“Lei da Uber” já está em vigor. Saiba tudo o que vai mudar para plataformas, motoristas e utilizadores

É motorista da Uber, Cabify ou Taxify? Ou parceiro de uma destas plataformas? Ou é passageiro? Saiba o que terá de fazer para se preparar para a nova legislação que entra em vigor a 1 de novembro.

A nova versão da lei que regulamentará as plataformas eletrónicas de transporte já foi aprovada na generalidade, depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter chumbado a proposta inicial. A lei foi publicada em Diário da República a 10 de agosto e entra em vigor a 1 de novembro.

É passageiro? É motorista? Tem uma empresa parceira? Ou é um responsável da Uber, da Cabify ou da Taxify? Ao longo das próximas linhas, o ECO conta-lhe o que tem de fazer para se preparar para o novo regime. Conheça as novidades.

Nota: Este guia, originalmente publicado pelo ECO a 24 de março de 2018, foi republicado a 13 de julho de 2018, com as atualizações introduzidas pela reapreciação do projeto de lei após o veto do Presidente, e a 10 de agosto, dia em que a lei foi publicada em Diário da República. Volta a ser republicado a 31 de outubro, com os detalhes da portaria do Governo, que define a carga horária do curso de motorista.

Novidades para os motoristas

Se é motorista ao serviço de uma empresa parceira de plataformas, passará a chamar-se de motorista de “transporte em veículo descaracterizado a partir de plataforma eletrónica”, ou motorista de TVDE. Passa a ser obrigatório ter carta de condução há mais de três anos para categoria B com averbamento no grupo dois.

Terá ainda de completar um curso de formação obrigatório, válido por cinco anos. Este curso tem uma carga horária mínima de 50 horas, contém uma componente teórica e uma componente prática e inclui módulos de comunicação e relações interpessoais, normas legais de condução, técnicas de condução, regulamentação da atividade, situações de emergência e primeiros socorros e condução individual de veículos. Este curso é lecionado pelas escolas de condução ou entidades formadoras legalmente certificadas. A renovação do certificado está sujeito a um novo curso de formação, mas com uma carga horária mais reduzida, de apenas oito horas. Os preços poderão rondar os 300 euros.

Quando a lei entrar em vigor, e após completar o curso, deverá solicitar ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) um certificado de motorista de TVDE, válido por cinco anos. Este passa a ser a sua licença legal para poder conduzir ao serviço destas plataformas e dá-lhe um número único que passa a ser a sua identificação em todo o mercado, independentemente da ou das plataformas em que está registado. As características de idoneidade que já estão em vigor no mercado, como é o caso do registo criminal limpo, mantêm-se e passam a ser obrigatórias por lei.

Se já é taxista e detém um Certificado de Motorista de Táxi, não precisa de completar o curso de formação nem de ter certificado de motorista de TVDE.

Para estar dentro da legalidade, terá ainda de possuir um contrato escrito com um parceiro, que passa a ser a sua entidade empregadora. Este contrato está abrangido pelo Código do Trabalho, nomeadamente pelo artigo 12º, que dita que devem existir “horas de início e de termo” definidas pela empresa parceira e que o motorista seja pago numa “quantia certa” e “com determinada periodicidade”.

Enquanto motorista, só poderá recusar um serviço se este implicar a circulação por estradas intransitáveis, de difícil acesso ou que passem por locais de perigo. Pode ainda recusá-lo a “pessoas com comportamento suspeito de perigosidade”. Não pode recusar o transporte de bagagem, a não ser que esta, pelas suas características, possa danificar o carro. Também não pode recusar o transporte de animais de estimação, se estes estiverem “devidamente acompanhados e acondicionados”, a não ser que existam fatores de “perigosidade” associados ao seu transporte, como o “estado de saúde” ou a “higiene” do animal.

Fica ainda impedido de recolher passageiros mediante solicitação no local, não poderá circular em faixas BUS e, também, não pode parar em praças de táxis. Fica também proibido de estar mais de dez horas por dia ao volante, independentemente da aplicação para a qual trabalhe (a aplicação, aliás, deverá bloquear automaticamente a sua conta se isso acontecer, com base no seu número único de motorista).

