O dia em que os CMEC fizeram de António Mexia arguido

O presidente da EDP foi constituído arguido no dia 2 de junho, suspeito de corrupção e participação económica em negócio. Em causa, o caso dos CMEC: as rendas que o Estado paga à elétrica desde 2007.

Segunda-feira, 27 de dezembro de 2004. O Governo social-democrata de Pedro Santana Lopes estabelece um novo regime para compensar as produtoras de energia elétrica com quem o Estado cessou antecipadamente contratos de aquisição de energia (CAE), na sequência da liberalização do mercado em Portugal. A essas compensações dá-se o nome de custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC). Este acordo foi negociado entre o Governo e as próprias empresas.

Sexta-feira, 21 de julho de 2007. Os CMEC entram em vigor, por despacho de Manuel Pinho, então ministro da Economia do Governo de José Sócrates. Nesta altura, António Mexia já era o presidente executivo da EDP. Mas, quando o diploma dos CMEC foi aprovado, em 2004, era o ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações do Governo de Pedro Santana Lopes.

Sexta-feira, 2 de junho de 2017. António Mexia, ainda presidente executivo da EDP, juntamente com João Manso Neto, CEO da EDP Renováveis, e os gestores da REN João Conceição e Pedro Furtado, é constituído arguido, na sequência de buscas feitas pelo Ministério Público e pela Polícia Judiciária às sedes da EDP e da REN. Os quatro são suspeitos de corrupção ativa e passiva e participação económica em negócio.

São estas três datas que resumem aquele que veio a ser um dos dias mais marcantes deste ano. Depois de uma década de “rendas”, que resultaram no pagamento de 2,5 mil milhões de euros pelo Estado à EDP, e cinco anos depois de a Procuradoria-Geral da República ter iniciado as investigações, há arguidos no caso dos CMEC.

No centro da investigação, António Mexia rejeita que a EDP tenha obtido qualquer benefício com a revisão dos contratos energéticos, recusa abandonar funções e concentra a sua defesa em dois pontos. Na conferência de imprensa que deu depois de ter sido constituído arguido, Mexia argumentou que a EDP se limitou a “defender os seus interesses dentro da lei e da ética”. Exemplo disso, afirmou, é o facto de a atualização dos parâmetros de mercado, feita em 2007, ter reduzido o valor da compensação financeira a atribuir à EDP, relativa aos anos de 2004 a 2007, de 3.356 milhões para 833 milhões de euros.

Segundo, defendeu ainda, os CMEC foram alvo de grande escrutínio, por parte de vários governos, parlamentos e a própria Comissão Europeia, além de os valores das compensações a pagar à EDP terem resultado de estudos feitos por entidades independentes.

Há várias questões a apontar à defesa de Mexia. Em 2010, a Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, criou um seminário sobre energias renováveis, patrocinado pela EDP e lecionado por Manuel Pinho, o ministro que, três anos antes, tinha aprovado a entrada em vigor dos CMEC. Hoje, a Polícia Judiciária investiga se este curso terá sido uma forma de a EDP compensar Manuel Pinho.

Há ainda o desenho dos CMEC, que, suspeita o Ministério Público, terá contado com a participação da EDP. No mês passado, o Expresso divulgou uma conversa por email entre João Manso Neto e António Mexia, datada de 15 de novembro de 2006, em que o presidente da EDP Renováveis envia a Mexia um rascunho da resolução do Conselho de Ministros relativa à aprovação dos CMEC.

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) tem até meados de maio de 2018 para concluir o inquérito deste caso. O prazo poderá ser prorrogado se o procurador encarregue do caso o requerer.

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