IVA da restauração baixou há um ano. Trouxe valor acrescentado?

Foi há um ano que o IVA voltou a ser 13% na restauração. Mas não foi para todos os produtos. No que mudou, qual foi o balanço? O ECO foi analisar os dados do emprego, inflação e receita fiscal.

O Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) para certos produtos voltou a ser de 13% a 1 de julho de 2016. Esta foi uma das reversões que mais dúvidas suscitou, dado os potenciais efeitos em várias frentes, nomeadamente a orçamental. De tal forma que o Governo criou um grupo de trabalho para estudar a aplicação desta medida envolvendo o Ministério das Finanças, da Economia e do Trabalho, assim como a AHRESP (Associação de Restauração e Similares de Portugal). Um ano depois, este grupo de trabalho divulgou o seu primeiro relatório.

O que mudou?

A 1 de julho foi implementada uma reposição parcial do IVA, incidindo apenas nos serviços de alimentação, cafetaria e água lisa. O IVA da restauração passou de 23% para os 13%. A redução desta taxa, revertendo uma medida do anterior Governo (implementada no Orçamento do Estado para 2012), implicou uma perda de receita de cerca de 175 milhões de euros, segundo os cálculos apresentados pelo Governo no Orçamento do Estado para 2016. Este valor era relativo aos seis meses de vigência da medida no ano passado.

O que falta mudar?

Os produtos como as bebidas alcoólicas, refrigerantes, sumos, néctares e águas com gás mantiveram o imposto a 23%. Este tem sido um problema levantado pela Associação de Restauração e Similares de Portugal (AHRESP). O Orçamento do Estado para 2017 incluía uma autorização legislativa que permitia baixar o IVA da restauração para os serviços de bebidas que ficaram de fora da descida, de 23% para 13%, que foi implementada em julho de 2016. Contudo, estes produtos que mantiveram o IVA a 23% continuam sem ver uma descida do imposto e o Governo não revela se vai, ou não, avançar com este corte.

O que dizem os números?

  • Inflação alimentar

Fonte: Instituto Nacional de Estatística

A inflação na categoria de “Restaurantes, cafés e estabelecimentos similares” tem vindo a aumentar. Ou seja, os preços subiram, em vez de diminuírem face ao corte no imposto, o que demonstra que os estabelecimentos não ajustaram os seus preços. Os dados do INE de outubro do ano passado, por exemplo, mostram que o maior contributo positivo para a inflação desse mês foi dado pelos restaurantes e hotéis, apesar de o IVA ter baixado em julho para a restauração. Nesse mês a taxa de inflação homóloga saltou para os 0,9%.

Numa análise feita com dados do Instituto Nacional de Estatística, em que a base 100 é o ano de 2012, os preços na restauração recuperaram os níveis pré-crise, dado que esse foi exatamente o ano com a pior contração do PIB. Além disso, uma análise do gráfico desde abril do ano passado (ainda com o IVA a 23%) até a maio deste ano (cerca de dez meses depois da implementação da medida) mostra que os preços na restauração estão a registar uma trajetória ascendente.

Esta tendência é confirmada pelo relatório do grupo de trabalho: os preços da restauração estagnaram em 2015, mas cresceram em 2016, “cerca de 0,7%, no 1º semestre, e de 1,3%, no 2º semestre”. Ou seja, os preços não refletiram a descida do imposto no valor final apresentado ao consumidor.

  • Receita fiscal do IVA

Não é possível verificar os dados específicos da receita fiscal oriunda do IVA da restauração, em específico nos produtos que foram afetados por esta mudança. Ainda assim, podemos analisar a evolução da receita fiscal de julho de 2016 até maio de 2017, o último mês sobre o qual existe uma nota de execução orçamental da Direção-Geral do Orçamento (DGO). Em junho (mês anterior à mexida), a receita do IVA estava a aumentar 0,4% face ao mesmo período do ano transato.

Contudo, esse desempenho estava aquém da meta que o Governo tinha inscrito de 3,2%. Uma análise posterior, terminados os 12 meses de execução orçamental, permite-nos observar que o desempenho do IVA melhorou, ainda que tenha ficado abaixo do objetivo que Mário Centeno tinha em mente quanto arquitetou o OE2016. A receita do IVA acabou por aumentar 1,5% face a 2015.

Em 2017, até maio, a receita do IVA está a acelerar. “O aumento da receita dos impostos indiretos em 3% é principalmente explicado pelo crescimento da receita de IVA em 217 milhões de euros (+3,4%)”, lê-se na nota execução orçamental da DGO relativa a maio. Esta variação é superior à que o Ministério das Finanças prevê para o ano todo (2,6%), o que demonstra que a receita deste imposto teve um desempenho significativo nos primeiros meses do ano, também fruto da aceleração do PIB.

Esta sexta-feira, no comunicado sobre o relatório do grupo de trabalho, o Ministério do Trabalho assinala que “a alteração do IVA na Restauração, que havia sido estimada em 175 milhões de euros no OE2016, terá implicado uma perda de receita potencial de 161,7 milhões de euros no 2º semestre”. Além disso, as contribuições sociais aumentaram e as prestações de desemprego diminuíram, o que contribuiu para amenizar este efeito negativo nas contas públicas. A AHRESP, no seu comunicado, até reivindicou que o Estado poupou 40 milhões de euros com esta decisão.

Esta perda de receita é explicada por uma diminuição de 43,8% da receita bruta do IVA da restauração na segunda parte do ano passado, ou seja, -161,7 milhões de euros que entraram nos cofres do Estado, segundo os dados divulgados pelo relatório. Esse desempenho do imposto no segundo semestre levou uma queda anual de -19,5%. A receita do primeiro semestre de 2016 tinha registado uma evolução positiva. “Em termos de peso relativo no total da receita de IVA, a diminuição foi de cerca de 1,1 pontos percentuais”, conclui também o relatório.

  • Emprego na restauração

Fonte: Instituto Nacional de Estatística

Este é um número mais difícil de comparar dado que existem tradicionalmente contratos informais e uma influência sazonal forte na comparação entre o verão e as restantes estações. Ainda assim, comparando os meses de 2016 com os de 2017 é possível ver uma trajetória ascendente neste gráfico que mostra dados do Instituto Nacional de Estatística sobre o emprego na restauração com uma base 100 de 2010.

Contudo, neste ponto, o relatório do grupo de trabalho é claro em mostrar uma tendência bastante positiva do emprego no segundo semestre do ano passado. O emprego na restauração aumentou 6,7%, em comparação homóloga, no segundo semestre do ano passado, o que compara com um crescimento do emprego no total da economia de 3,2%.

Além disso, “a remuneração permanente mensal dos trabalhadores do setor teve um crescimento na ordem dos 3%, superior ao alcançado em termos globais (1,0%)”. Por causa destes fatores, as contribuições sociais da restauração subiram 10% e as prestações de desemprego reduziram-se em 10,3%.“O sub-setor Restauração e Similares teve no 2º semestre de 2016 uma média de 178.286 pessoas com remunerações declaradas”, revelou ainda o Ministério do Trabalho, com uma remuneração média de 611 euros.

“O próximo relatório incluirá, assim, os dados relativos ao 1.º semestre de 2017 e a sua disponibilização está prevista para o 4.º trimestre de 2017, por forma a permitir a inclusão de informação administrativa mais abrangente e estabilizada”, garante o grupo de trabalho no sumário executivo do relatório.

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