Novidades para os parceiros

No âmbito da nova lei, as empresas parceiras passam a ser consideradas “operadores de TVDE”. Em linhas gerais, se é parceiro da Uber, Cabify ou Taxify, terá de solicitar uma licença ao IMT, válida por dez anos, através do preenchimento de um formulário no Balcão do Empreendedor. O IMT deve pronunciar-se sobre a atribuição da licença ou, caso não o faça em 30 dias úteis, o pedido é automaticamente aceite por deferimento tácito.

Para ser parceiro e poder ter automóveis ao serviço das plataformas, terá, obrigatoriamente, de constituir uma empresa, pois a lei só permite a atividade a “pessoas coletivas”.

Para obtenção da licença, deve fornecer ao IMT as seguintes informações : denominação social; NIF; sede; designação ou marcas adotadas para a operação; email; lista com os titulares de órgãos de administração, direção ou gerência e respetivos certificados de registo criminal; pacto social; e inscrições em registos públicos e respetivos números de registo. Os parceiros também têm de respeitar princípios de idoneidade.

Como já explicado, os motoristas são obrigados a ter contrato com a empresa parceira para a qual trabalham. Por isso, se é parceiro, terá de contratar os seus motoristas e assinar com eles verdadeiros contratos de trabalho. Uma vez mais, este contrato está abrangido pelo Código do Trabalho, nomeadamente pelo artigo 12º, que dita que devem existir “horas de início e de termo” definidas pela empresa parceira e que o motorista seja pago numa “quantia certa” e “com determinada periodicidade”.

Os seus veículos vão ter de estar registados na aplicação para a qual operam e não podem ter mais de sete anos. Devem ainda possuir “seguro de responsabilidade civil e acidentes pessoais, que inclua os passageiros transportados e respetivos prejuízos”. Haverá ainda um dístico (que será definido pelo IMT). Este dístico terá de ser colado de forma visível no vidro da frente e no de trás. Fica ainda proibido de colocar publicidade na parte exterior ou na parte interior dos seus automóveis.

A nova lei prevê ainda que as empresas do setor do táxi possam ter carros ao serviço da Uber. Para tal, devem cumprir os “procedimentos de licenciamento aplicáveis” e o regulamento das plataformas. Por exemplo, os carros têm de ser descaracterizados e a empresa não pode usar os táxis na Uber, nem os carros da Uber como táxis. Uma empresa que exerça as duas atividades em simultâneo não pode beneficiar “das isenções e benefícios previstos” para o setor do táxi. Esta foi uma das medidas que só surgiu depois do veto do Presidente da República.

Novidades para as plataformas

Se é um responsável da Uber, da Cabify ou da Taxify, a nova lei impõe desafios que terão de ser encarados com antecipação para que tudo esteja pronto quando o novo regime entrar em vigor. Nos termos do regulamento, as empresas que gerem e desenvolvem as aplicações são “operador de plataforma eletrónica de reserva”.

Uma das primeiras coisas a fazer é obter uma licença de atividade junto do IMT para exercício da atividade, através do preenchimento de um formulário no Balcão do Empreendedor. Deverão ser fornecidas as seguintes informações: denominação social; NIF; sede; lista com os titulares de órgãos de administração, direção ou gerência e respetivos certificados de registo criminal; pacto social; e inscrições em registos públicos e respetivos números de registo. Se a empresa não tem sede em Portugal, deve indicar ao IMT um “representante em território nacional identificado através da apresentação dos elementos referidos no número anterior”.

Todos os anos, as plataformas terão de enviar ao IMT o certificado de registo criminal dos responsáveis da empresa. Estes também estão sujeitos a princípios de idoneidade.

Uma das primeiras coisas para as quais se deve preparar é para o pagamento de uma nova contribuição ao Estado, que incide sobre o valor da comissão retirado por cada viagem (aliás, este valor passa a estar limitado a 25%). Terá de pagar ao Estado uma contribuição “única de 5%” sobre as receitas obtidas por viagem.

