Ainda não percebeu as contas da OPA da EDP? Nós explicamos

António Mexia pediu aos analistas para fazerem as suas contas. Mas a avaliação que dá à EDP Renováveis é manifestamente baixa face ao que o mercado está a exigir. Um manual para perceber a OPA da EDP.

Contas complicadas? O ECO ajuda a perceber os números apresentados por António Mexia.Fotomontagem: Raquel Sá Martins

António Mexia diz tratar-se de um bom negócio, mas a contrapartida de 6,80 da Oferta Pública de Aquisição (OPA) da EDP não convence nem os acionistas minoritários da EDP Renováveis — que estão a exigir uma revisão em alta do preço –, nem os analistas — que já confrontaram o presidente executivo com a “matemática” utilizada por detrás da avaliação que fazem da sua subsidiária de energias limpas. O mercado queixa-se do “magro preço” que Mexia está a dar pela EDP Renováveis. Porquê?

Preço baixo face aos últimos negócios

Na conference call com analistas para explicar pormenores da operação, António Mexia foi confrontado esta terça-feira com a baixa avaliação que a EDP está a fazer da EDP Renováveis em função dos últimos negócios de rotação de ativos realizados recentemente pela subsidiária de renováveis.

Ora, a oferta que está em cima da mesa deixa implícita uma avaliação da EDP Renováveis em torno de um milhão de euros por megawatt (uma métrica industrial utilizada pelo mercado para calcular o valor de empresas). Mas este é um valor claramente abaixo da avaliação pressuposta no último negócio da empresa, realizado há um mês. Em fevereiro, a EDP Renováveis vendeu um conjunto de ativos a China Three Gorges por 242 milhões de euros, o que conferia à subsidiária da EDP um valor de mercado de 1,7 milhões de euros por megawatt, segundo as contas do CaixaBI.

Ou seja, há uma diferença de avaliação de 70% entre as duas operações e este “gap” foi salientado por uma analista na conferência por telefone com António Mexia. Em resposta, o presidente da EDP remeteu explicações para mais tarde à espera do registo da OPA.

Além disso, a contrapartida fica abaixo do preço da Oferta Pública de Venda (OPV), em 2008, onde os investidores pagaram oito euros na operação que levou a EDP Renováveis para a bolsa. Quem comprou na OPV, ficará a perder dinheiro se vender agora, dado que os dividendos distribuídos ao longo dos últimos nove anos totalizam os 21,16 cêntimos (2016 incluído).

Preço será revisto em alta?

Em princípio não, “mas tudo pode acontecer”, sublinhava ao ECO Albino Oliveira, da Patris Investimentos. Os analistas duvidam que a contrapartida de 6,80 euros seja revista em alta até porque a EDP não impôs nenhuma condição de sucesso na OPA, descomprometendo-se (de forma implícita) de qualquer ajustamento no preço.

Ainda assim, há gente no mercado que acredita num cenário contrário. As ações da EDP Renováveis dispararam 10% na primeira sessão após o anúncio de lançamento da OPA e fecharam sensivelmente dez cêntimos acima daquilo que a EDP se propõe a pagar para controlar pelo menos 90% do capital da sua subsidiária.

EDP Renováveis continua acima da OPA

Os analistas do Haitong sublinhavam que dificilmente a EDP deverá promover uma melhoria da sua oferta, uma opinião partilhada por Albino Oliveira. “É difícil de entender o que poderá levar a EDP a rever em alta. Tudo pode acontecer. Mas olhando para o preço do mercado e se o preço do mercado se mantiver sempre acima da oferta, torna menos provável que consiga os 90%”, disse o gestor de ativos da Patris.

A EDP detém atualmente 77,5% da EDP Renováveis. Para poder retirar esta subsidiária da bolsa, conforme anunciou no lançamento da OPA, além de ter de deter 90% do capital da EDP Renováveis, a elétrica terá de conseguir comprar 90% dos 22,5% que ainda não possui na sua unidade de energia verde. O que hipoteca ainda mais as possibilidades de “sucesso” da OPA.

