Governo vai entrar na entidade única de supervisão financeira

A proposta de reforma da supervisão financeira, coordenada por Carlos Tavares, prevê que as Finanças também devem ter assento no novo supervisor único, ao lado de Banco de Portugal, CMVM e Seguros.

Mário Centeno falou em “personalidades independentes” para integrar o supervisor financeiro, juntamente com Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e Autoridade de Supervisão de Seguros (ASF), mas Carlos Tavares, que coordenou o grupo para a reforma do modelo de supervisão financeira, recomenda que o Governo também deve ter assento na nova entidade supervisora, que funcionará por cima dos três setoriais que já existem.

No documento que este grupo de trabalho já apresentou ao Executivo, e no capítulo a que o ECO teve acesso, Carlos Tavares deixa claro que o Ministério das Finanças é uma “entidade relevante” e que deve ser um participante dentro desse derradeiro supervisor que garanta a estabilidade financeira em Portugal.

Primeiro porque o ministério tutelado por Mário Centeno detém instrumentos vitais para assegurar a solidez do sistema. Depois, prossegue Tavares, porque qualquer falha na supervisão será sempre, em última instância, responsabilidade do Governo, uma posição que o próprio ministro das Finanças fez questão de sublinhar quando, no passado dia 9 de março, apresentou aos deputados a intenção de avançar para a criação do novo supervisor central que passará a concentrar a supervisão macroprudencial e a resolução dos bancos — algo que está atualmente na esfera do Banco de Portugal.

“Dado o seu papel de garante da estabilidade financeira e de prevenção do risco sistémico, a escolha da entidade responsável terá de ser criteriosa e assegurar a participação equilibrada de todas as entidades relevantes, incluindo o Ministério das Finanças — com salvaguarda da independência da autoridade macroprudencial”, considera o ex-presidente da CMVM, explicando de seguida por que razão o Governo também deve estar representado: “Quer por dever ser o detentor de instrumentos cruciais para o efeito, quer por inevitavelmente ser um destinatário central das consequências de eventuais falhas na supervisão“.

Também Centeno explicou a necessidade de operar alterações ao modelo de supervisão com a responsabilização que o Governo assume enquanto garante último da segurança do sistema financeiro. “Não nos enganemos, o responsável pela estabilidade financeira é o Governo, é o ministro das Finanças“, declarou o governante na Assembleia há uma semana.

Na mesma intervenção, ainda assim, garantiu que a entidade “deverá ser dotada de personalidade jurídica e de um estatuto de independência“. “Na sua administração participarão as autoridades de supervisão setorial, mas será dirigida por personalidades independentes, garantindo assim, em simultâneo, a participação e responsabilização plena de todas as autoridades nas matérias de supervisão”, frisou ainda.

Estas mudanças vêm dar resposta a duas das principais falhas que aponta ao atual sistema, nomeadamente os conflitos de interesse entre a supervisão microprudencial e as decisões de resolução — como aquelas que foram aplicadas ao BES e Banif; e a insuficiente coordenação e troca e informações entre Banco de Portugal, CMVM e ASF.

O anteprojeto de documento de consulta pública já foi apresentado ao Governo, que dará a conhecer brevemente a sua proposta.

Para já, tanto Comissão Europeia como o Banco Central Europeu (BCE) estão expectantes em relação ao novo modelo de supervisão que o Governo português quer implementar. Não levantam objeções às mudanças que estão em curso, esperando por mais detalhes.

Portugal com uma supervisão única

No documento a que o ECO teve acesso, a equipa liderada por Carlos Tavares identifica os vários modelos de supervisão existentes na Europa, de onde destaca que “os melhores exemplos internacionais apontam para uma segregação de funções entre a supervisão microprudencial e a macroprudencial“. Entre os diferentes modelos adotados, chega à conclusão que a estrutura em Portugal apresenta-se quase como caso único no Velho Continente.

“Apenas em quatro casos o mandato de supervisão macroprudencial foi atribuído em exclusivo ao Banco Central (Chipre, Espanha, Grécia e Portugal)”, lê-se no relatório, que salienta, ainda assim, especificidades próprias no caso cipriota e grego e as alterações previstas no modelo espanhol.

“No caso de Chipre, a supervisão macroprudencial dos setores segurador e de fundos de pensões encontra-se sob alçada direta do Governo. No caso da Grécia, as competências do banco central abrangem a supervisão microprudencial dos setores bancário e segurador”, explica. No caso da Espanha, a “atribuição deve entender-se como provisória”, estando previstas mudanças na estrutura supervisora.

Tavares justifica a necessidade de separar supervisão microprudencial (banco a banco) da supervisão macroprudencial (mais abrangente) “de modo a evitar conflitos de interesse e permitir uma atuação independente e transversal na definição de políticas macroprudenciais que reforcem a estabilidade do sistema financeiro, isto sem prejuízo do papel importante que o banco central deve ter na estabilidade financeira“.

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