O essencial do relatório da OCDE sobre Portugal

  • Margarida Peixoto
  • 6 Fevereiro 2017

A OCDE avaliou a economia portuguesa e apresentou um relatório onde faz um ponto de situação e deixa recomendações. Centeno avisou que não concorda com tudo. Aqui está um resumo do fundamental.

O Economic Survey da OCDE sobre Portugal, apresentado esta segunda-feira em Lisboa, faz uma radiografia da economia portuguesa e apresenta um conjunto de recomendações para potenciar o crescimento económico. O ECO faz-lhe um resumo com o essencial do documento, as chamadas de atenção feitas pelo secretário-geral Angel Gurría, e as reações do ministro das Finanças português, Mário Centeno.

O que diz a OCDE sobre o estado da economia?

A organização liderada por Angel Gurría reconhece que Portugal está a recuperar da crise e está a resolver alguns dos seus desequilíbrios fundamentais. Nota que as reformas estruturais aplicadas no passado estão a surtir efeito. Evidências dessa melhoria são:

  1. As exportações: em 2015 já pesavam mais de 40% no PIB, enquanto em 2005 não passavam dos 27%. Este ganho parece ser “estrutural”, avança a organização.
  2. A redução dos desequilíbrios externos: a balança de transações correntes está positiva — uma conquista que Gurría fez questão de sublinhar na cerimónia de apresentação do relatório — e a poupança interna aumentou.

Contudo, permanecem dificuldades por resolver:

  1. Os níveis de investimento estão demasiado baixos e sem uma retoma deste indicador, dificilmente Portugal consolidará a saída da crise.
  2. A força de trabalho em Portugal tem baixas qualificações, o que prejudica o potencial de crescimento da economia e a produtividade.
  3. Portugal é um dos países mais desiguais da Europa e tanto as desigualdades como a pobreza têm vindo a aumentar desde a crise. As crianças e os jovens foram os mais afetados pelo aumento da pobreza, com uma subida de três pontos percentuais, enquanto a pobreza entre os idosos caiu seis pontos.
  4. O setor financeiro continua a braços com um peso grande de malparado. Segundo a OCDE, mais de 12% do crédito concedido estava vencido, de acordo com dados do FMI, para o final do segundo trimestre de 2016. Isto prejudica a saúde do sistema financeiro e compromete a capacidade de financiar investimentos.
  5. A dívida pública portuguesa é elevada e levanta riscos, sobretudo num ambiente de baixo crescimento económico. Portugal tem “de remar um pouco contra a corrente”, disse Gurría.
  6. A eficácia dos impostos sobre o consumo está prejudicada pela utilização frequente de exceções.
  7. Os procedimentos de insolvência são morosos, o que torna os empréstimos a empresas mais arriscados.

O que prevê para Portugal?

A OCDE prevê menos crescimento do que o Governo está neste momento a antecipar, tanto para 2016, como para 2017. Enquanto o Executivo já está a contar com uma taxa de crescimento acima de 1,2% (a última previsão oficial do ministro das Finanças, apresentada em outubro), que deverá acelerar para 1,5% em 2017, a OCDE espera uma estagnação do ritmo no próximo ano.

Também no mercado de trabalho o Executivo português está mais otimista, com Mário Centeno a assumir que o Governo espera uma taxa abaixo dos dois dígitos, enquanto a organização liderada por Angel Gurría antecipa uma taxa de 10,1% tanto em 2017, como em 2018.

Previsões da OCDE

Fonte: OCDE
Fonte: OCDE

Que recomendações deixa?

A OCDE deixa recomendações para diferentes setores de atividade e de diferentes âmbitos. Deixa sugestões sobre as políticas macroeconómicas, o ambiente de investimento e o reforço das competências da força de trabalho. Aqui ficam algumas das medidas sugeridas:

Política macroeconómica

  1. Manter as reformas estruturais, juntamente com avaliação antes e depois de aplicadas. A OCDE nota, por exemplo, que a ‘regra 2 por 1’ para as admissões na Função Pública deve continuar a ser seguida e avisa que há professores e polícias a mais.
  2. Continuar a consolidação orçamental, mas de forma gradual para não comprometer a retoma económica;
  3. Reduzir os benefícios fiscais, taxas reduzidas e despesas fiscais — a OCDE duvida que a redução do IVA para a restauração surta os efeitos desejados, por exemplo.
  4. Reforçar os incentivos à redução do malparado;
  5. Apoiar o desenvolvimento de um mercado para o crédito malparado, nomeadamente através da criação de empresas de gestão de ativos.

Mercado de trabalho

  1. Cuidado com os aumentos do salário mínimo, diz a OCDE. A subida de 2017, para 557 euros, já coloca 20% dos trabalhadores em Portugal a receber menos, ou ao nível, da remuneração mínima. Se o Governo aumentar o salário mínimo para 600 euros, conforme previsto no seu Programa para a legislatura, este número sobe para 30%. Aumentos do salário mínimo fortes, sem o contraponto da subida da produtividade ameaçam reverter os ganhos obtidos com as reformas do passado.
  2. Cuidado com as portarias de extensão para os acordos coletivos. A OCDE defende que exigir requisitos mais apertados para a aplicação destas portarias, bem como a possibilidade de empresas poderem optar por ficar fora do âmbito da extensão, poderiam promover um alinhamento mais correto entre a situação financeira da empresa e os salários que esta pratica. A menor utilização destas portarias poderia também facilitar a entrada de mais empresas no mercado.

Reforçar o investimento

  1. Melhorar as regras de insolvência, nomeadamente reconsiderando o tratamento preferencial dos credores públicos, alargando a possibilidade de maiorias simples para a tomada de decisões dos credores e reduzindo os procedimentos nos acordos sem recurso ao tribunal;
  2. Resolver estrangulamentos administrativos, reduzindo, por exemplo, a discricionariedade na decisão das autarquias em questões de licenciamento;
  3. Aumentar a capacidade dos tribunais e atribuir juízes especializados aos tribunais especializados.

Melhorar as qualificações

  1. Reavaliar os programas de formação, unificar os diferentes sistemas de educação profissional;
  2. Aumentar o apoio para estudantes em risco de repetição dos anos letivos e melhorar a formação dos professores, atribuindo mais recursos à educação primária e pré-primária.

Como reagiu Mário Centeno?

O ministro das Finanças agradeceu os contributos, frisou que serão úteis, mas deixou um aviso: “Não concordaremos com tudo”. Mário Centeno fez questão de sublinhar que este relatório não é do Governo sugerindo, desta forma, que não deverá aproveitar todas as recomendações deixadas.

O governante optou também por defender os resultados já obtidos pelo Governo e lembrou algumas das medidas que estão a ser trabalhadas para resolver constrangimentos identificados pela OCDE. Por exemplo, Centeno garantiu que o trabalho preparatório indispensável ao arranque do investimento público no quadro do Portugal 2020 foi feito em 2016 e prometeu que os números “vão aparecer” este ano.

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