Eleições no PSD: O filme dos debates de Rio e Santana em 3, 2, 1…

O tiro de partida foi dado a 3 de outubro. O desfecho é escolhido pelos mais de 70 mil militantes este sábado. O ECO faz-lhe o guião dos debates com o argumento e as falas marcantes de Rio e Santana.

A pré-produção foi demorada. Os candidatos à liderança do PSD reservaram uma parte significativa das suas intervenções públicas a debater os debates. Santana Lopes sugeriu debates em todas as distritais. Rio recusou e o enredo adensou. No fim houve acordo para três debates: dois na televisão e um na rádio. Depois das moções de ambos mostrarem mais pontos em comum do que diferenças, os confrontos trouxeram divergências em questões da atualidade e na estratégia política para as legislativas de 2019.

Há um traço que marca os confrontos entre os dois protagonistas: ambos fizeram questão de recordar o passado, deixando para segundo plano o futuro. No primeiro debate, ao querer afastar o passado, Pedro Santana Lopes disse que “estamos em 2017”… mas já estávamos em 2018. O próprio tinha sido o promotor do regresso ao passado com o recurso a recortes de jornais que foi mostrando. Em causa estava a divergência de Rio com o PSD, principalmente durante o mandato de Pedro Passos Coelho, e a alegada proximidade ao primeiro-ministro. Rio defendeu-se: “Não devo nada a António Costa”.

No segundo debate, foi a vez de Rui Rio trazer recortes de jornais fazendo o mesmo ataque às críticas de Santana ao PSD, relembrando o período de 2004 em que o Presidente da República o destituiu de primeiro-ministro poucos meses depois de ter assumido a pasta. “Queres ser líder do partido porque o Pacheco Pereira foi à Aula Magna?”, defendia-se o ex-autarca do Porto. O nome de Pacheco Pereira voltaria outra vez a assombrar a campanha, desta vez Santana Lopes, ao ter revelado que este último queria formar um partido dissidente do PSD em 2011, o que viria a ser desmentido.

As redes sociais também foram escavar o passado. Um vídeo de Santana Lopes a dizer que não tinha hipóteses de voltar a ser primeiro-ministro, depois da sua experiência em 2004, “nem que o vento mudasse 10 vezes”, começou a circular na internet. O ex-líder do PSD tinha a resposta na ponta da língua: “O vento mudou muitas vezes nos últimos quatro anos”, fazendo uma comparação com as alterações climáticas. Mas Rio não deixou passar: “Pedro Santana Lopes terá dificuldades em convencer os portugueses”, disse, argumentando que lhe falta credibilidade. A viagem entre o presente e o passado foi veloz mesmo com os esforços dos moderadores. “Lá estamos nós em 2005…”, chegou a desabafar Santana.

Os próprios admitem que é normal não haver uma separação grande entre dois nas ideias, principalmente na economia. É preciso “cavar muito para ver se há clivagens brutais”, admitiu Rio. Logo a seguir disse que as personalidades são “completamente diferentes”. A análise psicológica foi uma constante dos debates. “A minha dignidade não está à venda”, repetiu por diversas vezes Rio. “Passas a vida em zangas”, atirou Santana Lopes. Mas deixou uma sugestão em tom de provocação: “O Dr. Rui Rio tem de abrir um consultório de psicologia depois desta campanha”.

Mas o próprio Santana também deu o seu ar de psicológico, classificando Rio de “pouco ousado, mais tradicional”. “Não sejas sensível”, disse a certa altura face à irritação de Rio com a troca de acusações. Ao mesmo tempo que disse que Rio “tem-se em grande conta”, também relembrou que este “seria melhor para o período de crise do que Pedro Passos Coelho”, dado o seu perfil de rigor. “Até sou maçador”, comentou Rui Rio, referindo-se à consistência (na sua avaliação) da sua argumentação. Foram breves os momentos de animosidade. Os ataques continuaram com os dois a atropelarem-se no discurso. “Ó Judite [de Sousa], tem de se impor senão ele não me deixa falar”, chegou a dizer Rio.

Cena 1: Financiamento partidário

A polémica das alterações ao financiamento partidário entrou na campanha interna à liderança do PSD. Rio declarou as palavras mais duras contra as alterações e o processo, mas ambos demonstraram ser contra, ainda que a atual direção do partido seja a favor. “No conjunto, os partidos não podem ficar a ganhar mais dinheiro do que ganhavam”, disse Santana Lopes, sinalizando que prefere maior abertura ao financiamento privado. Já Rui Rio — que defende o financiamento público — atacou a isenção total do IVA, argumentando que era uma compensação por causa do corte na subvenção pública.

Cena 2: Procuradoria-Geral da República

O tema da Procuradoria-Geral da República entrou nos debates antes de entrar na agenda mediática. No primeiro debate na RTP, Rui Rio foi direto: fez um balanço negativo do mandato de Joana Marques Vidal, mantendo as suas críticas à eficácia e ao recato da PGR — “os julgamentos não são para ser feitos nos jornais”. Já Santana elogiou e disse que “o Ministério Público tem dado provas de capacidade”.

