na produção de automóveis domésticos, com o correspondente consumo de recursos valiosos, uma coisa boa ou má?) Os economistas abordam estas questões centrando-se na forma como as políticas públicas afetam os indivíduos. (Evidentemente, os indivíduos são afetados pelos lucros da indústria automóvel e pelos défices orçamentais, pelo que talvez tenhamos de considerar esse tipos de coisas – mas apenas enquanto etapas intermédias.)

Relativamente a cada indivíduo, perguntamos: esta pessoa ganha ou perde em resultado desta tarifa – e quanto? Os ganhos e as perdas incluem variações no excedente do consumidor, variações nos lucros dos produtores, transferências feitas com as receitas tarifárias e todas as outras coisas a que o indivíduo dá valor. Somamos os ganhos dos beneficiados e as perdas dos prejudicados. Se os beneficiados ganham mais do que os prejudicados, tendemos a ver a opção como desejável. Se os prejudicados perdem mais do que os beneficiados ganham, declaramos a diferença uma perda de peso morto, pronunciamos a política ineficiente e consideramos o valor da perda de peso morto uma medida de quanto é indesejável.

(…)

A lógica da eficiência subjaz ao desagrado do economista relativamente à inflação. A inflação tem custos para quem recebe rendimentos nominais fixos, mas é benéfica – e exatamente na mesma medida – para quem paga esses rendimentos nominais fixos. Uma inflação inesperada pode ser uma bênção para quem pediu um empréstimo e o paga com dólares inflacionados, mas é simultaneamente uma maldição – exatamente na mesma magnitude – para o credor que recebe esses dólares. Estes efeitos, que são muitas vezes referidos como as principais consequências económicas de inflação, cancelam-se mutuamente e têm um efeito neutral na eficiência.

O verdadeiro custo económico de inflação, assim como o verdadeiro custo económico de um imposto, é que, para a evitar, as pessoas fazem coisas que têm custos, e isso não beneficia ninguém.

Em tempos de inflação, as pessoas andam com menos dinheiro no bolso, porque o dinheiro perde valor pelo simples facto de o transportarem dessa forma. As suas contas correntes apresentam saldos menores pela mesma razão. Isto pode tornar mais difícil a compra de um cachorro quente por capricho, usar um táxi durante uma tempestade inesperada ou e aumentar o número de utilizações das caixas multibanco. As lojas têm menos dinheiro em caixa e ficam sem troco com mais frequência. As grandes empresas têm menos dinheiro para atender a emergências inesperadas e veem-se obrigadas a recorrer a transações financeiras dispendiosas.

Tudo isto são perdas de peso-morto – não são compensadas por quaisquer benefícios. Pode parecer que têm pouca importância em termos gerais, mas estima-se que as perdas de peso morto de uma inflação de 3 por cento nos Estados Unidos sejam de cerca de 18 mil milhões de dólares por ano, ou seja, 60 dólares por cada norte-americano – nada terrível, mas também nada trivial.

Em tempos de inflação muito elevada, as perdas de peso morto podem tornar-se enormes. Na hiperinflação húngara que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, os preços centuplicavam a cada mês. Isto significa que uma chávena de café que era vendida a 10 cêntimos a 1 de janeiro custava 10 dólares a 1 de fevereiro, 1 000 dólares a 1 de março, 100 000 dólares a 1 de abril, 10 milhões de dólares a 1 de maio, 1 000 milhões de dólares a 1 de junho, 100 000 milhões de dólares a 1 de julho, e 10 biliões de dólares a 1 de agosto. Os trabalhadores eram pagos três vezes ao dia e as suas mulheres tinham empregos a tempo inteiro a correr entre os locais de trabalho e o banco, tentando depositar os cheques com os salários antes de eles se tornaram inúteis.

Tal sacrifício de tempo e energia que não beneficia ninguém é um exemplo clássico de um peso morto. John Maynard Keynes contou que, durante a hiperinflação alemã que se seguiu à I Guerra Mundial, os frequentadores de tabernas pediam muitas vezes várias cervejas ao início da noite – porque o preço ia subir. Beber cerveja quente pode ser um custo oculto da inflação.

Os argumentistas de Hollywood e os habitués do circuito das conferências universitárias redescobrem periodicamente o potencial dramático de queimar uma nota de dólar. Normalmente, o ato é acompanhado por um comentário emotivo – feito por um simpático personagem na tela do cinema ou por um ícone cultural, já na terceira idade, no ginásio de uma universidade – sobre como uma nota de dólar não é nada mais do que um pedaço de papel. Não se pode comê-la, não se pode bebê-la e não se pode fazer amor com ela. E o mundo não fica pior com o seu desaparecimento. As audiências sofisticadas tendem a sentir-se desconfortáveis com este tipo de raciocínio, sentindo que está de alguma forma errado, mas são incapazes de identificar a falha crucial. Na realidade, é o seu próprio desconforto que constitui um grave erro.

