Mesmo que o Governo não fizesse nada, o peso da carga fiscal seria o mesmo em 2018

  • Margarida Peixoto
  • 17 Outubro 2017

No Projeto de Plano Orçamental apresentado à Comissão Europeia, o Executivo confronta as suas metas para as receitas e despesas públicas, com o que aconteceria se não se fizesse nada.

Mário Centeno, ministro das Finanças, apresentou a proposta de Orçamento do Estado para 2018 na sexta-feira, dois dias antes de enviar o Projeto de Plano Orçamental para Bruxelas.Paula Nunes 14 Outubro, 2017

Mesmo que o Governo de António Costa não tivesse tomado quaisquer medidas este ano, nem fizesse nada em 2018, o peso da carga fiscal no PIB seria precisamente o mesmo. A conclusão resulta dos quadros enviados para a Comissão Europeia, no Projeto de Plano Orçamental, disponibilizado esta terça-feira.

Para além de entregar a proposta de Orçamento do Estado na Assembleia da República, o Governo tem de enviar também, até 15 de outubro, um Projeto de Plano Orçamental para Bruxelas. O documento foi enviado ontem, dentro do prazo, confirmou o ECO junto de fonte oficial, tanto da Comissão como do Ministério das Finanças. Mas só ficou disponível para acesso esta terça-feira.

No documento, o Executivo tem de respeitar um modelo de apresentação das suas políticas ligeiramente diferente do que vigora para a Assembleia da República. Para a Comissão Europeia, Mário Centeno, ministro das Finanças, tem de enviar não só as metas com que se compromete para as receitas, despesas e saldos das administrações públicas, como também o que aconteceria num cenário de políticas invariantes — isto é, se não fizesse nada.

Ora, neste quadro verifica-se que se o Governo não tivesse tomado quaisquer medidas de política orçamental, em 2017 a carga fiscal teria tido um peso maior na economia: 34,5%, contra os 34,4% que se projetam agora. Contudo, também fica visível que com, ou sem, medidas a carga fiscal pesará o mesmo em 2018: 34,3% do PIB.

Como é que isto é possível, se o IRS vai descer?

A conclusão parece contraditória com a ideia de que os impostos vão, em termos globais, descer. Tal como o Executivo tem sublinhado, estão previstos 230 milhões de euros de alívio no IRS só por via do desdobramento de escalões, e outros 260 milhões de euros através da eliminação da sobretaxa. Somadas, estas medidas valem 490 milhões de euros a menos na receita fiscal.

É verdade que, em contrapartida, o Executivo antecipa uma subida de 180 milhões de euros na coleta dos impostos indiretos, só por via das suas medidas. Esta coleta a mais anula parte do efeito do alívio do IRS, mas o Governo diz que não será todo. Os 310 milhões de euros que persistem de alívio fiscal representam 0,16% do PIB esperado pelo Governo.

Mas as medidas de política do Governo não têm apenas um impacto direito na receita (ou na despesa, se estivéssemos a falar, por exemplo, no aumento extraordinário das pensões). Têm também efeitos de segunda ordem na economia: fazem com que o PIB avance mais depressa, ou mais devagar.

Será este efeito que justifica que, mesmo baixando através de políticas discricionárias a receita fiscal prevista, a carga fiscal possa não cair. O Governo deverá estar a incorporar no próprio andamento do PIB — e portanto, na coleta projetada — o impacto das suas políticas.

Aliás, verifica-se que sem as medidas de ação do Governo a receita obtida através dos impostos sobre o rendimento e património (onde se insere o IRS) pesariam 10% do PIB. Mas com o impacto da ação do Governo a meta é mais baixa: 9,8% do PIB. Em contrapartida, o peso dos impostos sobre a produção e a importação (onde estão os impostos indiretos que o Governo decidiu atualizar, subir ou criar, mas também o IVA) sobe de 15% para 15,1%.

O ECO contactou o Ministério das Finanças no sentido de confirmar se é este o efeito que justifica que a carga fiscal mantenha o seu peso inalterado. Fonte oficial sublinhou que “o Governo projeta uma recuperação dos rendimentos, tanto do setor privado como do setor público, através do desagravamento fiscal” e garantiu que se vai operar “um claro alívio fiscal para todos os trabalhadores, repercutindo-se assim favoravelmente nos orçamentos familiares.”

Operar-se-á um claro alívio fiscal para todos os trabalhadores, repercutindo-se assim favoravelmente nos orçamentos familiares.

Ministério das Finanças

Fonte oficial

Sendo as projeções do Governo feitas numa base conservadora e prudente, e tendo presente que o aumento da receita do IVA em 2017 foi causado pelo aumento da atividade económica, em particular graças ao aumento do investimento e das exportações de bens e serviços – ou seja que nem sempre afetam as famílias portuguesas -, estima-se que, em 2018, o IVA mantenha um comportamento semelhante, o que fará com que a carga fiscal geral se deva manter inalterada,” adiantou ainda.

E o que fazem as medidas do Governo ao andamento da despesa?

Por causa da ação do Governo, a despesa vai pesar mais no PIB: em vez de 44,1%, o Executivo assume uma meta de 44,5%. A justificar esta subida do peso estão os gastos com prestações sociais (que passam de 18,5% do PIB para 18,6%), o investimento (formação bruta de capital fixo) e as transferências de capital.

A subida do peso das prestações sociais poderá estar relacionada com o aumento extraordinário de pensões, com a decisão de descongelar o indexante dos apoios sociais (que faz subir o subsídio de desemprego máximo e mínimo), com a reposição de mais 25% do corte do Rendimento Social de Inserção, as alterações nas reformas antecipadas, ou o aumento do abono de família para crianças entre os 12 e os 36 meses.

Já no investimento o Governo compromete-se a subir o seu peso para 2,3% do PIB, em vez dos 1,8% que pesaria num cenário de políticas invariantes.

Mas também há despesas que o Executivo se compromete a baixar: por exemplo, o peso o consumo intermédio deverá cair 0,2 pontos percentuais face ao que aconteceria caso o ministro das Finanças não tomasse medidas; e o peso dos juros, para o qual o Governo se compromete com um peso de 3,6% do PIB (menos uma décima).

(Notícia atualizada às 18h43 com a resposta do Ministério das Finanças)

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