No segundo debate, o portuense recuou (um dos poucos momentos em que admitiu recuos). Rio disse que foi apanhado de surpresa pela pergunta: “Tenho ali uns segundos que nem sei do que me estão a falar…”, referiu, dando a justificação de que estava a fazer uma apreciação global à justiça e não à atual PGR. Mas não disse se renovava o mandato, chutando o tema para mais tarde. Santana Lopes admitiu que renovaria o mandato de Joana Marques Vidal.

Cena 3: Partido Socialista

Os compromissos para o futuro consumiram grande parte do tempo dos debates. Em foco estiveram as eleições legislativas que, em princípio, serão em 2019. Rio foi sempre dizendo que “hoje em dia a vida é tão volátil”, mas admitiu que viabiliza um Governo minoritário do PS caso seja o partido mais votado. O argumento passa pelo afastamento do PCP e do BE, mas também para manter a coerência do PSD que criticou o PS quando em 2015 decidiu quebrar o historial da democracia portuguesa. Nesse cenário, Rio diz que não quer impor condições a Costa, preferindo negociar diploma a diploma.

Santana Lopes rejeitou por completo esse cenário. O candidato não admite apoiar “este PS”, ou seja, com António Costa na liderança. “Se não ganharmos, com certeza que é desagradável”, admitiu o ex-provedor da SCML. Confrontado com a incoerência face às críticas lançadas ao PS nas eleições de 2015, Santana diz que a culpa é de Costa que quebrou a tradição e mudou as regras do jogo.

Cena 4: Marcelo

Marcelo Rebelo de Sousa foi elogiado pelos dois constantemente. Contudo, mais uma vez, Rio optou por ser cauteloso num eventual apoio em 2021, enquanto Santana garantiu o apoio a uma recandidatura do atual Presidente da República. “A probabilidade de apoiar é elevada”, disse Rio, acrescentando que há uma “complementaridade maior” entre o seu perfil e o de Marcelo. Mas não se compromete — “dos cinco anos de mandato, só passaram dois”, acautela. Mesmo quando chegar à altura da decisão, põe-se a ainda a questão de quem estará à frente do PSD, já que poderá não ser nenhum dos dois candidatos que agora se apresentam.

Cena 5: A economia

No plano económico, as diferenças só são visíveis à lupa. Santana Lopes fez do crescimento económico a sua bandeira nesta campanha interna: “Precisamos de investimento como de pão para a boca”, disse várias vezes, assinalando estar preocupado com a degradação do défice comercial de bens. O ex-provedor da Santa Casa quer um “Estado respeitador” em vez de um “Estado abusador”, outra das expressões que repetiu vezes sem conta.

Ambos criticam a subida do IRC que este Governo inscreveu no OE2018. Santana é taxativo a dizer que quer baixar os impostos para as empresas. Rio também, mas com cautela: primeiro é preciso assegurar que o Orçamento do Estado o permite. Caso não seja possível, Rui Rio optará por uma redistribuição da carga fiscal.

É aqui que reside uma das suas diferenças microscópicas: os dois querem finanças públicas controladas, mas Santana Lopes põe a tónica no lado das receitas. Rio não se deixou ficar: “Se houver alguém que atinja a sua felicidade porque o seu país atinge um défice zero tem de ir para o psicólogo”, atirou.

Na descentralização voltam a unir-se: os dois querem que o país tenha maior coesão e, por isso, é preciso apostar no reforço do interior. Santana quer fazê-lo através de incentivos fiscais para as empresas se deslocarem. Como argumento recuperou uma medida do seu Governo passageiro: “Espalhei secretarias de Estado pelo país todo e gozaram com isso”, relembrou. Já Rio elegeu esta como a sua grande aprendizagem da campanha: a necessidade de apostar na descentralização do Estado.

Cena 6: Questões fraturantes

As divergências foram mais marcadas nas chamadas questões fraturantes. Ao contrário do que possam mostrar na personalidade ou no que defendem para a economia, nestas áreas Rio mostrou-se mais liberal, Santana mais conservador. Além de defender o direito à morte assistida (eutanásia), Rui Rio é a favor do uso da canábis para fins terapêuticos e quer uma discussão alargada sobre a legalização e regulamentação da prostituição. Já Santana é contra nos três temas, argumentando que é preciso lutar contra um “tempo de ditadura moral de esquerda”.

O desfecho deste filme está próximo. As diretas do PSD realizam-se este sábado, após uma campanha de semanas que deverá custar 90 mil euros a Rio e 70 mil euros a Santana. As votações começam às 14h. A escolha dos mais de 70 mil militantes do PSD será entre Pedro Santana Lopes e Rui Rio. O climax — o resultado das eleições — deverá ser conhecido ao final da noite uma vez que a votação termina às 20h.

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