Como vai financiar a OPA?

A EDP vai precisar de 1,3 mil milhões de euros para comprar a totalidade da EDP Renováveis. É muito dinheiro para uma empresa que se comprometeu em reduzir a sua dívida que, no final de 2016, se situava acima dos 15 mil milhões de euros, quatro vezes o EBITDA que consegue gerar por ano.

Ainda assim, o financiamento desta operação está totalmente garantido. Momentos após o lançamento da OPA, António Mexia anunciava ao mercado a venda da Naturgas, uma empresa de distribuição de gás natural em Espanha, por 2.591 milhões de euros, acima da avaliação de 2.100 milhões de euros que o mercado atribuía à empresa espanhola. Mexia recebeu os parabéns dos analistas por este negócio que, em parte, será canalizado para financiar a oferta sobre a EDP Renováveis. O que sobrar vai para abater a dívida.

Para o CaixaBI, são dois negócios win-win para a EDP: “As transações anunciadas são positivas para a EDP na medida em que a venda da Naturgas é realizada a uma valorização muito atrativa enquanto os minoritários da EDP Renováveis serão adquiridos a um valor abaixo da nossa avaliação”.

"As transações anunciadas são positivas para a EDP na medida em que a venda da Naturgas é realizada a uma valorização muito atrativa enquanto os minoritários da EDP Renováveis serão adquiridos a um valor abaixo da nossa avaliação.”

Helena Barbosa

Analista do CaixaBI

Por que razão a EDP quer comprar a EDP Renováveis?

Para Mexia, estas transações fazem todo o sentido. Ao vender a Naturgas, a EDP aliena um ativo que não oferecia grande diversificação geográfica. E, ao adquirir a EDP Renováveis, a EDP simplifica a sua estrutura organizacional, potenciando ganhos de eficiência e “maior cooperação com as operações da EDP em Portugal, Espanha e Brasil”. E isto numa altura em que a baixa liquidez do mercado não confere grandes vantagens em ter duas empresas em bolsa.

Com esta mudança na carteira de ativos, a EDP vai conseguir obter um valor significativo para prosseguir com a redução da dívida. Isto ao mesmo tempo que “preserva o seu perfil de baixo risco”. A meta de redução do rácio entre a dívida e o EBITDA é reiterada, devendo ser de três vezes em 2020.

Ao mesmo tempo que consegue reduzir o endividamento, e acreditando no potencial da EDP Renováveis, a EDP defende, na apresentação feita aos investidores perante estas duas operações, que será capaz de criar mais valor para os acionistas. A empresa liderada por António Mexia aponta para uma “melhoria dos lucros de 2019 em diante”. Em 2016, o lucro da EDP subiu 5% para 961 milhões de euros em 2016.

Por outro lado, a EDP avança sobre a EDP Renováveis segue-se após movimentos semelhantes do mercado, nomeadamente da Iberdrola, EDF e Enel.

Quando é que a OPA avança?

Para os analistas, o timing da OPA foi surpreendente. Já Mexia considerou que este é o “momento adequado” para a EDP proceder a uma recomposição do seu negócio. “No curto prazo, permite cristalizar o valor dos ativos. A médio prazo, reforça os objetivos do nosso plano estratégico. E melhora a posição da EDP no setor das utilities a longo prazo”, declarou o líder da EDP.

António Mexia confidenciou ainda aos analistas que a OPA deverá ficar registada nas próximas semanas. Mas a conclusão da oferta deverá demorar ainda mais: durante o segundo trimestre ou já no início terceiro trimestre deste ano, adiantou o presidente da EDP. Mas tudo vai depender dos timings da CMVM.

Quanto à venda da Naturgas, o acordo deverá ficar fechado no próximo mês de abril.

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