Esta contribuição é paga ao Estado por autoliquidação, mas terá de fornecer à Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT), mensalmente e até ao fim do mês seguinte a que reporta, “informação relativa à atividade realizada, nomeadamente o número de viagens, o valor faturado individualmente e a respetiva taxa de intermediação efetivamente cobrada”, nos termos de um formulário que ainda deverá ser elaborado pelo regulador. Deve ainda fornecer mensalmente à AMT, mensalmente, informação sobre a atividade de cada motorista e cada viatura, como o número de viagens, valor faturado individualmente e respetiva comissão liquidada junto deste.

A AMT pode corrigir o valor da autoliquidação deste tributo que, segundo a lei, serve para “compensar os custos administrativos de regulação e acompanhamento das respetivas atividades e estimular o cumprimento dos objetivos nacionais em matéria de mobilidade urbana”.

Deverá certificar-se também de que a aplicação que gere dá aos passageiros informação clara sobre como os preços são definidos e apresentar um botão eletrónico para apresentação de queixas. Deve haver um sistema que permita aos passageiros avaliarem os motoristas, mas neste ponto há uma novidade: o mecanismo inverso é proibido. Ou seja, os motoristas deixam de poder avaliar os passageiros, como acontece atualmente.

Outra novidade que terá de ser preparada caso seja responsável da Uber, Cabify ou Taxify é a implementação de um mecanismo para motoristas que lhes bloqueie a atividade caso tenham estado dez horas ao volante. Esse mecanismo deve basear-se no número único de motorista de TVDE, para que, mesmo que um motorista já tenha cumprido dez horas de serviço noutra plataforma, não as possa voltar a cumprir numa plataforma diferente.

Deverão ser criados mecanismos para permitir aos passageiros chamar um carro “capaz de transportar passageiros com mobilidade reduzida” diretamente na aplicação. O tempo de espera por este serviço especial não pode ultrapassar os 15 minutos, ou 30 minutos em situações excecionais. O serviço tem de, obrigatoriamente, custar o mesmo que o serviço normal.

As plataformas passam ainda a ser “solidariamente” responsáveis perante os utilizadores “pelo pontual cumprimento das obrigações”. E estão obrigadas a garantir “uma política de preços compatível com a legislação em matéria de concorrência”.

Novidades para os passageiros

A nova lei traz alguns direitos adicionais aos passageiros que usem as aplicações da Uber, Cabify ou Taxify. Além de estas aplicações terem de ser mais transparentes na forma como calculam os preços das suas viagens, passará a ter o direito de pedir um carro “capaz de transportar passageiros com mobilidade reduzida”, que terá de chegar em menos de 15 minutos, ou meia hora em situações extraordinárias e justificáveis. Se a aplicação não for capaz de fornecer este serviço no momento, deverá indicar outro prestador de serviço que tenha a hipótese de o fazer.

As regras preveem ainda “igualdade de acesso aos serviços de TVDE, não podendo os mesmos ser recusados pelo prestador em razão, nomeadamente, da ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, situação económica, origem ou condição social, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical”.

A legislação reconhece competência aos tribunais portugueses para resolver qualquer conflito entre os consumidores, uma empresa parceira ou a própria plataforma eletrónica. As queixas poderão ser submetidas diretamente nas aplicações, se necessário.

Outros aspetos relevantes

Não respeitar as regras inscritas no regulamento resultará numa sanção “com coima de 2.000 a 4.500 euros” para pessoas singulares ou “5.000 a 15.000 euros” para pessoas coletivas.

O IMT e a AMT deverão fazer uma avaliação da implementação deste novo regime “uma vez decorridos três anos sobre a respetiva entrada em vigor”. O relatório final deve estar fundamentado e “apresentar recomendações e propostas de ajustamento das regras” do regulamento, pelo que poderão existir novidades em 2021.

A lei foi promulgada por Marcelo Rebelo de Sousa e publicada em Diário da República, entrando oficialmente em vigor “no primeiro dia do terceiro mês seguinte ao da sua publicação”. As plataformas terão 60 dias para ficar em conformidade com o novo regime. Motoristas e parceiros terão 120 dias. Estes prazos contam a partir do dia em que o regulamento entra em vigor.

(Guia atualizado e republicado a 31 de outubro de 2018)

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