O orador tem razão. Se alguém passar uma noite a queimar dinheiro, o mundo como um todo continua a ser exatamente tão rico como sempre foi. Permitam-me sugerir uma causa provável da falsa sensação que o público tem de que algo está errado. O público reconhece – corretamente – que no final da noite quem queimou o dinheiro estará mais pobre. Se essa pessoa está mais pobre, e se ela é parte do mundo, não deve o mundo estar mais pobre também? A resposta é claramente não.

O mundo não está mais pobre porque nada de valor foi destruído. Portanto, se quem queimou o dinheiro está um dólar mais pobre, alguém deve estar um dólar mais rico. Tudo o que temos a fazer é descobrir essa pessoa. A chave para o mistério é a observação de que a oferta de moeda determina o nível geral de preços. Quando a oferta de dinheiro aumenta, os preços sobem, e quando diminui, os preços caem. Quando um dólar se transforma em cinza, a oferta de dinheiro diminui, ainda que levemente, e os preços caem em toda a economia. Se apenas uma nota for queimada, os preços caem impercetivelmente, mas caem. Os beneficiários dessa ocorrência são as pessoas que têm dinheiro no momento em que o dólar é queimado. Com a queda dos preços, o dinheiro que guardam no bolso ganha valor. Uma redução pequena nos preços cria um aumento pequeno na riqueza de cada uma das inúmeras pessoas que têm dinheiro no bolso no momento da alteração. Muitos milhões de aumentos impercetivelmente pequenos na riqueza podem constituir um fenómeno percetível. Neste caso, somam exatamente um dólar.

O público reconhece – corretamente – que no final da noite quem queimou o dinheiro estará mais pobre. Se essa pessoa está mais pobre, e se ela é parte do mundo, não deve o mundo estar mais pobre também? A resposta é claramente não.

Steven Landsburg

Afinal, sabemos que o valor total dos bens reais no mundo se mantém inalterado, e também que o orador que queimou a nota perdeu um dólar. Podemos, portanto, concluir que exatamente um dólar foi ganho noutro lado. Ocasionalmente, um altruísta excêntrico reúne os seus bens e doa-os ao Tesouro dos EUA. Em resultado, os impostos atuais ou futuros devem reduzir-se.

Cada um dos milhões de contribuintes dos EUA beneficia de uma pequena redução na carga tributária. Mas nem todos beneficiamos igualmente. Aqueles que se situam nos segmentos de rendimento mais elevados – os mais ricos – ficam com uma parte mais que proporcional da doação. Uma estratégia alternativa para o altruísta seria converter os ativos em dinheiro e, em vez de os doar ao Tesouro, fazer uma fogueira com eles. O resultado é essencialmente o mesmo.
Pequenos benefícios revertem para milhões de americanos (desta vez na forma de queda dos preços, em vez de redução de impostos a pagar), e o total desses benefícios é igual ao sacrifício do altruísta. No cenário da fogueira, a parcela de benefícios de cada pessoa é proporcional não ao imposto pago, mas à quantia que essa pessoa detém no momento da fogueira. Este efeito tende a favorecer os ricos, mas provavelmente de forma menos pronunciada. Assim, se o leitor está a pensar-se lembrar-se do Tesouro no seu testamento, e se é uma pessoa igualitária, pense antes em fazer uma fogueira.

Num dia ventoso em Nova Orleães, uma nota de dólar escapou-se me da mão. Fui atrás dela, disposto a evitar que fosse esgoto abaixo. David Friedman – meu amigo, colega economista e, naquele momento, meu anjo da guarda – impediu-me de tentar agarrá-la. Eu tinha acabado de argumentar que a eficiência económica norteia não apenas boas políticas públicas, mas também uma boa conduta pessoal.
Segundo esse princípio, a intervenção de David salvou-me de cometer impensadamente um ato imoral. Se eu desistir do dólar, a contabilidade custo-benefício é a seguinte: perco um dólar, o mundo ganha um dólar através da redução dos preços e o mundo como um todo não fica nem mais rico nem mais pobre do que antes.

Consequências em termos de eficiência económica: nenhumas. Mas se eu tentar agarrar a nota, faço um esforço de aproximadamente três cêntimos. (Ou seja, três cêntimos é o que eu estaria disposto a pagar ao David para a recuperar por mim, em vez de ser eu a persegui-la.) Contabilidade custo-benefício: eu perco três cêntimos, o resto do mundo nem ganha nem perde, e o mundo como um todo (incluindo eu próprio) fica três cêntimos mais pobre. Consequência em termos de eficiência económica: perda de peso morto de três cêntimos. E a lógica da eficiência convenceu-me a desistir da nota.

