Pedrógão: Alerta precoce podia evitar número de mortos

  • Lusa
  • 12 Outubro 2017

Comissão Técnica Independente sobre os incêndios diz que consequências poderiam ter sido atenuadas por medidas preventivas.

A Comissão Técnica Independente sobre os incêndios na região Centro, em junho, admitiu esta quinta-feira que poderiam ter sido tomadas medidas nas primeiras horas do combate ao fogo para evitar consequências mais graves.

A conclusão foi anunciada pelo presidente da comissão, João Guerreiro, após ter entregue o relatório ao presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues. Um relatório que revela que o incêndio de Pedrógão teve início numa descarga elétrica da rede de distribuição de energia e o incêndio de Góis por um raio.

Alerta precoce

Um alerta precoce poderia ter evitado a maioria das 64 mortes registadas no incêndio que começou a 17 de junho em Pedrógão Grande, sublinha o relatório da comissão técnica independente.

No item intitulado “O que poderia ter sido diferente”, lê-se que “esta ausência de alerta precoce, por não ter sido feita a leitura do incêndio às 18:00 (e mesmo antes), não permitiu impedir a maioria das fatalidades”.

Este trabalho de antecipação, acrescenta a comissão, “deveria ter sido feito no seio do comando e planeamento desta operação de socorro e deveria ter resultado na mobilização dos meios necessários, incluindo a GNR, para evitar que se tivesse verificado uma fuga para a morte, tal como veio a acontecer”.

“Por sua vez, tal trabalho de antecipação só poderia ter sido feito com o apoio de analistas de incêndios e de meteorologistas especializados, que permitisse uma adequada avaliação da situação em tempo real. A verdade é que nenhuma destas competências existe na Autoridade Nacional de Proteção Civil, apesar da enorme gravidade e frequência dos incêndios em Portugal”, indica o documento, entregue no parlamento e disponibilizado no ‘site’ da Assembleia da República.

O relatório diz também que, uma vez que as mortes na Estrada Nacional (EN) 236-1 ocorreram na sequência da fuga a partir das aldeias localizadas a este desta via, “poderia ter-se colocado a hipótese de proceder ao corte das estradas de acesso à EN 236-1”, o que teria um desfecho “provavelmente ainda pior, pois teria eventualmente implicado a ocorrência de mais vítimas, incluindo os próprios agentes da autoridade”.

“Excluída esta hipótese, duas medidas poderiam no entanto ter sido tomadas, ambas dependentes de informação que a GNR não dispunha. Poderia ter sido ordenada a evacuação atempada das aldeias ameaçadas ou poderiam ter sido tomadas medidas para que as pessoas não saíssem de casa”, descreve a comissão.

Qualquer uma destas decisões deveria, no seu entender, ter resultado de “uma análise adequada da situação, de modo a prever o comportamento potencial do incêndio iniciado há mais de cinco horas”.

Uma descarga elétrica poderá ter causado o incêndio

Os incêndios que começaram em Pedrógão Grande e Góis, em 17 de junho, foram causados, respetivamente, por descargas elétricas mediadas pela rede de distribuição de energia e por um raio.

De acordo com o relatório da comissão técnica independente designada para analisar os fogos de junho na região Centro, entregue esta quinta-feira na Assembleia da República e tornado público, “os incêndios de Pedrógão Grande (28.914 hectares) e Góis (17.521 hectares), o segundo e o oitavo maiores de sempre desde que há registos, foram causados, respetivamente, por descargas elétricas mediadas pele rede de distribuição de energia e por raio”.

“O incêndio de Pedrógão Grande […] é muito provavelmente aquele que, em Portugal, libertou mais energia e o fez mais rapidamente (com um máximo de 4.459 hectares ardidos numa só hora), exibindo fenómenos extremos de vorticidade e de projeção de material incandescente a curta e a longa distância”, sintetiza o relatório.

A 18 de junho, um dia após o início do fogo, o diretor nacional da Polícia Judiciária (PJ) disse à agência Lusa que o incêndio que deflagrou no concelho de Pedrógão Grande teve origem numa trovoada seca, afastando qualquer indício de origem criminosa.

“A PJ, em perfeita articulação com a GNR, conseguiu determinar a origem do incêndio e tudo aponta muito claramente para que sejam causas naturais. Inclusivamente encontrámos a árvore que foi atingida por um raio”, explicou, na ocasião, Almeida Rodrigues.

Já o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP), Jaime Marta Soares, afirmou, por mais do que uma vez, que o incêndio que deflagrou teve “origem criminosa”.

Entre estes incêndios e outros de grandeza semelhante, refere ainda o documento, há diferenças importantes, já que “são os primeiros a acontecer ainda na primavera” e estão num patamar inferior em relação aos índices de perigo meteorológico associados à velocidade de propagação do fogo e à quantidade de combustível morto disponível para arder.

“Consequentemente, a excecionalidade destes eventos resulta da sinergia e encadeamento com fatores adicionais, a saber: o adiantado estado de secura da vegetação, que distingue o ano de 2017 de qualquer um dos anos anteriores; a grande instabilidade da atmosfera e o seu perfil de humidade, implicando muita energia disponível para fenómenos convectivos e para correntes de ar descendente; o efeito da frente de rajada na velocidade de propagação, intensidade frontal e capacidade do incêndio para gerar focos secundários”, descreve-se.

É ainda referido no relatório que esta possibilidade de expansão das chamas “permitiu que o incêndio aproveitasse e reforçasse a estrutura favorável da atmosfera, fazendo ascender a coluna de convecção até à formação de um pirocúmulonimbo, em que processos atmosféricos dominam o fogo e o tornam mais errático e perigoso”.

Ocorreu também “o ‘colapso’ da coluna de convecção, que originou a forte corrente de ar descendente (downburst) causador do súbito e violento crescimento do fogo”.

O relatório entregue no parlamento analisa os fogos ocorridos entre 17 e 24 de junho nos concelhos de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos, Ansião, Alvaiázere, Figueiró dos Vinhos, Arganil, Penela, Oleiros, Sertã, Góis e Pampilhosa da Serra.

O fogo que deflagrou em Pedrógão Grande no dia 17 de junho só foi extinto uma semana depois, tal como o incêndio que teve início em Góis (distrito de Coimbra). Os dois fogos, que consumiram perto de 50 mil hectares em conjunto, mobilizaram mais de mil operacionais no combate às chamas.

O incêndio florestal que deflagrou há quatro meses em Pedrógão Grande, tendo alastrado a vários municípios vizinhos, causou 64 mortos e mais de 200 feridos.

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