Será mesmo assim? Permitam-me distinguir entre duas proposições bastante diferentes. Uma delas é que a eficiência económica deve ter um papel importante na resolução de questões relacionadas com políticas públicas. A outra é que a eficiência económica deve ter um papel importante na resolução de questões de conduta pessoal. É apenas a primeira que os economistas frequentemente defendem.

Como a maioria das pessoas, os economistas fazem-se ouvir quando criticam o governo, mas são tímidos quando se criticam uns aos outros. O critério de eficiência trata toda a gente por igual. Um custo é um custo, independentemente quem o suporta. No domínio das políticas públicas, esta é uma característica apelativa. Mas nos nossos assuntos particulares, parece estranho insistir em que devemos comportar-nos como se nossas próprias preocupações não fossem mais importantes do que as preocupações de estranhos distantes.

Há momentos, como naquele dia em Nova Orleães, em que acho que a eficiência falha completamente enquanto orientação para o modo como devo agir. Mas há outros em que me é útil. Quando a minha relva cresce e os vizinhos torcem o nariz, tenho de me perguntar se eu estou moralmente obrigado a remediar a situação. Ao fazê-lo, penso no que me custaria aparar a relva e na infelicidade dos vizinhos. Se me parecer provável que me custará 30 dólares em esforço poupar aos meus vizinhos cerca de 20 dólares em insatisfação, tomo mais um copo de limonada e deixo de me preocupar com a questão.

Se me parecer que com 30 dólares de esforço poderei poupar aos vizinhos 50 dólares em insatisfação, então sentir-me-ei um vilão enquanto não cortar a relva. Trata-se de um cálculo de eficiência que conduz a conclusões que me parecem corretas. Mas não sou inteiramente consistente em relação a isto. Quando decido ligar um motor de combustão interna ou usar um aerossol, preocupo-me com os danos que posso provocar aos outros, ao prejudicar a qualidade do ar. Mas sou veemente em não me preocupar com os danos psíquicos que poderei causar às outras pessoas que se sentem moralmente ofendidas por simplesmente pensarem que ligo um motor de combustão interna ou uso um aerossol.

Penso que esta distinção é difícil de justificar filosoficamente. Se a minha escolha de locomoção torna o leitor infeliz, então eu torno o mundo menos feliz de uma forma que é independente do motivo pelo qual a minha escolha de locomoção torna o leitor infeliz. A lógica estrita de eficiência diria que, se estou disposto a ficar em casa em vez de causar 10 dólares de danos aos seus pulmões, então também devo estar disposto a ficar em casa em vez de causar 10 dólares de danos às suas sensibilidades morais. Concluo que a minha filosofia moral está incompleta, mas que as considerações associadas à eficiência desempenham um papel importante nela.

Contudo, uma recente viagem a Boston abalou um pouco a minha fé. Eu e a minha mulher fomos a Denver de avião, e os bilhetes de ida e volta custaram quase 2500 dólares. Ofereci alternativas ao editor que os iria pagar, mas ele insistiu em que fossemos. Tenho certeza de que se fosse eu a pagar, teria cancelado a viagem. A situação levou-me a formular o seguinte dilema moral: suponha-se que ir a Boston e regressar vale 300 dólares para mim. À companhia aérea custa 200 dólares transportar-me. Mas, devido a um extraordinário poder de monopólio, a companhia aérea cobra mil dólares pelo bilhete. Devo ir de avião? Se apenas nos preocuparmos com a eficiência, a resposta é, sem dúvida, sim. Se eu for de avião, fico 700 dólares pior (a diferença entre o que pagarei e o valor da viagem), enquanto os acionistas da companhia aérea ficam 800 dólares melhor (a diferença entre o que cobram e o custo de me transportar). Há um ganho líquido de 100 dólares, e o critério de eficiência considera a viagem uma coisa positiva. No entanto, tenho certeza que não compraria o bilhete, e eu estou igualmente certo que não perderia o sono por isso. Tenho certeza de que iria chegar à mesma conclusão independentemente de quanto os acionistas ganhassem, ou de quanto eu tivesse a perder.

Assim, embora ainda ache que a eficiência é um bom princípio orientador das políticas públicas, e em muitos casos um bom princípio orientador do comportamento pessoal, creio agora que precisamos de um critério mais subtil para definirmos realmente o que significa ser bom. Creio que há ocasiões em que eu deveria tentar comportar-me de forma eficiente e outros em que não. Só ainda não descobri as regras para as distinguir. Acabei por recuperar aquele dólar, sem me preocupar minimamente com o efeito no nível geral de preços. Não sinto qualquer culpa, embora não saiba porquê.

Nota: Steven Landsburg é professor de Economia na Universidade de Rochester em Nova Iorque. Tem vários livros publicados e é autor de mais de 30 artigos para revistas especializadas de Matemática, Economia e Filosofia. Além disso, como comentador, é presença assídua na televisão e na rádio.

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